Há dois anos, tinha tudo para ter uma vida feliz, mas algo trágico precisava acontecer naquele momento.
— Ei, cuidado! — ouço alguém gritar por mim.
Quando acordei, estava em uma cama de hospital com as pernas imobilizadas por causa do acidente.
— Sinto muito, querida! — minha mãe me consolava, sem conseguir esconder as lágrimas.
Eu sabia que não podia andar, mas meus dias eram entediantes deitados em uma cama de hospital.
Ouvia enfermeiros tagarelando e assobiando, enquanto os pacientes ao lado recebiam visitas e conversavam alegremente, sorrindo o tempo todo.
Não deveriam estar tristes? Hospital não é um lugar bom.
— Sinto muito pelo que aconteceu com você. — Uma criança entra no quarto em uma cadeira de rodas.
— Tudo bem, vai passar. — digo, tentando confortá-lo.
A expressão cética dele me assusta, e ele franze a testa.
— Não é o que parece. — Ele diz, percebendo minha tristeza.
— Estou entediada aqui. — mostro o quarto branco, sem poder fazer nada.
— Prometo que vou te buscar amanhã de manhã para um passeio, ok? — ele diz, animado.
Havia alguém esperando por ele na porta.
— O que eu disse sobre incomodar os pacientes? — era uma enfermeira, com cabelos crespos e definidos, vestida de branco.
— Ela estava triste, eu só quis ajudar. — Ele se defende.
— Então, agora volte para o seu quarto. — Ela entra no quarto e fecha a porta.
— Sinto muito. — Ela diz, percebendo meu abatimento.
— Ele só quis ajudar. — indago, um pouco triste.
— Você se sentiu incomodada com isso? — Ela se senta ao meu lado, segurando minha mão.
— Não, foi bom receber uma visita. Estava entediada aqui. — respondo, sorrindo sinceramente.
— Que bom! Agora você precisa descansar. — Ela diz, antes de sair, sem perceber que me aplicou morfina. Os médicos disseram que eu ainda sentiria algumas dores e precisaria de remédio para dormir.
Acordei na manhã seguinte, e lá estava ele, ansioso por um passeio, sorrindo e se movendo muito na cadeira!
— Você gosta muito dela, não é? — a enfermeira pergunta, enquanto ajeita meu soro e já havia reservado uma cadeira de rodas.
— Ainda não podemos ir. — Ele diz, percebendo que eu olhava para a cadeira de rodas. — A Bia disse que só podemos ir se você tomar seu café da manhã. Ela me contou que você está recusando a comer.
Eu não sei como uma criança me convenceu a comer e fazer aviãozinho comigo.
— Ela está comendo quase tudo! — Ele diz, olhando para trás, quando a enfermeira entra.
— Isso é bom! — Ela faz um carinho na cabeça dele, dá um beijo e o abraça.
— Já comi bastante. — digo, sorrindo.
— Crianças... — responde a outra enfermeira, abrindo as cortinas.
— Agora podemos ir? — Ele pergunta.
— Posso me arrumar antes de sair? — pergunto, e ele confirma com a cabeça.
— Bia, pode me ajudar? — peço antes de me colocar na cadeira.
Ela me ajuda a vestir uma roupa mais quente e a pentear os cabelos curtos, que nem tocam nos meus ombros. O penteado realçou os castanhos claros do meu cabelo.
— Obrigada! — digo, olhando-me no espelho.
— De nada. — Ela fica parada, me observando. — Tem uma coisa que você precisa saber...
— Hum... — respondo.
— Não faça muitas perguntas ao Gael; não foi fácil para ele.
— Já podemos ir! Tem alguém ansioso por um passeio.
Acabei indo no passeio, e as enfermeiras pilotavam nossas cadeiras. Elas se divertiam correndo pelos corredores, e vimos o jardim. Conhecemos a área onde os idosos ficavam tomando um pouco de ar; alguns recebiam visitas, outros tinham enfermeiras ao lado, e outros liam livros ou jornais, sempre fazendo algo no seu dia a dia.
— Viu? Não é tão ruim assim. — Ele diz, ao me ver distraída e sorrindo.
— Obrigada! — agradeço pelo passeio.
— Podemos fazer isso mais vezes, quando você quiser.
— Eu...
Ouço alguém gritar por mim.
— Noêmia! — Era minha mãe, com um vestido dos anos oitenta e os cabelos ao vento.
— Oi, mamãe! — ela me cumprimenta com um beijo na cabeça e um abraço.
— Que bom que você saiu do quarto. — Ela diz, olhando para as duas enfermeiras e para Gael.
— Mamãe, deixa eu te apresentar meu amigo, Gael. — digo, me aproximando dele.
Ela apenas olhou e foi embora, na verdade, foi esperar por mim no meu quarto.
— Não precisa ficar aqui, pode ir ver sua mãe. — Ele disse, triste pela maneira como minha mãe o olhou.
A enfermeira levou-o embora, e a outra me levava de volta.
— Gael é uma criança muito sensível. Cuidado para não magoá-lo; parece que ele gostou muito de você. Nunca o vimos tão animado como hoje.
Nesse momento, chegamos ao meu quarto, e meus pais estavam discutindo sobre o divórcio, mas sempre há um que recusa.
— Quem é essa enfermeira? — Ela pergunta, fazendo cara de nojo, não gostando dela.
— Podem ir embora, por favor? — eu peço, olhando furiosa para eles.
— Tudo bem, querida! — meu pai me dá um beijo na testa antes de ir.
Eu não queria sair do quarto, não quis comer, e as enfermeiras perceberam que eu estava nervosa. Aplicaram um sedativo em mim, e eu só dormi...
No outro dia de manhã, a enfermeira veio me insistir para comer.
— Eu estou sem fome. — digo, recusando a comida.
— Por favor, só um pouco.
— Acho que ela vai querer comer. — Bia entra com Gael no quarto.
Eu sorri e aceitei comer a sopa de legumes sem sal.
— Yes! — ele comemora.
Ele chega perto da janela e observa por um instante.
— O seu quarto tem a melhor vista! É melhor que o meu quarto, e você não pode desfrutar disso? — Ele olha para mim nesse exato momento.
— Tenho me sentido abatida pelo que ocorreu comigo, e... meus pais só vêm aqui para discutir.
— Sinto muito. Meus pais eu nem cheguei a conhecer, só tenho uma foto deles.
Eu ia tentar perguntar mais sobre o que ele sabia sobre seus pais, mas a enfermeira me interrompeu antes de eu fazer qualquer pergunta.
— Sinto muito por isso.
— O importante é que estamos vivos, não é, Bia?
— Olha, é um milagre que vocês estão vivos!
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A pedido de um milagre
RomansaNoêmia, uma jovem que se vê presa em um ciclo de relacionamentos problemáticos, encontra conforto e amor ao lado de Bennett, um homem sensível e apaixonado. Juntos, eles formam uma nova família ao cuidar de Gael, um menino que carrega a dor da perda...