1999 (A eterna busca por uma identidade)

Eles & Elas

Eles me diziam que eu nunca iria ser ninguém na vida e por muito tempo eu acreditei nisso.

Eu já falei que minha família não é a das melhores, obviamente já citei alguns fatos mas essa não é nem de longe a história toda. Minha família é muito grande,eu não tenho a irmãos mas em compensação tenho vários primos,que resumidamente seis eu tenho mais contato e quatro foram criados como se fossemos irmãos,sendo todas mulheres,minha mãe tem quatro irmãos e por 16 anos morei com três deles,o que me fizeram ter muitos pontos de vista quando se trata de família.

Para mim família são um suporte,que estão sempre ao seu lado quando você precisar e te oferecem um amor incondicional. Minha mãe e meus tios são muito unidos, frequentemente dando suporte uns para os outros, relembrando o passado com leveza e alegria,todos os anos passando o natal juntos e comemorando um novo começo,por mais que meus tios tenham sido "ruins" com a minha mãe,seu amor é incondicional,não impedindo que ela cuide dos seus irmãos. Isso me ensinou como é importante ter alguém do nosso lado e me fez perceber que quando eu tiver meus próprios filhos, também quero passar a diante esse mesmo sentimento para eles.

Mas apesar de presenciar essa constante demonstração de carinho, comigo não era a mesma coisa, tendo que suportar vários assédios psicológicos e zombarias por causa da minha personalidade,eu comecei a ser uma pessoa fechada,estava constantemente irritada e não conseguia sentir nada além de ódio por todos eles por muito tempo.

Hoje eu sou uma pessoa reservada que não gosta muito de contato humano com pessoas a qual eu não tenho intimidade,sim sou individualista,o que dificultou muito a minha vida na adolescência, principalmente morando em uma casa com sete pessoas. Eu sofria bullying na escola,tinha problemas por causa da descoberta da minha sexualidade e não tinha muitos amigos,mas a pior parte do meu dia era ter que voltar para a casa,com a minha família causando uma pressão e um desespero frequente na minha cabeça, criticando cada passo que eu dava,com comentários sarcatiscos e agressivos do tipo "Você não parece uma garota,você age igual a um animal","Porque você precisar ser desse jeito?"ou "Você nunca vai ser alguém na vida" essas frases ecoaram na minha cabeça por longos anos,me fazendo acreditar que eles estavam certos,que eu nunca iria conseguir ter nenhum tipo de sucesso e não merecia nenhum tipo de oportunidade.

Na maioria das vezes que eu contava para a minha mãe sobre as atitudes dos meus tios ela não parece levar muito a sério,teve até uma vez que minha tia leu meu diário e descobriu que eu não gostava dela,dessa vez a minha mãe ficou claramente chateada mas quando fui falar sobre o assunto com ela,ela me mandou calar a boca,isso acontecia com frequência,todas a vezes que eu me defendia em uma discussão com meus tios ela me mandava calar a boca e abaixar a cabeça enquanto meus tios gritavam comigo citando muitas ofensas,por causa disso,hoje eu não admito quando um homem grita comigo, mas constantemente eu perguntava para ela o porque dela sempre fazer isso,não deixar eu me defender e ainda me silenciar caso questione suas atitudes,ela sempre se faz de desentendida ou fala "Eu não lembro de ter feito isso,deve ser coisa da sua cabeça",muitas vezes eu me perguntei se eu realmente inventei tudo isso,eu realmente tenho uma imaginação fértil mas de tanto as pessoas da minha família falarem que as coisas que eu sei,que eu vejo e conheço são invenções da minha cabeça,até hoje em dia eu fico me questionando se tudo o que eu passei é verdade ou somente fruto de uma imaginação fértil e perturbada

A pesar de tudo a minha família se tornou presente em alguns momentos,como em todas as minhas tentativas de suicídio,que no total foram quatro,uma com 16,18,19 e 20,meus tios sempre estavam no hospital,mas eu sinto que era mais para consolo da minha mãe do que em consideração a mim e isso se afirmava cada vez mais, quando meus tios contavam para outras pessoas estranhas das minhas crises e tentativas de suicídio, quando minhas primas ficavam perguntando "Se eu não tinha vergonha de agir desse jeito?" ou falavam que"Elas já passaram por coisa pior e elas nunca fariam o mesmo que eu" ou quando minha tia frequentemente dizia "Você não pode ficar doente,vai acabar matando sua mãe e ela precisa de você",isso machuca toda vez que me lembro pois não dava nem uma semana após toda essa situação e elas começavam com esses tipos de atitude,o que me fez pensar que "Eu não tenho família,eu tenho parentes" pois anos se passaram e eu ainda não posso confiar em nenhum deles.

No entanto,hoje,depois de muitos anos de reflexão,surtos e crises eu consegui perdoar todos eles,eu nunca fui uma santa,sou uma pessoa difícil, com uma personalidade forte e instável,eu nunca consegui ter o relacionamento dos meus sonhos com todos eles,não consigo demonstrar o que realmente sinto por vergonha e medo de ser rejeitada,mas mesmo que seja para ficar sentada no sofá olhando para o nada eu vou em quase todas as festas de aniversário,me preocupo quando ficam doentes,faço o que posso para criar boas memorias com os meus primos mais novos e gosto de passar todos os natais com eles,mas não sei se conseguiria passar mais de um dia em suas casas ou se chamaria eles para o meu casamento,me colocaram em uma posição onde as dúvidas e a desconfiança dominam,o carinho e amor da minha parte existe mas não sei se é recíproco,porque até hoje eu nunca ouvi nenhum "Eu te amo" da parte deles.

Minhas memórias são dolorosas,mas todas elas me ajudam a perceber o quanto eu consegui evoluir como pessoa,por isso tenho orgulho de todas elas mesmo que maioria ataque a minha ansiedade no meio da noite.