Before

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"Se você ama alguma coisa ou alguém, deixe que parta. Se voltar é porque é seu, se não é porque nunca será." - William Shakespeare

Minha mãe me abandonou na porta daquela igreja alguns anos atrás. Lembro perfeitamente daquele dia. Os raios de sol entravam calmos e quentes pelos desenhos nos vidros da igreja, deixando ela em um tom amarelado. A igreja pastoral da minha mãe era linda naquela época, os seus detalhes rústicos e modernos ao mesmo tempo a diferenciava das outras igrejas da cidade. Por incrível que pareça, na minha cidade, existia um maior número de igrejas do que de prédios comerciais, fazendo assim que todos fossem religiosos. O pastor mais popular da cidade era também o mais novo, com a sua carreira no início. No começo, houve boatos de que ele assobiava para as menininhas religiosas da cidade enquanto as suas mães estavam nos cultos, mas os boatos se tornaram mentira quando Alana Chester, uma adolescente que fazia parte do grupo de oração Unidos Para Deus, defendeu o pastor, dizendo que ele nunca a havia feito nada. Naquela tarde, houve uma morte. Talvez a do meu pai, já que eu era muito nova para lembrar. Minha mãe chorava com as palavras duras do padre, as pessoas, que eram pouquíssimas, choravam e diziam Amém. A tristeza era clara em alguns rostos desconhecidos. Quando tudo acabou, o pastor veio dar seus pêsames a família, mas mamãe saiu de lá tão rápido que o pastor nos olhou intrigado. No dia seguinte, depois da sua oração, mamãe me levou até a igreja. Ela estava fechada naquele dia, então tive de ficar na porta. Mamãe passou o cordão de prata que havia ganhado do meu avô quando era mais nova em volta do meu pescoço, me beijou na testa, e me mandou ficar ali, parada. Eu a vi se distanciando sem olhar para trás, vi ela dobrar aquela esquina e sumir. Eu esperei ela voltar, mesmo sabendo que aquilo não aconteceria.

Aquela igreja estava sendo demolida agora. Os pedaços de concreto caiam no chão e se quebravam. Os vidros estavam destruídos, e seus rústicos desenhos estavam deformados. Algumas pessoas da cidade assistiam de perto, mas eu estava dentro do meu carro, observando a destruição ser feita no lugar onde eu comecei a viver. O cupim havia comido boa parte da porta de madeira enorme, fazendo com que ela parecesse uma tábua fina e destruída no meu dos destroços. Eu vi também alguns rostos conhecidos que tiveram pena de mim anos antes. o da Sra. Shumway foi o que mais me chamou atenção. Ela estava tão velhinha e baixinha, que pensei que fosse uma criança. Ninguém daquela cidade me conhecia agora, ninguém sabia que eu era aquela garotinha de 4 anos abandonada em frente àquela igreja. Minha mãe havia mudado da cidade assim que me abandonou, e nunca mais se ouviu falar o nome Julianne McAllister. Depois de um tempo, soube que aquela cerimônia fúnebre era o enterro de meu pai, Johan Cobain. Ele morreu afogado, depois que o carro que ele dirigia capotou e caiu no mar do leste da cidade. Aquela história aterrorizante do meu passado me tormenta e sempre irá, mas agora, prefiro deixá-la de lado.

[...]

Bella está parada em frente a porta do meu quarto quando chego no campus. Ela me encara raivosa e dou a chave para que ela abra a porta.

"Me deixou trancada aqui, e ainda por cima do lado de fora!" Ela exclama quando entra, jogando a bolsa encima da sua cama.

"Precisa fazer uma chave, não acha?!" Lhe respondo. A Bella caminha até mim e concorda com a cabeça sorrindo. Ela se senta na minha frente, na sua cama.

"Pra onde foi?"

"Fui ver a demolição daquela igreja." Lhe respondo, e então tiro meu all-star lilás. Nunca gostei de falar o nome daquela igreja em especial, porque me lembra como a minha mãe era, já que ela vivia lá.

"E o que achou?" Bella pergunta, tirando a necessaire da mochila, e caminhando até o banheiro.

"Achei... normal."

"Normal como?"

"Normal como qualquer demolição, Bella." Respondo ela irritada. Bella costuma ser irritante quando faz muitas perguntas.

Dark ParadiseOnde histórias criam vida. Descubra agora