P R Ó L O G O

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— Porra!

Pressionei meu pé no acelerador, ouvindo as sirenes se aproximando. Troquei de marcha, fazendo com que o volante rangesse sob a pressão de minhas mãos. Os pneus derraparam e o cheiro de borracha queimada atravessou as janelas fechadas.

— Seu bastardo de merda, falei para entrar na outra avenida!

Pisquei algumas vezes, intercalando minha visão entre os retrovisores e a rua movimentada. Meus dentes rangeram ao ter que ouvir Mick, ele nem mesmo devia estar aqui.

— Filho da Puta! A culpa é sua! — Minhas pernas tencionaram ao frear, levando o seu corpo para frente. — Você é louco?!

Limpando o recente corte em sua sobrancelha, Mick me olhou irritado. Com a mão em seu banco, encarei as viaturas multiplicando-se nas ruas cruzadas. Pisei no acelerador novamente, virando na próxima rua.

— Continue falando, e eu não pensarei duas vezes em abrir essa porta e o jogar para fora — falei baixo, buscando um meio de escapar.

— Isso seria contra as regras. Nada de violência com os próprios irmãos. — O barulho irritante intensificou, levando-me a querer quebrar as regras e a cara de Mick. — Além de que meu tio não ficaria satisfeito em me ver morto.

— Tem certeza? — ironizei.

Não me virei para vê-lo engolindo em seco.

Os reflexos em vermelho e azul brilhavam em todas as direções, bloqueando as ruas que poderiam ser meios óbvios de fuga. Eles estavam me cercando. Era uma questão de tempo.

O volante tremeu sob o meu aperto ao girá-lo completamente na direção contrária. Visualizei um tapete de pregos sendo espalhado mais a frente, levando-me a deslizar sobre a calçada.

— Preto estúpido! — Me enfureci. — Era um trabalho simples, você estragou...

Levantei meu cotovelo, acertando o seu nariz que estralou sob o impacto. Mick gritou ao perceber que o nariz tinha quebrado. Troquei a marcha novamente, levando o seu corpo a chocar-se com força na porta. Ele estava certo, não o mataria, mas não o deixaria sair sem alguns hematomas.

— Seus dias estão contados, Stone! — Desta vez o sangue desceu fluidamente em seu rosto. — Nem mesmo o seu trabalho conseguirá salvá-lo.

Virei a esquina, mas o carro retesou. O som de algo explodindo e a dor que instalou-se rapidamente em minhas costas, fizeram-me tirar as mãos do volante. Os pneus arranharam o asfalto, levando o carro a girar algumas vezes.

O airbag esmurrou meus olhos, minha nuca vibrando no estofado de couro. Porra. Minha visão nublou-se com a sequência de luzes e vozes que se misturavam ao redor do carro. Mick desmaiou e percebi que os meus pés estavam presos.

— Saiam do carro e levantem as mãos!

A voz no alto-falante irritava os meus ouvidos. Era um zumbido que enraivecia os meus órgãos auditivos, levando-me a tampá-los com minhas mãos por alguns segundos.

Meus dedos encontraram sangue descendo em meus olhos, tornando as imagens ao redor borradas e desconexas.

Ao perceberem que não estávamos fugindo, os policiais puxaram as portas, imprensando suas armas em nossos rostos. Não apresentei resistência, apenas deixei que me jogassem para fora.

— Um está apagado! — Ouvi várias vozes usando os tons mais altos, sentindo minhas mãos serem algemadas. — Nossa cidade está se tornando perigosa com essas crias do gueto.

Meu pescoço estava sendo esmagado pela bota de um dos policiais. O ar entrava com dificuldade enquanto encarava Mick, que estava recebendo um tratamento diferente do meu. Os homens brancos sabiam que ele era um bandido, assim como eu estava sendo taxado, mas diferente de mim, enfermeiros limpavam os seus ferimentos, já eu me encontrava sendo estrangulado por grandes pés.

— Você irá matá-lo! — Em algum lugar escutei alguém se importar com a minha vida. — Erga-o, agora!

— Não se meta, Patrick. Estou cansado de pessoas da cor dele fazendo bagunça na cidade. — Não me importaria em desfigurá-lo com meu punho, mas minha situação se tornaria pior caso eu reagisse.

— Deixe-o! — Meus braços foram puxados, sendo jogado ao lado de Mick. — Cuide dele.

Por baixo do sangue fresco, observei uma mulher se aproximando. Em silêncio, limpou os cortes e chamou um dos policiais. Meu corpo debateu-se contra o estofado da viatura, permaneci com os olhos baixos.

As portas se abriram e o carro foi ligado.

— Como é o seu nome, garoto?

Minha garganta seca arranhava contra a resposta que eu não queria dar. Meu corpo dolorido se encontrava com a raiva e o desinteresse.

— Responda! — o homem esbravejou, empurrando um cassetete na grade que os protegia de mim, ou o contrário.

Não importa quantos motivos tenha, a cor da pele sempre seria o desempate. Meus traços eram ofensas e a minha geração uma vergonha. Meu sangue escorria igual ao de Mick, mas a minha pele era afrontosa demais para que notassem. Eu era escravo de um julgamento sem defesa. Ou a minha defesa era a minha própria voz?

Minha cor era ostensiva, poderosa. Meus traços eram fortes, evidentes. E, a minha geração, era rica e histórica.

— Ethan Stone.

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