PASSADO
— Charlene esse é o último paciente, não é? — aponto para o homem que acaba de sair levando seu cachorro. Eu me aproximo da mesa da recepcionista na minha clínica veterinária, que está de pé há três anos desde que me formei. O negócio deu tão certo, que fui capaz de comprar a propriedade onde antes eu alugava um espaço. E agora estou pagando o meu apartamento. Respirar livre de aluguéis é a melhor coisa na vida de uma mulher solteira e independente.
Na minha adolescência, nunca passou pela minha cabeça que eu pudesse ser feliz e completa sozinha. É maravilhoso.
Charlene, além de minha funcionária, é uma das minhas poucas amigas. Ela tem a minha idade, é ruiva e adora o estilo hipster despojado. Ama tiaras, batas bordadas, calçados estranhos, muita bijuteria e desfila com uma bela cabeleira cacheada estilo Merida, a princesa da Disney. Acima de tudo, Charly ama os homens e não sossega com um único.
Por ela, cada dia eu estaria com um diferente. É inconcebível para Charlene que eu não desfrute sexualmente dos homens que me cercam.
— Sim, Madison. Tinha a senhora Bertand, mas remarcou para amanhã.
— Lily novamente rejeitando a ração?
— Provavelmente. Ela sempre vai supor que a gatinha está doente. Me espanta que ela não saiba que gatos são os bichos mais esnobes em relação a comida. Se tiver ração no pratinho de um dia para o outro, eles já torcem o nariz.
Rio concordando com o que acabo de ouvir, mas antes de voltar para o consultório, noto uma figura espiando na vitrine. É um homem. Ele é enorme e desconhecido. Nunca o vi por aqui, e como a cidade é pequena, eu certamente me lembraria de encontrar uma figura tão marcante. Ele usa óculos escuros e boné e, ao perceber que o flagrei, se afasta rapidamente.
— Você viu isso? — pergunto a Charlene.
— Sim. Esse gostosão já passou por aqui hoje e espiou pela vitrine. Tomara que esteja interessado em mim. — Ela abre o estojo de maquiagem e olha os lábios no espelhinho. — Já que você fez voto de castidade e não pega ninguém há anos.
— Cuida da sua vida, enxerida! — Ela gargalha com meu xingamento. — Tome cuidado quando for embora — alerto e volto para terminar de arrumar tudo antes de fechar a clínica.
Peter, meu assistente, já se trocou.
— Estou indo, Madison.
— Até amanhã, Peter. — Aceno para ele e ouço as vozes em tom divertido, dele e de Charlene.
Charly está mentindo. Eu fiquei, sim, com alguns homens depois de ser abandonada na universidade por Quentin. Não posso classificar como namoro, afinal cada um deles foi um fracasso após partir para o sexo. Sempre a mesma coisa: é bom e gostoso enquanto estamos nos conhecendo, mas a partir do momento que se torna sexual, eu fujo da relação. A culpa foi toda minha, confesso. Eu simplesmente travo e não consigo seguir adiante. Minha bagagem é imensa, e Quentin está nela.
O sexo com outro homem era como se eu enfim estivesse matando Quentin em meu coração, e isso me perturbava. Inconscientemente meu coração e mente aguardavam o dia em que ele pudesse voltar. Talvez fosse o coração mais vira-lata que já viveu nessa Terra.
Ouço Charlene gritar que está indo embora e que já colocou a placa de "fechado" na porta. Fico mais tranquila. Não tenho o que fazer em casa, então posso passar um tempo a mais aqui. Inclusive, a clínica em si até me acalma. Revisar laudos, rever chapas de raio x, ler prontuários.
Ouço o sino da porta avisando que tenho visitante.
— Estamos fechados — grito.
Retiro o jaleco azul-claro e visto meu suéter vermelho de lã que, coincidentemente, combina com a armação vermelha dos meus óculos de leitura. Dou uma olhada em meu cabelo, que dessa vez optei por prender os cachos volumosos em um coque. Saio do consultório para verificar quem abriu a porta. O homem estranho está parado na recepção.
VOCÊ ESTÁ LENDO
(AMOSTRA) EU AINDA TE AMAREI AMANHÃ (único)
RomansaMadison vive seus dias atuais para odiar Quentin, capitão das forças armadas dos EUA. Quentin acaba de sair da prisão e é escolhido para chefiar uma missão suicida de resgate, onde uma das reféns é ninguém menos que Madison. Ele está ansioso para r...