Capítulo Quatro

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O telefone de Emily não parava de vibrar em seu bolso. Seu bairro era bastante tranquilo, podia andar vestida em ouro sem medo de ser assaltada, mas preferia evitar usar o celular durante caminhadas — mesmo que fosse apenas o percurso de volta da escola para casa — , era seu momento de esvaziar a cabeça, relaxar. Ela só precisava de alguns momentos por dia para não pensar em nada importante, esquecer o namorado, a escola, o vestibular, o tcc e qualquer outra coisa que a atormentasse. Eram apenas mensagens, se fosse algo realmente importante certamente receberia uma ligação.

Chegando em casa o clima está diferente, há algumas bolsas pela sala e uma risada vinda da cozinha. Apesar de se darem muito bem — mais do que a maioria dos casais que conhecia — , os pais de Emily não costumavam rir alto. Suas atividades de casal eram mais calmas como em jantares em seus restaurantes favoritos e filme nos finais de semana. Tanto barulho era incomum.

Antes mesmo de chegar à cozinha, sua mãe veio ao seu encontro:

— Emily! Aí está você! — parecia que não via a filha há dias, quando na verdade elas tinham tomado café juntas horas antes — te mandamos milhares de mensagens.

— Sim... Eu percebi.

Quando ia iniciar sua investigação pelo motivo da estranheza de sua mãe, apareceu seu pai com um garoto, quase o enforcado no abraço.

— Emily! Você lembra do Lucas?

E como esquecer? Eles foram grandes amigos na infância, até que seu pai morrer e a mãe arrumar um novo marido. O padrasto os afastou da família, e então Emily perdeu contato com o primo.

O garoto sequer teve oportunidade de falar pois o pai de Emily continuou:

— Então, ele vai morar aqui. Conosco — Emily faz uma cara confusa e antes que ela pudesse questionar qualquer coisa, o pai retomou — sua mãe vai conversar com você. Por hora, tenta dar uma arrumada no seu quarto.

Não era possível que seus pais fossem colocar um garoto estranho para dormir no mesmo quarto que ela. Apesar de ser um parente, ainda era um menino , um estranho, no quarto dela.

Em menos de vinte minutos ela arrumou o quarto. Sua mãe chegou e, antes mesmo que pudesse iniciar a conversa, Emily já disparava a falar.

— Não é possível que vocês vão colocar um garoto estranho...

— Ele é seu primo, Emily! — sua mãe interrompeu.

— Ainda assim, um menino estranho! Dormindo no meu quarto? — ela falava alto o suficiente que qualquer pessoa no andar de baixo, com o mínimo de audição, poderia ouvir.

— Quem falou isso, doida? Não vai ter ninguém dormindo com você. Vamos limpar o quarto de hóspedes para que ele fique lá, mas para que caiba uma cama descente e pelo menos uma cômoda, é preciso que algumas coisas venham para o seu quarto. Você é uma garota compreensiva, acredito que não vai fazer objeções.

Era o que os pais de Emily sempre faziam: a obrigava a fazer algo que lhe incomodava, em troca ela recebia elogios sem fundamento. Mas era inevitável, ela sempre cedia, ela sempre aceitava tudo.

Quando a mãe ia se levantando e o assunto parecia ter se encerrado, Emily questionou:

— Mas qual o motivo para ele estar aqui? Quer dizer, sabemos da morte do pai dele, mas já faz no mínimo 5 anos, a mãe dele tem um novo marido há o que? 4 anos? Por que ele veio para cá?

— Querida — a voz da mulher estava encharcada de sentimento — o padrasto do Lucas de uns anos pra cá tem se tornado um pouco violento. Conhecíamos o gênio dele desde a última festa em família que eles participaram, na qual ele bebeu demais, entrou numa discussão sobre política e acabou quebrando a mesa plástica. Mas não imaginaríamos que ele se tornaria agressivo com ela também, ela nunca nos disse nada. Ela está tão afastada de nós.

Elas e Todas as Outras CoresOnde histórias criam vida. Descubra agora