"Nós estávamos buscando razões para jogar conforme as regras
Mas rapidamente descobrimos que isso era apenas para os idiotas
Agora através de toda a tristeza
Estaremos voando alto
E o que importa é que eu nunca deixo você seguir"
Mary on a Cross - GhostAustin, TX
2:49 AMCalor. Suor. Suspiros.
A TV ligada exibindo alguma série policial clichê entrega o horário, algo compreendido entre 2h e 3h da madrugada de uma sexta feira, ou perto disso, o que na verdade não me importa neste momento. O barulho das buzinas dos carros apressados nas avenidas abaixo deste andar do hotel entrega que não somos os únicos acordados experimentando doses de adrenalina. Chove fraco lá fora e os pontinhos das luzes da cidade se misturam na pele de vidro da fachada com a luz baixa e quente do quarto, dando ao ambiente um toque intimista e luxuriante, perfeito para esconder seus segredos dos que estão porta afora.
Me equilibro de pé com o corpo projetado para a frente enquanto me apoio no aparador de design contemporâneo que compõe a decoração do quarto. Adiante, vejo nossos reflexos no espelho fixado na parede, ao mesmo tempo em que tento controlar os gemidos que escapam entre nossos suspiros causados pelo vai e vem de nossos movimentos. A silhueta atrás de mim abraça meu corpo com um braço envolto em minha cintura e a outra mão revezando entre meu pescoço e meus cabelos. Nossos corpos se chocam com urgência e constância. Calor. Suor. Suspiros. Dois seres completamente entregues aos seus demônios em um misto de êxtase e da mais pura lascívia.
Cabeças vazias, corações cheios.
Uma mão vai até minha boca na tentativa falha de abafar minha prazerosa lamúria. Sinal de falso pudor? Aqueles que nos viram no palco há três horas podem atestar que moral e bons costumes não são as melhores palavras para descrever nossos personagens durante um espetáculo. Ou será que não apenas nossos personagens? Onde seria a linha tênue entre um personagem e seu ator? Entre a ética e a imoralidade? Entre a razão e a emoção?
Sinto uma mordida raspando a parte posterior do meu ombro esquerdo e jogo minha cabeça para trás, descansando-a na clavícula do homem enquanto ele continua suas fortes investidas. Arqueio meu quadril em uma tentativa de colaborar com a posição e num instante uma onda de energia toma conta de mim. Um calor interno que passa do centro de minha intimidade para o resto do corpo, me fazendo tremer e arfar enquanto emprego mais força contra a silhueta que me segura por trás. Ápice. Tento pronunciar algo, mas desisto assim que percebo que estou inebriada demais para completar uma única frase sem gaguejar ou falhar a voz. À medida em que tento recobrar minha consciência, sinto o corpo masculino projetar seu peso em minhas costas ao se inclinar para a frente e me pressionar contra o aparador em um esforço final.
Calor. Suor. Suspiros descompassados.
Sem afastar nossos corpos, nos encaramos de frente e engatamos um beijo quente e urgente, como se dependêssemos daquilo para selar um pacto de almas. São segundos de pura contemplação e tensão descarregada enquanto nossas respirações lutam para voltar ao seu estado inalterado. Em um movimento calmo e preciso, o homem encaixa minhas pernas em seu quadril enquanto me ergue em seu colo e caminha até a cama para dar continuidade ao beijo anterior, desta vez com mais demora e atenção, como se quisesse sentir cada nota de sabor e contato físico. Finalizamos ali mais um rompante de adrenalina e atos impensados através do nosso dramático "relacionamento", se é que isto pode ser nomeado. Os sons de nossas respirações descompassadas se misturam com o áudio da TV ignorada e o contato visual entrega os mesmos pensamentos ao outro, como se pudéssemos nos comunicar sem enunciar uma única palavra. Coisa de melhores amigos? Parceiros do crime? Amantes apaixonados?
Nós já sabemos como isso termina toda vez que acontece. Com um sutil movimento, o homem se levanta da cama me fazendo despertar daquele campo magnético criado ao nosso redor e o observo caminhar em direção ao banheiro. Suspiro fundo quando percebo o cheiro de perfume masculino carimbado em mim e tento desembaraçar meus cabelos com os dedos enquanto ouço o barulho do chuveiro ligar e sinto a fragrância de sabonete invadir o ambiente. Fico na cama pelos vinte minutos seguintes, absorta em pensamentos que divagam sobre o dia passado, o show da noite anterior, a cerveja com os colegas de banda e tudo aquilo que acabara de acontecer, mais uma vez. Meu estado de divagação é interrompido pela volta do homem que me deixara ali minutos antes, agora com os cabelos molhados e terminando de vestir as roupas que, na pressa, ficaram pelo chão. Continuo a observá-lo e miro o relógio ao meu lado no intuito de calcular quantas horas de sono ainda tenho antes do voo às dez da manhã para a próxima cidade da turnê. Ao terminar de se vestir e verificar se sua aparência está impecável como sempre, o homem vem até mim e se debruça sobre meu corpo para uma rápida despedida.
— Você estava linda no palco essa noite — murmura enquanto deposita um breve beijo em meus lábios como um sinal de cumplicidade. Em seguida, se inclina sobre a mesa de cabeceira e ouço o tilintar da prata quando pega seu relógio, seu celular e sua aliança. Se levanta e enquanto se afasta da cama, pronuncia — Não se esqueça de trancar a porta.
Observo-o saindo do quarto e me levanto caminhando em passos preguiçosos para digitar a senha de segurança da suíte. Em seguida, aciono o controle remoto em direção à TV para desligá-la, agora que ele se foi, seu áudio não é mais necessário para mascarar possíveis ruídos acidentais que possam atravessar as paredes. Sigo até a jaqueta jogada em cima da poltrona de canto da suíte e retiro dos bolsos um cigarro e um isqueiro, passo pela cama, de onde pego o lençol extra que ali descansa e enrolo em meu corpo à caminho da sacada. Deslizo a porta de vidro e, quando sinto o frescor provocado pela chuva de verão da madrugada, aproveito para encher meus pulmões de ar. Acendo o cigarro e enquanto trago a fumaça, massageio as têmporas e repito mentalmente a visão dele fechando a porta após se despedir. Ele. Tobias Forge. O líder da banda a qual faço parte, além de meu sócio e, ironicamente, noivo de outra mulher. Meu parceiro de arte durante anos e a pessoa que me transporta do céu ao inferno em segundos, seja pelos nossos impulsos dos quais pouco me orgulho ou pelos sentimentos dúbios que nos sentenciam a ser tão orgulhosos e criam nós que nos amarram um ao outro.
Cabeças cheias, corações vazios.
"Se você escolher fugir comigo
Eu te farei cócegas internamente
E eu não vejo nada de errado com isso"
Mary on a Cross — GhostA autora recomenda que a música Mary on a Cross — Ghost seja ouvida após a leitura deste capítulo.
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not just another bloody mary | GHOST FANFIC
Fanfictionnós estávamos buscando motivos para jogar conforme as regras mas rapidamente descobrimos que isto era apenas para os tolos 🥀 PROIBIDA A CÓPIA DE PARTE DO MATERIAL OU SUA TOTALIDADE. PLÁGIO É CRIME.