Capítulo 2 - A mudança de vida.

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Desperto com Madam Sophie me chamando, abro meus olhos e noto que a carruagem já estava parada.
— Chegamos querida. — Ela disse abrindo a porta da mesma e descendo com alguns pulinhos.— Não estamos em casa ainda, estamos na modista, vamos fazer alguns vestidos pra você e depois vamos pra casa.
— Ah, entendi. —Me levanto ainda sonolenta, Madrid era frio? Me encolho saltando da carruagem, Sophie me dá o braço para nós duas adentrarmos no estabelecimento, caminho com ela em direção a uma casa de pedras, a arquitetura bem trabalhada e cheia de iluminação indicava que lá era um local sofisticado, várias moças com vestidos caros me observava entrar com seus olhos cheios de nojo, algumas riam da situação, me senti humilhada.— Você não pode ir escolher os vestidos enquanto eu fico na carruagem? Eu não tenho nem roupa pra entrar aí, elas estão debochando de mim. —Questionei Sophie com total insegurança, eu estava com medo, e era notório.
— Elas não tem que se achar melhor do que ninguém, uma peça delas não dá o vestido que vou comprar pra você, a partir de hoje você não deve se sentir inferior a ninguém, pois dinheiro você tem. — Ela dizia séria e continuava entrando com classe, os olhos quentes de Sophie cerrava as garotas que agora se encolhiam em alguns sofás.— Violet, cheguei! — Ela se sentia em casa, ou talvez esse fosse seu modo de ser, ela tirou seu mini casaco deixando pendurado em uma arara qualquer e seguiu com seus braços em mim, de longe uma mulher, já de idade e com os olhos vivos apareceu, essa era Violet, a modista, seus cabelos não sabia ao certo se eram brancos ou pretos, suas mãos já estavam enrugadas mostrando o peso da idade, mas seu corpo era firme como de uma jovem, seu vestido era de um amarelo claro que no fim ficava mais forte, um degradê incrível.
— Sophie meu amor! Vejo que tem companhia. — Violet se aproximava para abraçar Sophie enquanto me fitava. — Qual seu nome meu doce?
— Me chamo Frieda. —As palavras saíram mais rápido do que eu esperava, ela sorriu  de forma cordial.
—Seja bem vinda ao meu ateliê Frieda, se você está aqui tenho certeza que é para comprar algumas peças não é mesmo?
— Sim... — Falei olhando os tecidos, eu não fazia a menor ideia de qual eu poderia escolher, muito menos quantos vestidos eu poderia ter, mas todos os tecidos eram lindos, eu queria um de cada se fosse possível.
— Já tem ideia de cor, modelo, quantos vai querer?
— Eu acho que dois já é o suficiente, e enquanto a cor eu não sei qual posso ...
— Ela vai querer uma peça de cada cor, e eu quero que faça os modelos atuais, alguns com caimentos leves no busto para valorizar o corpo dela, afinal ela já é uma mulher e deve se vestir como uma.— Sophie me interrompeu no mesmo instante. —Qual sua cor preferida?
— É vermelho, mas, eu nunca usei nada vermelho, primeiro não tinha condições, e também, meu pai jamais deixaria eu vestir algo vermelho se tivesse condições. — Ri fraco lembrando do meu pai dizendo que quem vestia vermelho eram mulheres da vida, e que ele jamais permitiria uma filha dele se vestir de tal modo.
— O que ela vai levar agora será vermelho, como sei que não tem como você fazer eles todos agora, vou olhar alguma das peças desses vestidos vermelhos que você já tem, Frieda  você pode acompanhar Cíntia.— Sophie apontava para uma moça alta que estava ali, seus cabelos eram curtos como o de um rapaz, e até seus trajes parecia ser um homem. —Ela vai te levar para tomar um banho enquanto decido qual será o vestido que você vai usar.


