Flashback.
Gabriel: quinta dia doze de maio de dois mil e vinte dois por volta de cinco da tarde; trinta semanas de gestação, metade do sétimo mêsTia Nice me entregou mais uma remessa de roupinhas de bebê recém lavadas e passadas ferro e eu fui para o quarto da minha princesa onde Yasmin está guardando todas. Parei na porta olhando pra ela de cabelos presos, um short de moletom e um cropped que deixava a barriga redondinha e grandona totalmente de fora. Barriga essa que ela fazia carinho e dançava de leve ao cantar:
"Eu juro
Eu não te amo pouco, eu amo muito
Se quiser ouvir mais alto
Eu vou gritar bem lá no fundo
Eu juro
Eu não te amo pouco, eu amo muito
Se quiser ouvir baixinho
Vou falar no ouvidinho
Que eu te amo demais
Que eu te amo, demais... Eu te amo demais, pequena garotinha. Você sabia disso?" - Ela perguntava afinando a voz enquanto tocava a barriga."Eu amo essa." - Eu falei entrando no quarto, Yasmin não se assustou. São comuns os nossos momentos cantando e dançando com a barriga.
Os toques de Pai de menina começaram e eu larguei as roupinhas em cima da cômoda pra colocar as minhas mãos na barriga dela e apoiar a minha cabeça ali quando disse: - "O meu mundo azul foi ficando aos poucos cor de rosa..."
De volta ao presente
Yasmin: dia dezesseis de julho de dois mil e vinte dois horas mais tarde; por volta de nove da manhã"Eu não aguento mais." - Reclamei quase chorando quando uma contração mais forte veio.
"Você consegue, a gente tá perto. Calma." - Ouvi Gabriel dizer atrás de mim, passando as mãos nos meus cabelos já suados.
"Já vamos em oito horas de trabalho de parto e sete centímetros de dilatação, mais um pouquinho e ela estará nos seus braços." - Minha médica disse colocando as mãos nos meus joelhos como se me desse apoio. - "Suas contrações já estão com um intervalo pequeno, em menos de um minuto você vai ter mais uma e quando ela vier, empurre!"
"Eu não quero, eu não quero, não quero..." - Me desesperei e esfreguei o meu rosto com vontade de pedir uma cesariana. A contração veio, forte de um jeito que eu quase desmaiei, e quando ela acabou eu virei pra Gabriel: - "Por favor eu só quero uma cesária, por favor."
Ele colou nossas testas e respondeu: - "Você passou a gravidez inteira falando que queria normal, se preparou pra isso, você consegue. Vamos. Se você realmente quiser uma cesariana, eu vou atrás de uma agora, mas eu e você sabemos que quem tá falando é a dor e não a Yasmin. Vamos, você consegue." - Neguei com e abaixei a cabeça pra encostá-la no ombro dele.
"A bolsa estourou! Entre oito e nove de dilatação, Yasmin." - Ouvi Doutora Luana dizer e a contração vir de novo. A partir desse momento tudo começou a acontecer mais devagar, toda a equipe decidiu nos dar um momenti à sós na sala de parto, mas uma coisa não mudou: Gabriel atrás do meu corpo segurando as minhas mãos e aguentando cada urro de dor. Falando palavras de apoio e ficando em silêncio quando após dez horas de trabalho de parto eu não conseguia ouvir mais nada.
"Esse não é só um momento de dor. É a dor que tá trazendo o alguém que a gente tanto procura pro mundo." - Ele disse com a boca no meu ouvido e fungou. Dei um sorriso ao responder:
"Esse alguém já está te fazendo chorar."
"Tinha três anos que eu não chorava." - Ele disse fazendo um carinho no meu braço e eu fechei os olhos sentindo uma contração vir.
"Que mentira." - Respondi. - "Eu posso enumerar todos os seus choros dos últimos meses."
Gabriel não respondeu mais. Focou no carinho que fazia em mim e em aguentar meus apertos fortes na mão dele nos momentos que as dores vinham intensas. Na playlist de parto que eu nem sequer tinha parado pra prestar atenção até agora, começou a tocar:
"Procuro Alguém que me faça chorar de novo
Que me faça lembrar como eu sou imperfeito
Um relógio que faça meu tempo parar
Alguém que não repita nada do que eu tenha feito"Fechei os olhos cantando abraçada com Gabriel dentro da banheira de água morna. De certa forma, me sentindo tranquila como eu não estava desde que entrei em trabalho de parto.
