4. sympathy for the Devil

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"Prazer em conhecê-lo
Espero que adivinhe meu nome
Mas o que está te intrigando
É a natureza do meu jogo"
Sympathy For The Devil - The Rolling Stones

Nova Orleans, LO
18:30 PM

O termo "ruído branco" é usado para descrever o som produzido quando todas as frequências sonoras estão na mesma potência, resultando naquilo que conhecemos como "barulho de tv fora do ar". Um som incômodo reproduzido pelas televisões antigas, como uma chuva de pixels acinzentados e barulhentos que quase te ensurdecem, a depender do volume em que sua tv está ligada, e que logo dá lugar a uma tela de listras coloridas acompanhada de um zumbido contínuo desesperador de se ouvir. Provavelmente alguém que tenha menos de vinte anos não tem noção do que quero dizer, devido a evolução da tecnologia e de como as coisas que aconteceram no passado ficam apenas na memórias de quem as viveu.

Fato é que, após fechar aquela porta de madeira de um tom azul acinzentado deixando a suíte 89 para trás, encontro o corredor do hotel, que agora entrega um silêncio ensurdecedor que chega a ser barulhento demais. Dentro de minha cabeça, paira um som similar ao tal "ruído branco", como pano de fundo para um turbilhão de pensamentos que brigam entre si para se destacarem entre os demais, como em um curto circuito onde a energia não pode ser controlada. Minha visão está meio turva e posso dizer que me falta um pouco de ar, como se o oxigênio disponível no ambiente não fosse o suficiente para suprir a quantidade de que meus pulmões precisam para funcionar normalmente.

Saio em direção ao elevador sem saber muito bem para onde ir, carregando comigo apenas o desejo de sair daquele andar o mais rápido possível. Depois de colocar Tobias contra a parede e receber uma resposta tão vaga, sinto que há uma confirmação do que eu já esperava. Talvez ele tenha cansado de tudo isso e não saiba como dar um fim, talvez tenha enjoado de mim ou, sei lá, possa estar arrependido. A questão é que me sinto uma idiota por ter deixado essa situação chegar a esse ponto sendo que tudo sempre foi esporádico, sem compromisso. Ele só me usava para foder quando queria e ia embora em seguida, nada mais. Mas se eu sei de tudo isso, não entendo por que me sinto afetada. Acho que no fundo, usar alguém dessa forma não me parece algo que Tobias faria, simplesmente não é de seu costume agir assim. Desde que o conheço, sempre tratou muito bem as pessoas com quem se envolveu e ser um "rockstar" clichê nunca foi de seu interesse. Ainda mais em relação a mim, ele não colocaria tudo o que construímos a perder por puro tesão, certo?

Rio amargamente como se aceitasse que não consigo decifrá-lo. É isso, assumo aqui. Não sei mais o que ele pensa, o que ele é, nem o que quer, se é que um dia o soube ou só estou tentando me enganar para não me dar por vencida. Como disse antes, chorar nunca foi uma opção e continua não sendo para uma situação como essa.

Tento acalmar minha respiração descompassada e focar meus pensamentos em ações plausíveis de serem seguidas. A sensação que tenho, apesar de todo o caos interno, é de alívio e ao mesmo tempo de vazio. Alívio por conseguir confrontá-lo, vazio por não conseguir ver uma saída. Me sinto em um labirinto, no qual corro até me sentir exausta e o que deveria ser o final, se revela o começo e lá vou eu de novo e de novo. Há muito tempo nós fingimos na frente dos outros e para nós mesmos que nada acontece e, colocar para fora em voz alta faz tudo parecer mais palpável e firma a existência disso, querendo ou não.

Eu transo com um homem comprometido por diversão, ou seja lá o que for, e tenho que lidar com isso. Ele trai a noiva fodendo uma amiga por puro tesão, ou seja lá o que for, e tem que lidar da mesma forma que eu. Não tem volta, o que está feito, está feito. Parar agora não vai apagar o que já aconteceu. Nós somos assim. Duas pessoas horríveis que fazem mal para outras pessoas e para nós mesmos.

not just another bloody mary | GHOST FANFICOnde histórias criam vida. Descubra agora