Cap.4 - A medalha

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[2ª edição]

Benício Speltri

Olívia! Por favor, não jogue no lago! – implorava Benício, completamente atordoado com os olhos arregalados e marejados enquanto caia de joelhos. – Por favor! Não!

Olívia, em uma expressão desafiadora, lançava a medalhinha feita em ouro branco de Benício, e presenteada por tia Elizabeth quando fez sete anos, dentro do lago próximo à mansão da Detzel. No mundo onírico, o lago se transformava em um cenário distópico de águas turvas cor de sangue em um alaranjado céu de fim de tarde.

Apesar de ter consciência de que daquelas águas poderia não retornar, ele não hesitou e foi em busca de seu pequeno tesouro. Calculou mentalmente que poderia ainda estar na parte rasa.

Eu não vou perder meu amuleto!

Quando finalmente viu o brilho da medalha, antes de alcançá-la, sentiu algo o puxando para o fundo, impedindo que alcançasse o amuleto e pudesse emergir para a luz.

A sensação de afogamento, a agonia de sentir-se abraçado por algo viscoso, o pavor de perceber as luzes sumindo conforme afundava. O sangue.

Um nítido som de prantos invadia sua mente e por mais que se debatesse contra as forças que o puxava para o fundo, sabia que não adiantava lutar.

Eu não vou me entregar... Eu vou pegar essa porra de medalha e sair daqui.

Luz.

Tudo estava perturbadoramente branco.

Acorda cara, acorda! Isso é só mais um maldito pesadelo! E em um forte estampido capaz de quebrar qualquer vidro, Benício voltava ao seu quarto na casa do pai.

Abriu os olhos assustado, levantando-se cambaleante. Transpirava e sentia um aroma do qual não gostava pairando no ar. O filho da puta do Henri fumou dentro dessa casa, vou quebrar a cara dele! Olhou para a janela e viu a mesma luz perturbadora de segundos atrás, porém o interior do quarto jazia em verdadeira treva. Sem conseguir enxergar muito, vislumbrou uma silhueta masculina sentada a uma poltrona que ficava alojada em um dos cantos do quarto. Estava de volta ao onirismo.

— Quem é você? – perguntou Benício ao estranho, sabendo bem que aquela não era a silhueta do irmão.

— Pergunta errada, meu caro e ilustre Benício Speltri. – disse o outro, saindo de um emaranhado de sombras, a fumaça do charuto que trazia consigo exalava forte. – eu sou o que sou e quem eu sou, agora – enfatizava cada palavra – você tem ideia de quem você é?

Estavam um de frente ao outro se medindo. A semelhança física era assombrosa, entretanto paravam por aí. Benício mal o conhecia, mas já odiava o jeito sarcástico, a entonação da voz e a forma de olhar de seu semelhante.

— Não somos iguais! – respondeu imprimindo desdém a sua voz.

— É óbvio que não somos iguais! – respondeu o estranho sorrindo – eu sou o seu... – Segurou firme o ombro de Benício com uma das mãos e cravando logo em seguida a outra em seu peito, acertando-lhe o coração. – pior pesadelo.

A dor era descomunal. Benício sabia que aquilo era um pesadelo continuado, mas a dor era bastante real.

— Eu... – sua voz se atrapalhava em meio o sangue que lhes subia pela garganta – vou... sobreviver a isso!

— Tenho certeza que vai. – com um leve sorriso de canto e um olhar dissimulado, o estranho arrancou-lhe o coração, empurrando despreocupadamente seu corpo na cama. – Já vivemos coisas muito piores.

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