"Procuro Alguém que me faça ser bom de novo
E que me lembre como eu amo comer pão com ovo
Que restaurante gourmet é até bom Mas arroz, feijão e carinho é o prato do povo
Me faça não ter vergonha de errar
Me faça entender que o mundo ainda é mais que o meu ego
Que as meninas que me importam tão dentro do meu lar
Então me ensina a passar a visão preu não criar um menor cego
Hipocrisia a parte, meu lado realista
Vou poder a primeira vez ser menos machista
Na prática a vontade é te prender e tudo
Mas pássaro é pro vento
Igual a você pro mundo"Quando a nossa música acabou, outra que tem nos embalado nos momentos com a barriga é: Pai de Menina, do Ferrugem.
"O meu mundo azul foi ficando aos poucos cor de rosa..."
Mais emoção. Mais tranquilidade. Ali nos braços dele, mesmo com dor, cansada, sem dormir e sem comer, eu estava me sentindo... amada.
Foi a primeira vez na vida que eu descobri uma coisa que eu não sabia sobre o amor.
O amor é tranquilo. O amor é paciente. O amor não grita, o amor não te subestima. O amor te encoraja e segura a sua mão. O amor te abraça e te faz se sentir sob as nuvens.
O amor é paz.
"Tá vindo uma contração, eu vou empurrar." - Avisei e ele soltou a minha mão apenas para apertar o botão que chamava a médica e as enfermeiras de volta pra cá. Saímos da banheira de água morna e eu gritei e fiz força mais de três vezes quando ouvi a médica dizer:
"Eu tô vendo os cabelos dela, você tá com dilatação total. Agora é só empurrar." - Vieram as contrações mais fortes da minha vida, eu comecei a gritar e chorar ao mesmo tempo, empurrei com toda a minha força e senti a cabeça passando.
"Só falta o corpo, você consegue. Vamos, você consegue." - Ouvi Gabriel dizer e juntei o resto da minha força pra empurrar. A dor era absurda e indescritível, mas passou. O corpo dela saiu e eu esqueci completamente de qualquer dor, de qualquer coisa que não fosse a minha filha ali.
"Papai, vem cortar o cordão umbilical." - Uma das enfermeiras chamou erguendo minha filha no ar, me mostrando uma garotinha gordinha ligada a mim apenas pelo cordão.
"Eu tenho medo." - Gabriel disse baixo e se agarrou mais no meu corpo cansado, arrancando gargalhadas de toda a equipe.
"Eu acabei de botar três quilos e meio de uma pessoa pra fora, você consegue usar uma tesoura." - Respondi vendo ele me dar um selinho rápido e enxugar o próprio rosto depois de enxugar o meu vendo a equipe limpar uma princesa chorosa antes de nos entregar a nossa filha.
Ela, mais linda que eu pensei que ela seria, veio pro meu colo. O braço tatuado passou por debaixo dos meus e ele cortou o cordão seguindo as orientações de uma enfermeira.
"Oi, princesa." - Ele disse passando os dedos devagar pelos cabelinhos dela. Encostou o rosto no meu ombro e eu senti as lágrimas dele descerem ali, fazendo as minhas descerem com mais força. - "Paixão do papai."
Reconhecendo a voz, ela parou de gritar e o choro foi se transformando apenas num choramingo dengoso.
"Qual é o nome dessa garotinha?" - A nos perguntou e Gab secou o rosto antes de me olhar, quase... triste.
"Ela é a Sarah, né?" - Perguntei colando nossas testas. Ele arregalou os olhos surpreso mas depois sorriu.
"É. Ela é a Sarah. E ainda é mais bonita que nos meus sonhos."
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Procuro Alguém - Gabigol
FanficYasmin já passou por muitas coisas na vida e tenta a todo custo superar os traumas que carrega, sendo um deles a ausência da figura paterna. É aí que o anjo Gabriel entra e faz uma proposta que salva a vida de Yá. >>Todas as obras encontradas aqui n...