Coração Lascivo

Quatro de Copas

Quatro de Copas

– Só pode ser brincadeira. – Murmurou para si mesmo, repensando no que tinham lhe contado;  que Dorian havia passado todos os dias daquela semana na casa de Aura.

O surto de coração partido de Ramon, havia evoluído para uma crise psicótica, tudo que sentia era ódio, um ódio incontrolável, uma sensação de propriedade o apossara; Aquilo estava longe de ser amor, aliás não passava nem perto, era a mais pura e doentia obsessão, tal qual se apossara do corpo de Ramon. Pandora e Cesar, observavam de perto o buraco em que Ramon tinha decidido se enfiar, não dizia uma única palavra a pelo menos quatro dias, e nem confirmação verbal de que algo realmente acontecia entre Aurora e Dorian ele havia recebido, eram apenas boatos.

A dor incessante em seu peito, a dor da perda e a sensação de senti–la escorrer por entre seus dedos, não parecia natural, nunca achou que acabaria daquela forma, não podia aceitar aquilo, o que teria sem ela? Sem que ela fosse inteiramente sua, como sempre havia sido, não era capaz de dividi–la com mais ninguém, não daquela forma, em seus anos juntos, ambos ficavam com outras pessoas, mas não aquilo... Ramon sentia um ódio tão nefasto, que rasgava seu peito e queimava seu estômago, parecia uma força maior do que sua razão e o "amor" que sentia por ela... Queria matá–la, e poderia, por ela nunca tê–lo olhado como havia olhado para Dorian. 

– Acho melhor você pegar leve Ramon. – Pandora se agacha a altura do garoto que separava mais uma carreira de cocaína para cheirar. – Isso não a trará de volta. – Segura sua mão pegando o cartão que usava. Ele estava no mesmo lugar há dias, encostado no canto da sala entre cacos de anjos de porcelana.
– Eu não preciso da sua piedade Pandora. – Atira levanta os olhos verdes para ela, julgando cada aspecto da garota, fio a fio de seu cabelo emaranhado com ar de pos–sexo, os labios inchados e o lado esquerdo do rosto vermelho, que explicava os barulhos que tinha ouvido. 

E então, ele imediatamente se sente um lixo, putrefato e descartável, outra garota que o tinha trocado, não podia ser tão desprezível. Estava transando a uma semana com Pandora, mas foi só ela por os olhos em Cesar que o esqueceu completamente, não tinha pensado sobre isso ainda, e nem conseguiria, não importava, nada além de Aurora e o doloroso fato de que ela não o amava importava, talvez ele nem se importasse se ela o amava ou não, só a queria para si.

Ela se retira balançando a cabeça com pacote de cocaína e o cartão, enrolada em seu robe preto de seda, nua por baixo dele, respirou fundo entrando na cozinha, observando Cesar com uma frigideira no fogão, as costas definidas ainda brilhando do suor do que tinham feito no quarto, era um homem lindo, lhe arrancava suspiro, sua pele era tão escura quanto a noite e seus olhos cor de mel, tinha quase dois metros de altura, era o mais alto entre seus amigos e provavelmente o mais gentil.

– Ele vai morrer se continuar assim. – Cesar acusa Pandora, colocando no prato dela um ovo.
– Você não deveria dar tanta droga para ele. – Completa Tristan, que havia passado ali para ver como Ramon estava, Pandora mal o encara.
– E o que mais nós podemos fazer? Se não, oferecer algum tipo de conforto a ele? – Diz indignada com a acusação. – E eu me preocupo mais com a vida dessa garota do que com ele.
– Não diga isso. – Cesar sabia exatamente o que Pandora insinuava, pois ela já tinha apontado a ele os traços feminicidas de Ramon, mas ele se recusava a pensar nisso, balançando a cabeça tentando afastar aquilo.
– Não acho que ele seria capaz. – Tristan bica seu café secando os seios de Pandora, que nem ao menos tinha parado para pensar porque Tristan passavam ali todos os dias no mesmo horário, todos dias ele passava para ver Ramon.
– O amor dele é doentio, se ele ficasse perto dela nessas condições, iria acabar tentando matá–la. – É direta, não faria meias palavras sobre aquilo. Franzia a testa perturbada, mas a luz que se acendeu em sua brilhante mente, suaviza as rugas que havia feito, não iria interferir. – Eu sou grande fã do empirismo, traga ela aqui e vejam o que acontece.
– Ele gosta demais dela. – Tristan balança a cabeça desacreditado.
– Ele nunca a machucaria, são melhores amigos. – Insiste Cesar.
– Ele nunca a machucaria, ele não vai perder tempo com isso, ele vai matar ela! – Altera seu tom de voz indignada com inocência de Cesar.
– Para Pandora! – Gritou batendo e largando a panela na mesa, não era capaz de acreditar que um de seus melhores amigos fosse capaz de algo assim, mas provavelmente era. Tristan derruba parte do seu café sobre a mesa pelo susto que havia levado.
– Olha o estado em que ele está só com esses boatos, vocês já pensaram o que vai acontecer quando ele os vir juntos? Até que demorou demais! – Estava fria, como a pedra de mármore que repousava suas mãos. Observar os próximos passos daquela história, lhe tiraria algumas dúvidas. – É inexorável que eles fiquem juntos.
– O que significa? – Não tinha entendido a sentença, não sabia o que a palavra significava. – inexorável?
– Fatal, inelutável, irremissível, mortal...
– Inevitável... – Tristan completa.