Cíntia caminhava comigo por dentro do estabelecimento que olhando de fora parece pequeno, mas por dentro é enorme, ela estava calada apenas indo na frente e me mostrando a localização das coisas, não conseguia mais ficar em silêncio.
— Eu gostei do seu cabelo Cíntia. — Ela olhou para trás assustada e logo deixou um sorriso escapar.
— Obrigada, algumas garotas evita falar comigo, pensa que eu quero ser homem ou sei lá, vou tentar agarra elas. — Seu semblante era triste, ela parecia sofrer muito por causa da sua aparência.
— Bobeira delas, eu amei seu cabelo e adorei suas roupas, não concordo que a gente tem que usar só vestido, meu sonho é uma calça sabia? — Ela riu. — Eu estou falando sério.   Aliás me chamo Frieda, e eu acabei de chegar na cidade, como nunca tive amigas eu estou tentando fazer amizade com você, me diga se estiver funcionando.
— Você tem certeza que seria minha amiga? A cidade vai falar de você. — Cíntia falava rindo, e eu achei graça da sua risada, era viva.
— Com toda a certeza que eu quero que falem, afinal mudei agora, preciso ser motivo de assunto pra quem sabe ficar famosa? — Cíntia ria mais e mais de tudo o que eu falava, fiquei feliz por ela, chegamos em um quarto enorme, suas paredes decoradas com tecido vermelho, um espelho enorme estava de frente para uma banheira, Cíntia fechava a porta e se sentava na cama.
— Bom, é aqui que você vai tomar banho, olha, geralmente sou eu quem dou banho na Mandam Violet, mas no seu caso...
Cíntia se calou pois no mesmo instante deixei meu vestido cair sob mim, seus olhos se arregalaram e ela ficou corada, ri da situação caminhando até a banheira.
— A água está quente?
— É... Sim ... Na verdade, eu não sei, bom, se quiser olhar se está quente... Na verdade eu posso olhar pra você...— Ela se atrapalhava nas palavras de uma forma engraçada, nunca ninguém ficou tão intimidado com a minha presença, Cíntia abaixou o olhar se aproximando da banheira e verificando se a água estava quente. — Está morna, serve pra você?
Sem dizer nada entrei na mesma, a água estava gostosa, eu era acostumada com  a água gelada, nem sempre conseguíamos esquentar água, Cíntia se afastou e ficou sentada na cama olhando a vela, fiquei a observando, ela era uma moça muito bonita, mas parecia sempre triste, molhei meus cabelos mergulhando o mesmo dentro da água, meu corpo vibrava pela sensação de que enfim ficaria limpa.
— Cíntia, você da banho na Violet por quê?
— Esse é meu trabalho....
— Então vem me ajudar. — Interrompi Cíntia no mesmo instante, notei seu rosto queimar, ela estava envergonhada, levantou em pequenos passos e se sentou na cadeira próximo a banheira. — Quantos anos você tem?
— Eu tenho dezessete e você? — Seus olhos estavam distantes, ela falava passando um pano em minhas costas, de uma forma leve que me fazia arrepiar com o toque.
— Eu vou fazer quatorze esse mês, acredita? — Ela sorriu e concordou enquanto continuava passando o seu pano por mim. — Você pode sempre ir na minha casa me ver, eu não sei onde fica, mas eu vou descobrir, a gente pode sair também para ver a cidade, eu não sei, eu quero conhecer tudo.
— Você tem certeza? Eu estou impressionada, as meninas sempre fogem de mim, você é tão pura que não se importa com nada, não tem vergonha de sair comigo? — Seu semblante agora era mais triste ainda.
— Vergonha? Por quê eu teria que ter vergonha? Eu não estou fazendo nada de errado em sair com você, você está? Vamos estar matando alguém?
Cíntia ria.
— Não, eu não sei bem o porque sou tratada dessa forma, mas já tem tempo...
—Amanhã você vai me mostrar a cidade, se prepare para isso. —Cintia apenas concordou enquanto ria.


