Décima Situação

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Quando a tarde estava perto de seu fim e o sol se aproximava do horizonte com seu brilho alaranjado, era nessa hora que Eric e Lala se viam. 

Era um consenso entre os dois. Prometeram um ao outro que não importava o que acontecesse, eles sempre teriam aquele momento do dia dedicado estritamente a eles. Escolheram o melhor lugar da cidade para se ver o brilho fantástico do pôr do sol, ficava situado em uma parte afastada da cidade, repleta de árvores, grama, e borboletas. A vista do Oeste era limpa, sem prédios ou casas bloqueando a visão. Chamavam o lugar de "solarinho". 

Lala morava perto de lá, era uma garota do campo. Só precisava caminhar por uma estradinha de terra para chegar no solarinho, onde mal mal passavam carros. Ela gostava de desenhar as paisagens que a rodeavam, ler seus romances, e estudar física e química. Era uma cientista com alma de artista. Sempre dizia que seria astronauta, com sua camisa da NASA manchada e velhinha, e falava que suas próximas pinturas e desenhos seriam da paisagem lunar. 

Eric morava na cidade. No último andar de um alto prédio, e tinha apreço pelo céu. Gostava de subir no telhado, se deitar e observar o azul cercado de nuvens brancas, bem como a imensidão escura cercada de pontos brilhantes. Ele não gostava de estudar tanto quanto Lala, mas gostava de ouvir pessoas que estudavam. Ouvia seus podcasts sobre história enquanto observava o céu, e imaginava as grandes batalhas, e os grandes acontecimentos. Ele gostava de visitar Lala, a casa de campo tinha uma visão privilegiada de um céu despoluído. 

Eric e Lala se encontraram pela primeira vez no solarinho quando ele estava perseguindo o céu limpo do campo, e ela estava perseguindo a paisagem linda das árvores. Se encontraram precisamente ao pôr do sol. 

Você poderia achar que, encontrando um estranho na floresta, ambos iriam se estranhar e seguir caminhos opostos. 

Mas Eric encontrou nos olhos de Lala um brilho inigualável, e uma beleza que céu nenhum iria lhe proporcionar. 

E Lala encontrou no sorriso de Eric uma paisagem límpida, que merecia ser eternizada nas mais belas pinturas. Ela viu nele o esboço da mais linda arte. 

Eles disseram "oi", e o pôr do sol cuidou do resto. 

Observaram juntos conforme o dia virava noite, e conversaram sobre a beleza daquele momento. Eric contou o quanto era difícil ver aquele momento se reproduzir na cidade, e ela contou o quanto era difícil ver tantas árvores no campo. Encontraram ali a convergência de perfeições. Encontraram um ao outro. 

E se encontraram no dia seguinte. 

E no outro, e no outro e no dia depois desse. 

Lala se formou, graduada em Física aplicada pela universidade local. 

Eric arrumou um emprego no escritório do pai, e logo ganhou uma promoção. 

Fizeram aniversários, e em cada um deles, um levava um bolinho para o outro. 

Em um destes dias, encontraram uma cachorra vira-lata repousando ao lado do cantinho em que gostavam de sentar, e eles o nomearam de Solua, a união dos dois momentos que presenciavam todos os dias. 

Solua passou a frequentar cada vez mais o cantinho depois que Eric e Lala passaram a alimentá-la. E ela acabou se tornando parte deles. 

Um dia, quando o sol já estava fazendo seu caminho em direção ao horizonte, Lala foi até o solarinho com um presente. Era uma caixinha pequena, e em seu interior havia dois objetos feitos de prata, anéis de compromisso. Em um (dedicado a ele) estava gravado a figura do sol, no outro (dedicado a ela), estava gravada a figura da lua. 

Lala caminhou pela grama alta, e logo encontrou-se com Solua, que lambeu seus calcanhares e a acompanhou pelo caminho. 

Ela chegou lá, viu o lugarzinho ser inundado pela luz alaranjada que emergia de detrás das árvores espaçadas, e sentou-se na relva, esperando por Eric. Solua deitou ao seu lado, e ressonando, a fez companhia. 

O sol ia se pondo conforme o tempo passava, mas Eric não apareceu. A noite chegou, Lala ainda esperou mais um pouco, mas ele não apareceu. 

Lala fez carinho em Solua, guardou sua caixinha, e voltou para casa. 

Mandou mensagem ao deitar na cama, mas Eric não respondeu. E ela dormiu ao lado do celular. 

No dia seguinte, Lala foi novamente ao solarinho na esperança de ver Eric, e lhe dar o presente que tanto ansiava em mostrá-lo. Mas pela segunda vez, Eric não apareceu. Neste dia, Solua decidiu acompanhá-la até em casa, e com o consentimento dos pais de Lala, pôde dormir na casa. 

No dia seguinte a este, Lala foi mais uma vez ao solarinho, para mais uma vez encontrá-lo vazio. Sentou-se com Solua e se pôs a desenhar, até que a luz do sol acabasse. 

No dia seguinte, ela ainda tinha esperança de vê-lo. 

No dia após este, a esperança diminuiu um pouco. 

No sexto dia, Lala levou a caixinha pela última vez, e a pôs no chão bem aberta, em meio a grama alta. Ela se permitiu chorar, e o céu pareceu se sensibilizar pelo momento, e a chuva caiu juntamente com as lágrimas de Lala. O sol não brilhou neste dia. 

Lala foi para casa, com Solua ao seu lado, e frenquentemente olhava para a cidade, imaginando que Eric estaria por lá. Teria conhecido alguém? Teria encontrado algum lugar mais especial?

Ela seguia pela chuva, com lágrimas cobrindo o rosto, e mal percebeu quando seus pés caminharam tortuosamente pelo meio da estradinha de terra enlameada. 

A estradinha onde mal mal passavam carros. 

Lala pensou em ir a cidade visitar Eric, em dar a meia volta e ir vê-lo! 

Ouviu uma buzina alta, e viu o clarão dos faróis. 

Todas as paisagens do mundo se apagaram. 


Inconstante PensamentoOnde histórias criam vida. Descubra agora