16 - Eda

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— Os médicos fizeram tantos exames em você... engraçado eles não terem diagnosticado a sua surdez — Serkan resmunga baixinho, mas eu escuto.

Está passando um documentário sobre a Segunda Guerra Mundial e os efeitos sonoros foram muito bem produzidos. Sem diminuir o volume da televisão, grito:

— O quê?

Ele bufa.

Eu abafo uma risada e me ajeito melhor nas cobertas. Agora há pouco, tomei banho e me preparei para dormir. Em seguida, voltei para a sala, onde Serkan está. Tinha toda a intenção de ficar longe dele, mas é muito estranho deitar em uma cama que não é minha e, apesar de o meu corpo inteiro estar doendo e de os remédios me deixarem com sono, não consegui fechar os olhos.

O quarto é incrível, espaçoso e com todos os recursos que eu preciso diante das minhas limitações. E, minha nossa, o colchão é confortável de uma forma em que nem fica justo comparar com o meu. No banheiro, existe uma banheira enorme, que não posso usar por enquanto, mas tenho esperança de usufruir no futuro.

Ainda assim, com todo esse conforto, não consegui desligar a cabeça.

Serkan disse que aquela era a menor suíte da casa, então, fico sem graça só de imaginar quais serão os maiores cômodos. Acho que isso me deixou intimidada demais para descansar, também.

Dessa forma, embora eu tenha toda a comodidade, vim para a sala.

Foi difícil me mover até aqui, mas tive ajuda da minha teimosia.

Quando Serkan me viu chegando, quase morreu de preocupação.

Ver isso valeu o esforço.

O sofá também é tão bom e macio quanto a cama, acrescento ao esfregar os olhos sonolentos.

O efeito de analgésicos em mim é muito poderoso. Quase não sinto nenhum desconforto pelos meus machucados quando estou parada. Só dói ao andar, a ferida repuxando a coxa em mil direções dolorosas.

Tomar banho sozinha não foi simples. Entretanto, quando a água quente caiu em meus músculos tensos, tudo melhorou. Deitar nesse sofá ajuda, agora. Não tenho do que reclamar. Quero dizer...

Levanto o olhar para Serkan, que está na parte da sala onde fica seu escritório. Ele está na mesa e tem um notebook em sua frente, claro que o patife teria mais de um desses, foi besteira me preocupar por ter jogado água no outro!

Serkan encontra o meu olhar, franze o cenho e posso imaginar as ondas reprovadoras que saem de sua cabeça dura.

Arqueio a sobrancelha, tentada a insultá-lo.

Com uma contração nos lábios, ele volta a encarar a tela do aparelho em sua frente.

Afofo o travesseiro que roubei do quarto, aproveitando sua distração para estudá-lo.

Ele parece... menos diabólico, por assim dizer. Mais calmo e gentil, apesar de ainda me provocar incessantemente. O homem está mesmo se sentindo culpado pelo meu acidente, penso contrariada. Não costumo acreditar muito nas pessoas e é estranho imaginar que ele realmente acha que deve cuidar de mim.

Entretanto, Serkan nunca mentiu sobre suas más intenções, o que me dá a impressão de que, nesse momento, elas não existem.

É desconcertante.

Pego o controle da televisão.

Estou contrariando outra de minhas regras. Ciente de que vou fazer isso mais uma vez, abaixo o volume do aparelho e...

Suspiro, profundamente.

O homem no escritório finge não reconhecer o barulho.

Repito o som duas vezes mais.

Sem Honra | EdserOnde histórias criam vida. Descubra agora