7 - O Imortal

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O vento soprou pela janela do meu carro – ultrapassando um pouco os limites de velocidade. Luzes passavam como vagalumes distantes, formas surgiam que eu não conseguia distinguir. Eu segurava firmemente o volante com as minhas mãos.

Lágrimas de raiva desciam dos meus olhos, trazendo à tona os momentos cruéis pelos quais passei nos meus últimos momentos de vida. Decidi que daria um fim a tudo, um fim trágico. Estava pensando se alguém sentiria minha falta, se perceberia como descobri, em minha jornada em direção ao infinito – eu saberia. Mas não, dessa vez eu só sentia ódio por causa de uma discussão boba que tive, que levou a um momento irracional de ilusão do meu ser, agora que ela tinha ido embora para sempre. E todos estavam distantes, não restava nada em meu caminho a não ser a morte. Dirigi o mais rápido possível e senti aqueles últimos instantes.

Quando voei pela direção do carro, tudo já estava preto. Mas ali estava meu corpo, e de alguma forma estava suspenso no ar, observando meus momentos finais.

Apareceu um homem voando, em uma forma fantasmagórica. Mas ele era diferente do que eu tinha imaginado ver após a morte – ele era modesto e humilde até demais, sua aparência era simples.

Ele me levou para o lugar onde eu não imaginaria que estaria. Dentro da minha casa, ou melhor, antiga casa. Agora era um espírito, pude ver que minha mulher tinha chegado em casa procurando por mim, ao seu lado sua amiga estava junto de sua mãe. As duas provavelmente estariam querendo pegar suas roupas de volta para se livrarem de mim.

Mas o homem misterioso girou sua mão, como se estivesse aumentando o volume. E logo suas vozes se tornaram audíveis.

— Ele é um idiota, acha que estou traindo ele. Estávamos juntas tomando apenas uma cerveja, seu ciúme frenético está me matando.

— Isso é uma chatice, mas ele é um homem muito bom.

— Tenho certeza que ele me ama. Mas onde ele está agora?

Logo o telefone toca.

— Alô, aqui é Elise, quem fala?

— Boa tarde, Elise. Aqui é do hospital de São Natilina. Recebemos um paciente aqui e em sua ficha está assinalado que a senhora é a pessoa mais próxima dele.

— O que aconteceu com o meu marido?

— Lamento informar, mas na última noite houve um acidente de carro e ele foi encaminhado para o hospital. Os policiais nos instruíram a entrar em contato com a senhora.

— Não posso acreditar!

Elise estava atordoada no chão, jogada aos pés do desespero.

No funeral, pude perceber que poucas pessoas apreciavam o meu jeito abusivo e intrometido de interferir na vida dos outros. Pessoas evasivas têm funerais solitários. Por tanto que me intrometi na vida dos outros, esse foi o resultado.

— Vês? Foi tolice tua, teu ciúme. — Caminhava a morte ao meu lado, percebi que seu jeito de sermão lembrava alguém... talvez meu pai, que faleceu quando eu era mais novo. — Agora pudeste ver que ela era completamente fiel a ti. Ela teve chances de encontrar um homem melhor, mas Elise continuou a tua espera, mesmo nas noitadas de bebidas. Quando as tuas crises de ciúmes começaram, ela passou a estudar teu comportamento, buscar ajuda em sites e blogs tentando encontrar uma solução. Tudo porque te amava. Tiveste essa chance nesta vida. E nunca mais terás outra igual. Agora, o que será daqui para a frente...

— Queria ter outra chance para recomeçar.

— Terás! Mas em outra vida. Estás preparado?

— Tenho escolha?

— Não.

Sentimentos perpassavam por mim, querendo abandonar aquele eu. Entrar naquele portal foi a melhor sensação que tive em toda a minha vida. Os flashes cósmicos que passavam por mim eram como se eu estivesse em um túnel. E ali estava eu, renascido em um novo corpo, em uma nova vida.

Elise viveu uma vida boa até receber a companhia de um gatinho. Sua irmã apareceu segurando o filhote em seus braços.

— Elise, não tenho forças para cuidar de um gatinho.

Ele fazia carinhas tão lindas e carinhosas quando Elise olhou para ele.

Mas ela viu algo diferente: os olhos do seu marido que faleceu.



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