A carta

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HANNAH

[Dias atuais, 22 de agosto de 2021, domingo]

Ao terminar de me arrumar, desci as escadas e segui diretamente até a cozinha, onde minha mãe já estava colocando as panquecas no prato sobre a mesa.

— Ainda não se arrumou, Hannah? Avisei que saímos em meia hora. — disse ela.

— Do que está falando? Eu já estou pronta. — me sentei para comer.

— O que eu te falei sobre se vestir que nem um garoto? Você é uma menina e deve ter mais feminilidade, filha. Como acha que vai se casar assim? Desse jeito, não vai atrair a atenção dos rapazes na Igreja e nem de nenhum outro.

Rolei os olhos e respirei fundo.

— Vai começar?

— Ok, Hannah, quer saber? Eu vou deixar você acabar seu café, mas depois de comer, suba e troque de roupa pois não vou pedir novamente, entendeu?

Sei lá, era inacreditável como a minha mente reagia diante de momentos como esse, a poucos segundos atrás eu estava com fome, mas agora as panquecas tinham até perdido o maldito sabor.

— Por que me odeia tanto, mãe?

— O que?

— Eu sei que não gosta de mim, tá legal? Não precisa fingir que gosta. — retruquei.

— Pare de ser dramática, eu só pedi para que troque de roupa, apenas isso.

— Me diz o motivo então. — falei rispidamente. — Quer que eu seja uma pessoa que eu não sou só para manter as aparências, não é? Sempre foi assim: na Igreja, em locais públicos, em festas de família, nos churrascos de fim de semana na casa dos parentes. E acaso não saiba, a religiosidade também mata, ok? — continuei gesticulando.

— Ei, o que está acontecendo aqui? — interrompeu meu pai.

Meu irmão, Kael, chegou logo em seguida.

— Sua filha quer ir vestida assim para o culto e eu não acho legal pois está parecendo um moleque. — disse minha mãe fazendo drama como de costume e depois eu quem era a dramática da casa.

— Não seja por isso, eu vou de vestido então, o que acham? Uma troca justa. — sugeriu Kael piscando o olho para mim.

— Valeu. — falei enquanto sorria para ele.

— Pare de dizer bobagem! Isso atrai coisa ruim. — repreendeu ela quase que aos berros.

— Nossa, foi só uma piada. — retrucou Kael enquanto abria a geladeira sem dar a mínima.

— Muito bem Hannah, troque de roupa e obedeça a sua mãe. — insistiu meu pai.

— Está de sacanagem né?

— Ei, olha a boca. — ele disse.

— Eu sempre me vesti assim: jeans, all star, as camisas largas. Qual o problema de vocês? — expressei minha indignação, eu precisava me defender afinal das contas.

— Acontece que não está adequada para o dia de hoje. — acrescentou minha mãe fazendo cena.

— Pois então sugiro que façam outra filha, já que essa aqui não tem agradado o suficiente. — falei me levantando e empurrando a cadeira com força.

— Atitudes assim não levam a lugar nenhum, Hannah Miller — persistiu ela com um tom de deboche em sua voz — e eu lamento muito mesmo que seu futuro marido terá de lidar com uma pessoa assim como você. — completou enquanto eu deixava a cozinha.

Os Quatro Mundos de Hannah Miller (REVISADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora