Prólogo

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"Park Jimin... Você tem muitas experiências para alguém tão jovem."

As palavras sambaram de sua boca como um julgamento, desconfiadas. Atenta a qualquer movimento falso, pronta para me jogar no calabouço.

A pessoa que está à minha frente me fulminando com o olhar e analisando de norte a sul todas as minhas ações é a minha empregadora, trajada em suas roupas típicas da alta sociedade. Ela tem em mãos meu currículo e histórico escolar, e espera que eu atenda as expectativas que está procurando para ser o novo tutor do seu filho de oito anos. E afogado até o pescoço como estou agora, eu preciso fazer qualquer coisa para conseguir esse emprego. Mesmo não tendo nenhuma experiência com crianças e muito menos como professor.

Portanto, é o que digo:

"Sim, senhora! Estou sempre experimentando coisas novas para amplificar minhas habilidades" Estou com a postura ereta tentando disfarçar todo o nervosismo que me faz superaquecer e suar.

Posso ter certeza que o que falei pode ser minha ascensão, mas também a minha ruína. Afinal, quem vai querer um empregado que não será cem por cento fiel ao seu trabalho? É exatamente isso que está em meu currículo. Em apenas cinco anos, já trabalhei em mais de dez locais diferentes, e pular tanto assim, só mostra o quanto eu sou um péssimo profissional.

Ainda que eu não tenha culpa da situação que vivo.

Sempre tive dois empregos. Ia para o colégio de manhã, para o trabalho na conveniência à tarde e entregava pizza à noite, nos finais de semana fazia bico em casa noturna. Era difícil manter toda essa rotina e ainda ter que estudar, mas eu dei o meu máximo porque ainda tenho esperança de que tudo possa melhorar algum dia.

Vejo um sorriso se formar nos lábios dela enquanto calmamente pousa os documentos sobre a mesinha de centro. Se recosta no sofá, cruza as pernas e os braços e me encara, não consigo distinguir sua expressão, mas está me dando calafrios todo esse suspense. Passo a língua entre os lábios que já estão ressecados.

Ela se inclina em minha direção.

"Eu não sou boba, Park Jimin" Quase tenho uma síncope depois de sua sentença. As expressões dela são dançantes, por isso não consigo descobrir o que ela pode estar pensando. Seu sorriso é meio torto, com olhar suave.

A ideia de que ela possa ter descoberto o motivo de eu estar aqui me desespera, mas opto por continuar fingindo ser um bom rapaz.

"O... O que quer dizer?" Gaguejei miseravelmente.

Minha empregadora deita a cabeça de lado ainda sorrindo torto. Ela ajeita a postura e pega a jarra de suco, despeja o líquido laranja em dois copos e empurra um para mim. Ela faz um gesto com a mão como se dissesse "sirva-se". Pego o copo e tomo um gole generoso mesmo sem vontade. É suco de manga.

"Se sente mais tranquilo?" Eu assinto, mas não estou tranquilo "Sabe..." Ela começa, olhando para um ponto qualquer pela janela de vidro "Eu costumo investigar a vida dos meus empregados e não é por ser uma vaca stalker ou algo assim" Ela direciona sua face para mim e neste momento estou quase derretendo de tanto suar de nervosismo. Então, sorri audível "Esse lugar..." Coloca o copo sobre a mesa "É cheio de segredos e eu preciso de pessoas confiantes. Entende?"

"Perfeitamente" Respondi em um pio. Pigarreio.

"Quando eu vi o seu currículo... Um jovem de vinte anos que ao invés de está se programando para a faculdade, está procurando emprego, eu me senti mais curiosa e acabei descobrindo coisas demais" Engulo em seco.

A essa altura minha postura já não é mais a mesma, a confiança que eu tinha se dissipou tão rápido quanto chegou. Meu coração acelerado me faz respirar com dificuldade. Cogito se devo permanecer aqui ou se devo ir embora correndo agora mesmo.

Eu deveria estar estudando para os vestibulares ou quem sabe já ter feito. Não faço ideia, porque não acompanho nada sobre isso, não tenho amigos e muito menos tempo. Trabalho desde os quinze anos para ajudar meus pais a pagarem as dívidas que se acumulam desde o dia em que os dois disseram sim em frente ao padre. Trabalhar na conveniência estava sendo suficiente para pagar parte da prestação da casa e a conta de luz, enquanto meus pais trabalhavam para pagar outra parte da prestação da casa, do buffet do casamento, apostas perdidas por parte do meu pai e dinheiro emprestado de alguns parentes. Dava para viver razoavelmente até então. Mesmo com as contas atrasadas e aumentando o valor todo mês por causa dos juros.

Até que meus pais resolveram pegar dinheiro de agiotas.

Foi o melhor mês que tivemos até o agiotista decidir que queria o dinheiro de volta.

Em uma manhã de sábado, quando acordei no quarto vazio (todos os móveis foram vendidos, apenas os essenciais ficaram como os futons, edredons, geladeira e fogão), e fui até a cozinha comer o que restava na geladeira. Me deparei com um bilhete da minha mãe juntamente com um anúncio de emprego.

Desculpa filho, uns caras apareceram aqui essa noite, mas não se preocupe eles não sabem sobre você, faremos o possível para que eles nunca saibam, por isso estamos indo embora. Envie seu currículo para este e-mail, eles pagam melhor e tenho certeza que você vai conseguir. Beijos, te amo. Espero estar viva ainda para te encontrar no futuro. Seu pai manda beijos.

E foi então que a ficha caiu, eles me abandonaram. E não só me abandonaram como estão correndo risco de morte.

A princípio fiquei em choque e sem saber o que fazer, apenas deixando que as lágrimas caíssem pouco a pouco enquanto ouvia minha barriga roncar de fome. Mas as coisas não podiam ser assim para sempre.

Simplesmente não! Eu não aceito.

Uma coisa que sempre valorizei em mim mesmo e nunca deixei que morresse, foi o meu otimismo e esperança. E sem isso, eu não sou nada.

Então me levantei, peguei meu celular velho e enviei o currículo.

E esperei. Me questionando todos os dias enquanto ia para os meus empregos se realmente valia a pena existir nesse mundo e continuar tendo esperanças.

E aqui estou eu, sendo desvendado por minha empregadora e dissipando todas as chances que eu tinha de conseguir um salário melhor para pagar as contas o quanto antes.

"Não se preocupe" Ela abana as mãos em minha direção "Eu vejo que você realmente está se esforçando. Suas notas são perfeitas. Você conseguiu se manter acima da média mesmo quando tudo estava fora de lugar" Me oferece um sorriso que eu não consigo retribuir "Eu diria que você é um garoto corajoso."

"Obrigado..." Eu digo já sem ânimo, ciente de que ela vai me dispensar a qualquer momento.

"É por isso que essa vaga é sua."

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