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— Você demorou, Yoongi. — Jimin, um dos diversos profissionais que precisou se adaptar ao novo modo de vida, o encarou preocupado. A cada semana ele notava as saídas regulares de Yoongi mais e mais demoradas.

— A fila estava grande. — Defendeu-se, as sobrancelhas franzidas pelo desconforto. Olhou ao redor procurando pelos guardas e os encontrou rondando outros operários alguns metros à frente. — Eu precisava saber se tinha algo para mim.

Os olhares se encontraram e Jimin pôde apenas suspirar, entendendo sua situação. Não era contra Yoongi ir até o carteiro, muito menos ansiar por uma carta de seu noivo. Seu medo era que os japoneses descobrissem e o machucassem como punição para tal violação de regras.

— Tenha cuidado... — Apoiou sua mão no ombro do outro e a pressionou carinhosamente, como numa tentativa de apoio. — Sabe o que acontece com os violadores.

— Eu sei. — Yoongi bufou irritado, odiando sentir-se tão oprimido pela guerra. Segurou as mãos de Jimin entre as suas e sorriu. — Obrigado por me ajudar.

Jimin sorriu e pensou em falar algo, mas ao ver dois guardas os encarando, pigarreou para alertar Yoongi e voltou ao trabalho, as próximas horas foram tão silenciosas que apenas respirações cansadas podiam ser ouvidas por todo o prédio.

Yoongi perdeu-se no trabalho, carregando os invólucros com pólvora. Era um trabalho que exigia atenção e precisão para que não houvesse desperdício. Enquanto alguém os limpava e descartava os que apresentavam danos e rachaduras, Yoongi recebia os que estavam em perfeito estado para que pudesse enchê-los com pólvora e assim passar a munição para que outro funcionário as colocasse no cartucho. No fim do dia, seus dedos continham novos cortes, estavam escuros por causa da pólvora e mal conseguia movê-los devido ao trabalho repetitivo. Aquelas mãos nasceram para segurar canetas e giz, não cartuchos de armas.

Vez ou outra, quando o cansaço o incitava a diminuir o ritmo de trabalho, inclinava-se sobre o próprio corpo e sentia a ponta do papel da carta o furando na barriga. Só então ele sorria por saber que, em algumas horas, poderia ler o que Taehyung tinha lhe escrito. Três anos comunicando-se por cartas. Três anos vivendo entre promessas de que voltariam a se ver e teriam uma vida confortável como sempre planejaram. Três anos em que esses desejos pareciam cada vez mais distante. Mas, lutava diariamente para se manter esperançoso. Se Taehyung estava sobrevivendo em meio ao caos, ele faria de tudo para continuar vivo para recebê-lo quando voltasse para casa.

Quando o alarme soou pelo prédio, Yoongi suspirou cansado pelo excesso de trabalho. Recostou-se na cadeira escolar, os músculos doloridos pelas horas parado em uma mesma posição. O barulho de vozes ao redor era cada vez mais alto, os demais operários apressando-se para deixar aquele lugar por algumas horas, antes que um novo dia começasse e tudo voltasse a se repetir.

Olhou para o lado e viu Jimin pegando sua bolsa, antes de se aproximar. Yoongi levantou da cadeira e a coluna doeu, precisando de alguns segundos para conseguir andar adequadamente. Treze horas de trabalho por dia tinha suas consequências e Yoongi as sentia todas.

Pegou seu boné quando Jimin parou ao seu lado, o sorriso em seu rosto indicando a felicidade genuína por não ter mais que esperar horas intermináveis para ler a carta de seu noivo. Ainda que o cansaço estivesse ali, a indignação pelo rumo que sua vida levou, a situação difícil em que vivia, nada disso era mais intenso que ter uma carta escrita à mão por Taehyung. Isso respondia sua dúvida se ele estava vivo ou não.

— Vamos? — Yoongi perguntou, a expressão ansiosa causando um riso contido em Jimin.

— Vamos. — Caminharam a passos rápidos, ambos com seus próprios motivos para se afastar do prédio em que trabalhavam. Jimin acompanhava os passos de Yoongi, o sorriso tranquilo em seu rosto quando encarava o amigo e via o brilho nos olhos. Estava feliz por ele ainda ter o homem que amava vivo, sendo que ele não teve essa mesma sorte. Ficou apenas com as boas lembranças e evitava a todo custo ver o olhar desesperado de Jungkook ao esconder Jimin no guarda roupa para que não fosse levado junto consigo. Era um rebelde, considerado uma ameaça para a supremacia do governo japonês. Tinha sido em uma noite, Jimin estava no quarto, quando seu namorado entrou correndo dizendo que estavam vindo buscá-lo. Jungkook só conseguiu escondê-lo porque todos sabiam que ele morava sozinho, então não havia motivo para procurar por uma segunda pessoa. Jimin assistiu tudo pela pequena fresta do armário em que estava. Seu namorado foi levado sob pontapés e socos e mesmo assim, Jungkook ainda lhe deu um vislumbre de sorriso e murmurou que o amava.

