Noites de Verão

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O que será que é tão inebriante no perigo, na insegurança ou na esperança vã?

O que é que nos faz sempre tomar partido dos casos perdidos ou proibidos.

Os Maias, Romeu e Julieta, Titanic, Amor de Perdição... tantas estórias condenadas ao fracasso e mesmo assim conquistam o coração de toda a gente.

Foi com este pensamento que me lembrei de uma história para contar.

Era uma quente noite de Agosto, estava em Fátima com o grupo de campismo e alguém, algures depois do jantar, lembrou-se de acender uma fogueira e contar estórias de terror.

Dona Teresa riu-se, concordou no entanto em disponibilizar-nos alguns poufs confortáveis e algumas lanternas, juntamente com três pacotes de bolachas Maria; no entanto fez-nos prometer que não contaríamos estórias de terror porque os mais novos ficariam impressionados com facilidade.

Calmante entramos pelo bosque a dentro e escolhemos uma clareira agradável onde nos estabelecemos.

Abri o primeiro pacote enquanto escolhiam quem começaria; eis que uma garotinha com não mais de oito aninhos nos mostrou o seu melhor beicinho e obrigou-nos a satisfazermos o seu pedido de uma história de uma amor impossível.

Ironicamente, a fava calhou-me a mim, a rainha do romance, a irrevogável cupido, a eximia namoradeira.

Após alguns suspiros de resignação, cedi. Endireitei-me e comecei calmamente:

Uma vez conheci uma menina; essa menina era corajosa e tempestuosa, assim como cativante e matreira. Era de estatura baixa e tinha bochechinhas salientes, cabelos flamejantes e anelados e olhos de um verde flamejante, sardas ruivas pintavam-lhe a cara de branca porcelana.

Estava essa rapariga a estudar Direito na altura, era muito independente e organizada. Era feminista e lutava por direitos de género iguais.

Certo dia conheci um rapaz; esse rapaz era pacifico e pachorrento, assim como astuto e manipulador. Era alto e esguio, tinha cabelo curtíssimo preto e a pele escura como o café que constantemente bebia.

Esse rapaz estava a estudar Engenharia Física, era extremamente desorganizado e esquecia-se dos óculos em qualquer lado. Era machista e antifeminista.

Tínhamos amigos em comum e ambos frequentavam o meu grupo de amigos de tempos a tempos.

Quis o destino que ele se apaixonasse por ela e começaram a falar, nunca souberam das preferências um do outro e apesar das características de cada um isoladas serem antagónicas, como um todo funcionavam extremamente bem.

Durou esta relação não assumida e puramente platónica cerca de quatro meses, até que vieram a descobrir a sua polaridade em relação ao papel feminino na sociedade.

Sou sincera e digo que ambos eram extremamente cultos e interessantíssimos, mas de formas diferentes e foi assim que dois indivíduos tão diferentes vieram a amar-se para um dia se odiarem.

Quando a minha narrativa terminou o silêncio reinava e depois de um revirar de olhos dos mais velhos, fui convidada a ir para casa uma vez que o frio daquela escaldante noite de agosto estaria decerto a fazer-me mal.

Fui para casa e voltei a pensar nos meus dois amigos, aproveitei o resto do serão e escrevi-lhes uma carta a sugerir a reconsideração da sua relação, após a escrita de ambas fui rezar e depois dormir.

S.B.F.F.

Compilação de ContosOnde histórias criam vida. Descubra agora