05 - QUENTIN

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Dias atuais

O barulho dos ferrolhos se abrindo e fechando ainda ocupa espaço considerável na minha memória e causa algo que parece raiva, apesar de ser gratidão e alívio que deveriam me possuir nesse momento. Enfim, livre. Livre para ter a minha vingança. Durante dois anos foi apenas isso que me manteve vivo e não me deixou desistir. Eu quero justiça. Por isso a raiva, e não a gratidão.

— Você vai prometer que não vai buscar vingança ou justiça — Major Ettore Zour me avisou quando me tirou da prisão, porque ele me conhece e sabe o que se passa em minha mente e coração. Zour foi o único a estender sua mão enquanto eu percorria as chamas do inferno. — Caso se meta em encrenca, eu serei o primeiro a te foder sem pena, porque eu quase tive que mamar o presidente para conseguir sua liberdade, está entendendo, McBride?

Zour não descansou enquanto lutava para me tirar da prisão, e não vou desapontá-lo. Apesar de ele saber que em algum momento eu terei minha vingança.

O major é um italiano de quase quarenta anos, tem um passado ruim e misterioso. É o típico hipócrita que fala de mim, mas sei que por dentro ele daria qualquer coisa para dar um belo e delicioso troco em quem quer que o tenha ferido.

Consigo banir essas lembranças que se atropelam com a realidade enquanto me encaro diante do espelho, após vestir o traje tático para combate. Pelo tempo em que estive preso, com minha patente suspensa, jamais imaginei que um dia pudesse novamente ter a honra de vestir o símbolo da minha pátria. Uma honra que aquece meu coração de maneira extasiante. Eu nasci para isso, para me doar de corpo e alma ao país na linha de frente de defesa. Dentre as coisas horríveis que me aconteceram, ser afastado da minha carreira foi a pior dor. Porque eu errei com Madison e sabia que deveria pagar. Mas com o exército, não. Eu não errei, fui injustiçado.

A roupa camuflada escura é quente e grossa. Geralmente, quando termina de vestir, o soldado tem uns trinta quilos só de tralha presa ao corpo.

O colete é feito de kevlar, uma fibra sintética capaz de deter impactos de uma 9mm. É o mesmo material do capacete que colocarei mais tarde. Uso duas meias em cada pé, uma bolsa com remédios de emergência, com direito a analgésico injetável, uma semiautomática Colt calibre 45, que acabo de verificar antes de acoplá-la no coldre, uma faca com lâmina de 20 cm, munições, cantil de água, kit limpa-arma e não menos importante, o bebêzão: um fuzil m-16 que certamente Zour vai deixar para me entregar quando chegarmos ao destino.

Maledetto! Está colocando um vestido de noiva? — Zour bate na porta. — Se precisar de ajuda com a grinalda, basta avisar.

Puxo a porta e passo por ele, deixando que veja minha carranca. Seu sotaque italiano me irrita quando estou puto. Zour nasceu em Messina, região da Sicília, e veio em algum momento para os Estados Unidos; uma origem que ele odeia contar e que ainda é cercada de mistérios.

— Está lindão — debocha. — Quer tirar uma foto antes de ir?

— Vai se foder.

— Coloca isso. — Ele me entrega uma câmera para usar no corpo. — Os grandões vão assistir tudo que a gente fizer.

— Você vai usar? — indago, prendendo a câmera no colete. Zour apenas bate na dele, que já está instalada. — É uma pena, vai ter que se comportar e ficar sem sua carnificina costumeira.

— Não sei do que está falando. — Ele passa por mim, saindo da casa, e eu o acompanho fechando tudo logo em seguida. Meus pais estão lá fora. Rambo já dentro da caminhonete, vai passar esses dias com eles.

(AMOSTRA) EU AINDA TE AMAREI AMANHÃ (único)Onde histórias criam vida. Descubra agora