— Você já imaginou como é estar na guerra? — Jimin perguntou enquanto caminhavam sob um céu nublado e cinzento. Conheceu Yoongi no trabalho e desde que soube que moravam em prédios próximos, eles têm ido juntos para casa. Aquele apartamento e tudo que estava nele eram as únicas lembranças físicas que tinha do namorado, não conseguiu se desfazer.

Em meio a uma rua deserta, Yoongi sentiu a pele arrepiar quando ouviu a pergunta. Poderiam não estar no desespero de ter que lutar fisicamente para sobreviver ou ter que se esconder para não levar tiro ou ser explodido por uma granada. Apesar disso, o que estavam vivendo se não uma guerra? Todo dia ter que se submeter a um trabalho opressivo, sofrer agressões físicas e psicológicas. Era uma guerra mental, mas não deixava de ser uma guerra. Enquanto uns estavam em meio a um desespero para sobreviver, outros sobreviviam em meio ao desespero de se manter são.

— Todos os dias. — Yoongi respondeu brevemente. Não queria aprofundar aquele assunto, principalmente quando Jimin exibia aquele olhar desolador. Um olhar de quem sabe que perdeu algo muito importante e que nunca mais terá de volta. — Estamos em guerra, mas a nossa guerra não necessita empunhar armas.

Jimin murmurou algo em concordância e o silêncio retornou, tão desconfortável que era incômodo. Yoongi não gostava quando Jimin se fechava daquele jeito, mas sabia que era a maneira que ele achou para se defender do mundo ao redor. Vendo-se sozinho na rua, segurou sua mão e o viu sorrir, a luz voltando a brilhar em seus olhos, ainda que não completamente.

— Nós vamos ficar bem.

Manteve sua mão firme na dele até que vozes foram ouvidas e precisou se afastar. Não queria atrair ainda mais problemas para eles. Despediram-se em frente ao prédio de Jimin e Yoongi o esperou entrar antes de caminhar mais alguns metros e chegar em seu apartamento. Subiu as escadas e chegou no segundo andar, onde residia. Abriu a porta e se trancou por dentro, rapidamente correndo para o tapete da sala e sentando-se.

Pegou a carta até então escondida e sentiu-a úmida pelas horas de suor que precisou suportar. Rasgou o envelope com cuidado, as mãos trêmulas pelo nervosismo e sorriu confuso pelas emoções que o dominavam. Assim que abriu a carta, sentiu as lágrimas em seu rosto, impossíveis de serem controladas. Era a letra de Taehyung. Eram as lágrimas dele que mancharam as bordas do papel. Era a pólvora que sujaram seus dedos que estavam ali, sobre a folha, em meio às letras que mostravam que ele estava vivo e bem.

Enxugou o rosto molhado e vermelho e sorriu quando terminou de ler a carta. Era algo íntimo e carinhoso. Se fechasse os olhos, jurava poder ouvi-lo falando aquelas palavras em seu ouvido, enquanto era envolvido por seus braços e sentia o carinho que vinha de suas palavras doces. Riu quando Taehyung escreveu sobre como preferia comer seu arroz queimado a ter que continuar se alimentando de pão.

No fim da carta, percebeu que as letras estavam tortas. Yoongi percebeu que seu noivo, por algum motivo, estava ansioso ou nervoso e quis saber o que o deixava assim. Queria poder confortá-lo, dizer que o amava e que estava esperando por ele. Mas eram palavras confidenciadas apenas para a escuridão e o silêncio.

Trouxe o papel para o peito, abraçando-o como se ali fosse o corpo de seu noivo. A cada carta que recebia, era uma pequena parte de Taehyung que guardava para si. Às vezes sentia sua raiva, sua tristeza, seu desejo. Tudo estava ali e Yoongi sentia aquelas mesmas emoções enquanto lia. Já sentiu raiva por ver a raiva de Taehyung traduzida em palavras. Já chorou de tristeza e felicidade. Já se tocou quando as palavras que ali estavam sobre o papel eram tão desejosas e provocantes que se satisfez pensando em seu noivo.

Respirou fundo, dessa vez relendo a carta para tentar encontrar as indicações sutis de um aviso ou conselho. Passou um tempo para notar a força da caneta em algumas letras porque o suor tinha desgastado um pouco a tinta. Mas, com calma, conseguiu separar todas as letras mais marcadas e quando juntou-as em uma frase, mesmo que desconexas, deixava claro para qual caminho aquela guerra tinha ido. Só esperava que os inocentes não sofressem com o destino de uma guerra que já durava seis anos.

Ao encarar mais uma vez as letras marcadas, sussurrou-as para si mesmo, pensando em como aquilo poderia terminar pacificamente. Duvidava.

— Japão. Duas bombas.



Betagem feita por Deluded_girl

À tua espera [TaeGi]Onde histórias criam vida. Descubra agora