Prólogo

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Matt Hunter

A pizza estava tão fria, que já tinha aspecto de papelão. Por um instante, tive a impressão de estar cortando a própria caixa, mas decido comer assim mesmo, afinal não tinha outra opção.

A pizza enchia o buraco no meu estômago, mas não o espaço vazio em meu coração. Sinto vontade de socar a mesa da cozinha. A morte já havia roubado a vida do meu pai e não falta muito para levar a minha também.

O barulho da porta de um carro se fechando me faz sentar mais ereto sob a cadeira. Escuto o abre e fecha da porta da frente se juntando aos sons da casa na madrugada. Os passos do meu irmão ressoam no assoalho de madeira quando ele, certamente, é atraído pela luz da cozinha. Olho para Tyler parado na porta. Ele, é meu irmão gêmeo, só que mais musculoso e falante.

— Olá. — As chaves de Tyler batem na mesa. Ele vê a pizza, vai até o pote de doces e pega um saquinho de M&M's, depois desaba numa cadeira. Dá uma mordida numa fatia de pizza e joga três M&M's na boca. Tyler acha que chocolate e pizza combinam muito bem.

Sinto um odor desagradável misturado a cheiro de cerveja vindo dele. Se nossa mãe estivesse acordada e consciente, daria uma bela bronca em Tyler por beber e dirigir. Desde que nosso pai morreu, nossa mãe vai dormir às oito da noite, depois de toma calmantes, apenas para levantar na manhã seguinte e continuar carregando seu fardo.

— Você deveria ter dirigido? — pergunto irritado assumindo o papel da minha mãe.

— Só tomei duas cervejas. — minha expressão de desaprovação era mais a de um pai do que a de um irmão, mas logo meu olhar severo não dura muito, pois às vezes quando não está embriagado Tyler também assumia o papel de mãe e pai.

— Onde você estava? — pergunto angustiado sentindo a fatia fria de pizza começar a pesar no meu estômago.

Tyler se equilibra nas duas pernas de trás da cadeira.

— Em nenhum lugar, na verdade.

Sua resposta evasiva, só me faz duvidar que está mentindo. Levanto uma das sobrancelhas e Tyler encolhe os ombros, talvez admitindo que sua resposta não foi nenhum pouco convincente para mim.

— Está saindo com a Leah de novo?

— Dá para parar de pegar no meu pé?! — Tyler deixa a cadeira cair sobre as quatro pernas fazendo um estrondo.

— Você sabe que a Leah não é a pessoa ideal para você — digo com um tom mais exaltado, me recordando de todas as vezes que encontrava meu irmão triste por causa dessa garota.

— Primeiro o que eu tenho com Leah não é o que você está pensando. Segundo, eu preciso de alguém para me apoiar tá legal?! Perdemos o papai, a mãe só vive a base de calmantes e você... — ele faz uma pausa encolhendo os ombros e refletindo sobre o que ia dizer.

— Eu sei... Estou morrendo, era o que você iria dizer — me encolho só de imaginar que a qualquer momento isso poderia acontecer, e pensar em deixar meu irmão e minha mãe sem amparo me deixava ainda pior. — Nada contra a Leah, mas ela já terminou com você duas vezes, e nas duas vezes você entrou em depressão.

— Já disse, não estou namorando Leah. Não se trata disso.

— Então o que é? — escuto o tom da mamãe em minha própria voz.

— Ela está com alguns problemas. — Tyler suspira, parecendo sentir algo do passado, uma dor. E sinto o mesmo.

Por sermos irmãos gêmeos, as dores e tudo que Tyler sentia isso refletia em mim também e vice - versa. Gêmeos idênticos conhecem os segredos um do outro. É uma conexão meio estranha.

Nossa mãe costumava contar que quando Tyler tinha 5 anos de idade, acabou caindo de bicicleta e ralou o joelho, e que eu fui procurá-la chorando, antes mesmo que eu soubesse do acidente para dizer que meu joelho também estava doendo também.

Eu não conseguia me recordar disso para dizer se realmente era verdade, mas o que Tyler estava sentindo agora eu podia sentir também.

— Que tipo de problema?

— Quer parar?! — ele grita me assustando, mas logo depois fecha os olhos arrependido. — Ela não quer me contar. Não quer contar a ninguém — diz cerrando os dentes. — Todo mundo está dizendo que ela está agindo de um jeito estranho, então fui conversar com ela e tive certeza que tem alguma coisa acontecendo.

— Ela não pode pedir ajuda a uma das amigas?

— Não vou voltar com a Leah. — a postura de Tyler se enrijece.

Sim, meu irmão, você vai! Eu podia ver a aproximação novamente de Tyler e Leah, mesmo que ele não conseguisse enxergar isso ou simplesmente não queria admitir.

O barulho da descarga no banheiro vindo do quarto da nossa mãe, me faz levantar os olhos, e a tensão muda de direção. Não que diminua, só toma outra direção.

A morte do nosso pai ainda doía muito, mas aos poucos estávamos perdendo nossa mãe também. Em vez de sair do buraco em que caiu quando nosso pai faleceu, ela está afundando cada vez mais. Vive e respira dor. E odeio isso.

— Você ligou para a Tia Adele? — respiro fundo.

— Sim — Tyler balança a cabeça — Ela vai ligar para a mamãe, mas não pode vir. Está trabalhando em um caso importante. — ele faz uma pausa — Ela já veio duas vezes no mês passado. Não podemos esperar que faça mais do que isso.

Olho para as minhas mãos ao redor do refrigerante gelado.

— Então, nós precisamos fazer alguma coisa.

Tyler acena com a cabeça.

— Talvez a gente possa tirar a mamãe de casa amanhã. — sugiro — Levá - lá ao cinema e para jantar fora.

— A gente poderia levá-la até a loja de jardinagem. Ela adorava cuidar do jardim.

— Verdade — fecho a caixa de pizza. — Quer mais um pedaço?

— Não. Estou cheio de M&M's. Além disso fui até o Zorro's hoje e comi uma comida dos deuses.

— Por isso esse cheiro. — o amor de Tyler por comida mexicana e chocolate com pizza, certamente era a única diferença que existia entre nós. Bem, isso e as garotas.

Quebrando as regras do amorOnde histórias criam vida. Descubra agora