Sophie havia chegado no quarto e me observava nua, ela parecia incrédula.
— Seu corpo é de uma mulher, não de uma jovem.
— Você está me deixando sem graça assim Madam Sophie.—Falei enquanto Cíntia apertava o corsê me deixando quase sem ar, o vestido que Madam Sophie havia escolhido pra mim era lindo, mangas longas e soltas de seda, um decote simples em um formato de V, o corsê era um vermelho escuro o que tirava o foco o vermelho vivo do resto da roupa, nas barras alguns detalhes de pedraria trazia um brilho inexplicável para o mesmo.
— Me perdoe querida, é que é difícil ver uma jovem da sua idade com o corpo que você tem, mas está tudo bem, o vestido ficou perfeito em você, não é verdade Cíntia?
— Sim, é sim...— Cíntia não era de falar muito e sempre que falava era com vergonha, ela estava corada o tempo todo no qual ficava naquele quarto ficava mais vermelha, se ela fosse uma bolha iria estourar a qualquer momento.
— Seus cabelos você pode deixar solto, está lindo, trás um ar mais jovial pra você quebrando um pouco da forma de mulher que você tomou desde que colocou o vestido.— Sophie falava me puxando para fora. — Agora vamos para casa que você precisa conhecer e escolher seu quarto.

Me despedi de Cíntia apenas com um tchau, Cíntia sorria enquanto balançava as mãos, Sophie me carregava para todos os cantos com seus saltos que faziam barulho em todos os lugares que ela pisava, para minha surpresa também ganhei um, o que me deixava com certa dificuldade para andar já que nunca tivera antes usado um, caminhamos em conjunto até a carruagem que nos esperava, lá fora o frio era gritante e as pessoas que pela rua passavam me olhavam de cima abaixo me fazendo ficar sem graça, Madam Sophie me observava e a cada segundo que eu pensava em abaixar meu olhar, ela colocava a mão sob me queixo levantando meu rosto.
— Nunca abaixe a cabeça para ninguém.

  Seguimos em direção a minha nova casa, madame Sophie conversava comigo e falava que ficou surpresa pelo fato de eu ter feito amizade tão rápido com Cíntia, dizia que ela era fechada e que as meninas não gostavam dela pois ela já havia namorado outra mulher, eu achei diferente aquilo, nunca me imaginei com alguém, quem dirá uma mulher, mas aquilo não ia impedir de eu ter amizade com Cíntia que me tratou tão bem. A carruagem parou de frente a uma mansão, uma casa enorme bem bonita, descemos da carruagem e seguimos em direção da entrada, uma entrada longa com um caminho feito de pedras para não ter que pisar na grama, segui Sophie que andava com pressa.
— Eu vou te deixar aqui pois preciso ir para o meu bar daqui algumas horas...
— Eu não posso ir com você?
Sophie me olhou e sorriu, ela parecia confiante.
— Hoje você vai se acomodar, se sentir em casa, amanhã você pode ir comigo.
Concordei e segui ela, quando a porta se abriu meus olhos brilharam, a casa era linda. Suas paredes todas em um tom pastel dava graça ao ambiente que trazia um quadro enorme de  Madam Sophie. Alguns lustres de velas brilhavam com a quantidade de iluminação no lugar, as escadas com um tapete grosso vermelho mostrava a elegância do ambiente, algumas garotas ao ouvir Sophie chegando correram para abraça-la, e ela prontamente me apresentou a todas. Segui subindo as escadas e me deparei com um último quarto, ele dava de frente para o corredor e sua porta estava fechada, caminhei até ele e quando abri a porta me senti em casa, uma cama enorme estava  ali, um cobertor vinho sob ele e o lençol dourado dava um ar sofisticado, uma penteadeira grande ficava em um canto próximo a janela e o roupeiro estava aberto e vazio.
— Gostou daqui? — A voz de Sophie me fez assustar, ri da situação entrando no quarto.
— Eu quero esse quarto. — Falei com certeza absoluta, Sophie sorriu e concordou.
— Ele é seu.

Em busca da minha metadeOnde histórias criam vida. Descubra agora