Baú de merda

Eu sou um maldito gato

Você não quer uma amiga de verdade

Você quer uma maldita cachorrinha

Que lhe dê a patinha quando mandar

Alguém que esteja sempre lhe abanando o rabo

Não importa se você a deixou acorrentada o dia todo

Chão duro e frio

Com monstros ao redor lhe assombrando

Alguém que te receba com a mesma empolgação não importa

se a largou na estrada e em seguida viajou pra Miami

10 anos ou mais ausente

Mas eu ainda

Ainda devo sorrir pra você

Sorrir pra você

Mesmo que me açoite e diga que sou menos alguma coisa que os outros cães cheios de pedigree

Mas eu ainda, ainda devo pegar o graveto que você jogou

Ainda tenho que te devolver e me sentar quietinha

Mesmo, Mesmo... que me veja como inferior a sua suprema raça

Abençoada por deus

Ao menos você ainda não me matou né?

Pelo menos você me deu um nome e diz pra todos que sou da família

Mesmo... mesmo que toda noite tome chuva acorrentada na calçada

Mesmo... mesmo que você me dê restos em vez de uma refeição digna

(E as vezes se esqueça)

Eu ainda devo latir e abanar o rabo

Orelhas abaixadas sempre

Mesmo que você diga que direito dos animais é besteira

Besteira

Besteira

Querida, você se enganou

Talvez por eu ter permanecido dócil por tanto tempo

Você pensou que havia me domado

E que eu nunca

Nunca me revoltaria

A toda essa sua falta de humanidade

Mas querida, eu sou um maldito gato

Livre e com um mínimo senso de auto dignidade

Se permaneço é por livre e espontânea vontade

E não dependência emocional sem sentido

Querida veja

Vou chiar e dobrar de tamanho

E quando tentar me tocar novamente

Unhas grandes e afiadas acertarão em cheio o seu rosto infeliz

Pulo pra fora da janela

Alta carta de euforia eu me concedo

Não, você não quer uma amiga de verdade

Você quer uma serviçal

Subordinada

Tudo

Menos uma relação de igual pra igual

Mas que pena pra você

Porque eu sou um maldito gato