- Pela última vez, Senhor Hoover: Não será possível fazer a troca de quarto. Todos já estão cheios. - Um homem grande sentado em uma cadeira de escritório preta vociferou. Era o diretor desta coisa que chamam de colégio.
- Mas eu- - Tentei mais uma vez. Ele levantou a mão, um gesto indicando para que eu parasse de falar.
- Eu sei quem você é, e não, Senhor Hoover. Não aceitarei seu dinheiro em troca. - Bufei, revirando os olhos. Isso nunca havia falhado antes.
- Ok, tanto faz. - Coloquei minha mochila nas costas e saí da diretoria.
Era o intervalo. Eu não tinha muita coisa para fazer, pois ainda não havia simpatizado com ninguém da escola. Nos primeiros minutos após tocar o sinal, antes da minha visitinha ao diretor, Milly, a garota sardenta namoradinha da quatro-olhos me entregou uma cópia da chave do dormitório. Por pouco eu não peguei, tinha mesmo esperanças de trocar de quarto.
Agora eu estava andando sem rumo pelo corredor, quando avistei aqueles mesmos garotos que implicaram com a menina quatro-olhos e o bando dela.
- Oi. - Me aproximei dos dois. Eles me olharam com estranheza. - Sou Nicholas Hoover.
- Ei, você não é o garoto novo que está no mesmo dormitório daqueles 4?? - Perguntou o de cabelo cor de bronze.
- Halk, Miran, Rebecca e Milly? Sim, infelizmente. - Falei com um tom como se fosse insuportável dormir no mesmo teto que eles. Sinceramente? Não era tão terrível assim. Eu só preferia manter distância.
Os dois se entreolharam por um tempo, e logo depois o cara com cabelos negros estendeu a mão para mim.
- Eu sou Mark e ele é Sam. prazer em te conhecer. - Ele falou.
- Hm. Ótimo. - Ignorei a mão estendida para mim e segui pelo corredor. Logo logo acabaria o tempo de Intervalo. Gastei a maioria do meu tempo tentando convencer o velhote a fazer a troca de dormitórios.
Pelo canto do olho avistei uma... Menina? Encostada nos armários olhando em minha direção. Assim que comecei a andar ela foi se aproximando de mim.
- Sam e Mark? Uma péssima escolha para primeiras amizades, se quer minha opinião. - Falou quando chegou ao meu lado. Ela tinha o cabelo na altura do queixo. Era ondulado-liso e picotado. A metade estava presa em cima, em um pequeno rabo de cavalo largo, deixando à mostra a parte colorida de azul. Usava uma camisa preta larga com a estampa de alguma banda também, além de calças jeans e All Star preto.
- Eu te conheço, garota? - Perguntei rispidamente. Ela suspirou como se eu tivesse tocado em um assunto delicado.
- Por favor, não me chame pelo pronome feminino, e não, você não me conhece.- Respondeu.
- Oh. - Senti minhas bochechas queimarem e parei de andar. Me senti envergonhado por ter errado seus pronomes, uma onda de culpa apertou meu peito e eu desviei o olhar. - Me desculpe. Como devo lhe chamar?
- Pronome neutro está perfeito para mim. Não se preocupe tanto, estou acostumade. Mas não erre mais, por favor! - Elu deu uma piscadela para mim e continuamos a andar.
- Ok. Me perdoe. - Falei mais uma vez.
- Você já disse isso. Eu me chamo Zoe Blonc. Se eu não me engano, você é Nicholas Hoover, né?
- Sim.
- Ótimo, vou te chamar de Nick! - Lembrei de minha mãe. Ela costumava me chamar assim antes de falecer. Respirei fundo tentando não perder a calma.
- Não me lembro de lhe dar tanta liberdade assim. Por que puxou assunto logo comigo, em primeiro lugar? - Controlei meu tom de voz para não parecer muito grosso.
- Vi você tentando amizade com os babacas do Sam e Mark e resolvi fazer caridade. - Zoe sorriu sarcasticamente. - Podemos ser amigos se quiser.
- ..Tanto faz. - Fiquei meio sem jeito. Ninguém nunca havia falado aquilo antes.
Por sorte o sinal bateu bem na hora. Apertei o passo indo para a próxima aula.
- Até logo, Nick! - Ê garote se despediu. Levantei a mão como resposta.
Após acabarem as aulas do dia, eu e Zoe trocamos números de celulares e aproveitamos para irmos à farmácia juntos. Elu precisava comprar band-aids novos e eu cigarros. Quando finalmente cheguei em meu dormitório, já estavam todos lá na sala.
- Boa noite, loirinho. - Halk falou olhando para mim. Senti um formigamento no estômago repentino. Será que estava com fome?
- ...Noite. - Respondi, percebendo que hesitei um pouco. Me xinguei mentalmente e fui apressado para meu quarto. Assim que fechei a porta, acendi um cigarro, procurando relaxar.
