Prólogo

143 25 143
                                    

Todas as pessoas, vivas e já mortas, sabem da história ao redor daquelas três almas fadadas a reencarnar. Sabem como a verdade mais antiga de todas. Uma tríade de heróis, os eternos defensores do mundo, da ordem e da luz. Três almas que impunham armas anciãs e a força da própria natureza consigo. Essa tríade está fadada a sempre reviver, para proteger a paz e a ordem do mundo de uma quarta alma — vil e maligna — que busca trazer somente a ruína e a desgraça.

Uma quarta alma, pois, se existe a ordem, também existe o caos. Existe escuridão, existe a desordem. Uma quarta alma que sempre irá reencarnar junto daqueles três, pois estão destinados a colidir. Os Três Heróis e o Agente da Mudança, uma alma que personifica o próprio fogo. E todas as pessoas, vivas e já mortas, sabem da história ao redor daquela alma fadada a reencarnar, toda geração, para incitar a destruição e o conflito. Sabem como a verdade mais antiga de todas.

E após anos e mais anos, uma sala é preenchida no absurdo terror de mais um crime hediondo feito por essa vil alma. Em total desolação, os Três Heróis contemplam o corpo morto do Príncipe Abelíris, da Linhagem Dourada. Um sinal do início de mais um horrífico embate entre as forças da Ordem e do Caos. Silêncio sepulcral ensurdece os ouvidos dos Três Heróis, perturbando-os. Um silêncio mais barulhento do que se todos os instrumentos do mundo estivessem tocando em desarmonia.

Velando o corpo, ao centro da sala sob uma mesa de granito, os Heróis remoem e remoem a angústia de não terem conseguido evitar aquela tragédia. Assassinado friamente durante uma noite, em seu quarto, dentro do castelo. A razão ninguém sabe, mas o assassino? Somente uma resposta vinha à mente das pessoas. A quarta alma, o Aspecto do Caos. Sim! Só ele poderia burlar toda e qualquer muralha, parede, segurança e lógica que rodeiam a Cidade de Ouro e protegiam o príncipe. Ninguém viu o assassino ou percebeu qualquer irregularidade naquela noite. Foi uma morte que só foi sentida — e percebida — quando o sangue já estava coagulado. A sombra de quem poderia ter feito isso é certa: o Agente da Mudança, o Aspecto do Caos e do Fogo. Perpetuador de tragédias e pesadelos. Que trouxe desastres, destruição e incontáveis mortes desde o início dos tempos, nas eras mitológicas!

Um dos Três Heróis se mantém afastado, tentando reunir calma e se manter sob controle. Com sua respiração ofegante, os braços cruzados para tentar manter a compostura, a pose, mas na verdade sendo um sinal de puro e total abalo emocional. Tentando se manter em um pedaço só, se encolher, conter o terror que faz o corpo tremer. Após todos aqueles anos...

— Eu não consigo acreditar que isso aconteceu — o Aspecto da Terra verbaliza (uma vez mais). — Eu não consigo aceitar que ele morreu assim.

Coatlicue anda de um lado para o outro.

— Nós sabemos bem quem é o responsável por isso — o Aspecto do Ar, Vayujin, enfatiza.

O Aspecto da Terra, Coatlicue, não responde.

— Foi ele — Vayujin diz.

— Após todos esses anos? Ele havia desaparecido! Fugido! Se escondido em algum canto sombrio deste mundo! — ela argumenta.

— É do Aspecto do Caos que estamos falando! — Vayujin se vira na direção da colega. — Sabíamos que um dia ele voltaria. Sabíamos que um dia ele iria trazer a ruína!

O Aspecto do Caos. A Mãe-Vil de toda criatura abominável que aflige esse mundo. Que profanou a terra para erguer montanhas que rasgaram os céus. Que bafejou temor e violência sob as terras deste mundo. Que manchou as águas de sangue e impurezas. Uma nova tragédia agora se soma a incontáveis lista de blasfêmias do Aspecto das Trevas, matar aquele que estava prestes a receber a coroa e se tornar o monarca da Cidade Dourada. Abelíris teria se tornado, talvez o mais iluminado rei que essas terras e a própria história já tinham conhecido! Ah, se eles tivessem encontrado ele antes... Se não tivessem sido tão tolos... Abelíris poderia estar vivo.

O Aspecto da Água, Tales, escuta aquela conversa afastado, ainda lutando para conter sua ansiedade. Está quieto, sem conseguir reunir palavras ou forças para se unir aos dois colegas. Juntos, eles são a tríade lendária de heróis dessa geração. E Tales sente seu coração sendo esmagado em arrependimento. Tudo isso é culpa dele. Toda essa tragédia e qualquer outra tragédia que acontecer daqui para frente é culpa dele e de seu coração juvenil, inocente e utopista.

Afinal, Tales conhecia muito bem quem acusam como o responsável por aquilo. Tales o conhecia muito bem, mais do que qualquer outra pessoa. Se sente culpado, se sente traído e se sente um tolo. Todos aqueles sonhos, aqueles planos, ideais.... Só de pensar em Sol, o coração de Tales já se confrange. Sua mente se pergunta em que momento ele errou ou se não errou desde o príncipio? Lágrimas mancham sua visão. Abelíris não merecia ter morrido, muito menos daquele jeito. Tales precisa saber. Se foi Sol, o Aspecto do Caos, quem fez aquilo, após sumir por tantos anos. Precisa vê-lo. Precisa revê-lo e confrontá-lo.

— Precisamos ir atrás dele — Tales anuncia, entrando no salão com os olhos marejados, a voz falha porém resoluta. — Antes que mais destruição e caos conquiste espaço e corações. Precisamos ir atrás dele. Precisamos ir atrás de Sol, o vil Aspecto do Caos! Por Abelíris e por todos que prezamos.

Pois chega desse "agora" doloroso. O único jeito de entendermos quando Tales errou — se errou — é voltando. Voltando ao começo. Quando tudo começou. Não para as eras mitológicas, mas para aquele bosque onde por puro acaso do Destino, aqueles dois se encontraram.

Aspecto do Caos - Alma de FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora