No princípio de todos os mitos, houve um tempo em que nada existia no Universo além do Caos - a mais antiga, a mais inexplicável, a mais absurda das divindades. Nenhum poeta e nenhum filósofo grego imaginava o que teria existido antes dele: era o primeiro dos deuses, a sombra de loucura e confusão que está nas profundezas de tudo o que existe.
O Caos ocupava todo o espaço do Universo. Nele, estavam misturadas as sementes de todas as coisas futuras: mas não havia ordem alguma, apenas um turbilhão sem sentido e sem fim. No poema As Metamorfoses, escrito no século 1 a.C., o poeta romano Ovídio descreve assim a terrível divindade que deu origem a tudo: "Antes que a terra, o mar e o céu tomassem forma, a natureza tinha apenas uma única face, chamada Caos: uma massa crua e desestruturada, um conglomerado de matéria composta por elementos incompatíveis... Nenhum elemento estava em sua forma correta, e tudo estava em conflito dentro de um mesmo corpo: o frio com o quente, o seco com o molhado, o pesado com o leve".
O Sol não iluminava o dia, e a Lua não brilhava à noite. Não havia chão para firmar os pés, nem mar para se nadar - todos os elementos estavam misturados num caldo primitivo. E as coisas, embora sempre em convulsão, não saíam do lugar: pois não havia sequer direita e esquerda, em cima ou embaixo, Norte ou Sul, dentro ou fora. O Caos era tudo e, ao mesmo tempo, nada.
Mas de repente, e sem qualquer explicação, brotou do Caos o primeiro sinal de um futuro menos caótico: uma deusa. Era a Terra, que os gregos chamavam de Gaia, "a de seios fartos". Às vezes, Gaia era descrita como uma deusa com forma humana. Às vezes, ela se confundia ao próprio planeta - como outros povos antigos, os gregos acreditavam que a Terra flutuava suspensa no centro do Universo.
Seja como for, Gaia tinha uma forma fixa, estável, ao contrário do Caos. Sobre o imenso corpo fértil de Gaia, os elementos antes em confusão começaram a se organizar, ocupando cada um seu lugar correto. Fogo, terra, água e ar destilaram-se uns dos outros. Os elementos libertavam-se do confuso abraço mútuo. E as curvas generosas de Gaia iam dando origem a colinas suaves, vales profundos, montes e montanhas.
Tudo isso ocorreu de forma misteriosa, sem a intervenção direta de um ser bondoso e ordeiro. Os mitos gregos não explicam como a Terra surgiu das trevas e da confusão. "Ao contrário da tradição hebraica e cristã, não existia um Criador na mitologia grega", explica o historiador Anderson Zalewsky Vargas, especialista em Antiguidade clássica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). "O Caos é uma divindade negativa - mas, dele, nascem todas as coisas positivas. Essa é a ambiguidade do pensamento grego antigo: não existe maniqueísmo na concepção do mundo. Coisas boas podem vir de coisas ruins. E vice-versa".
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Witches Course
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