06 • Me soltar - ANNE

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Existe algo que não consigo compreender na humanidade: as pessoas costumam temer muito à morte.

Eu realmente não compreendo. O mundo é terrível, existe tanta barbaridade acontecendo nesse minuto em incontáveis lugares que, se parar para analisar, parece ser absurdo. Mas é a realidade. É assim que as coisas são, é assim que nosso mundo é.

E eu não compreendo o porquê das pessoas temerem a uma oportunidade de não fazer mais parte disso. Não posso entender aqueles que fazem de absolutamente tudo para que não percam suas miseráveis vidas.

Contratam seguranças, instalam câmeras de vigilância, compram uma arma, andam com um canivete no bolso, treinam algum tipo de luta... Tudo isso para que? Por que batalhar para continuar a viver num mundo tão cruel como o nosso? Por que gastar dinheiro com pessoas que dariam a própria vida por nós, quando essas que estão sendo pagas na verdade estão fazendo um favor para si mesmas, e só não sabem ainda?

Não dá. Não entra na minha cabeça.

Eu não aceito que exista gente por aí que lute com unhas e dentes para se manter vivo. Não. Na nossa realidade atual? Com tudo isso acontecendo?

E mais! Depois de todos os diversos relatos e estudos que temos, teorias de vida pós-morte, reencarnação, a possível existência de um céu e um inferno, um julgamento final, uma chance dada divinamente... Como pode alguém não pensar nisso? Será que não passa pela cabeça delas que essa é uma oportunidade como nenhuma outra?

Pense na inovação! Na evolução! Imagine se alguém morrer, e seja lá para onde ele for, seja esperto o suficiente para conseguir voltar e finalmente saciar a sede de respostas que temos aqui!

Como, eu me pergunto, como. Como podem temer a algo tão significativo, que pode mudar tanta coisa? Como fazem de tudo para evitar um evento que poderia ser a peça final? Como podem ter medo do desconhecido que pode ser tão bom quanto o conhecido? Como poderiam se negar a experiência mais importante de suas miseráveis vidas?

Eu já tentei passar por isso, tentei ver o que tinha para mim, se tinha algo, se era um mundo diferente ou uma escuridão completa, mas eu não consegui. Sempre algo me atrapalhava, sempre a voz de um dos meus amigos ecoava no meu apartamento, a voz do meu chefe chicoteava o ar no meu trabalho, ou mesmo meus tios faziam barulho quando eu ainda morava com eles.

Enquanto eu tentei incontáveis vezes acabar com a minha vida para finalmente descobrir tudo, existem pessoas que acham que suas vidas são importantes o suficiente para serem zeladas com tanto ardor.

- No que está pensando, gracinha? Não está com a cara boa, não. - Sou arrancada de meus devaneios pela voz cínica do homem que me trouxe até aqui.

Mal percebi que ele havia voltado. Saiu há um tempo depois que conseguiu me irritar com aquela desculpa ridícula que deu aos meus amigos. Como pode um ser um humano tão burro? E se meus amigos investigarem e por algum acaso descobrirem que ele me sequestrou? E se mandarem a polícia? E se me acharem?! Tudo vai por água abaixo.

- É muito feio não responder quando te perguntam algo, sabia disso? - Ele se aproxima e como de costume, senta em sua cadeira a um passo de distância da minha.

Eu não respondo. Não quero conversar, não quero falar a toa, não quero nem me mover, mesmo que minimamente. Estou com fome mas não quero mexer a boca para comer caso ele me dê algo. Prefiro ficar num silêncio absoluto.

- Ah, ficou chateada com o que eu disse para os seus amigos? E o que pretende fazer agora, uma greve de silêncio? - Ele dá risada, enquanto eu continuo o fitando, cética - Pois bem, ao menos um pouco de paz desde que eu tive o desprazer de te trazer até aqui.

Dirty Love • AU shirbert • EM ANDAMENTOOnde histórias criam vida. Descubra agora