"Ouça, minha criança, você diz para mim / Eu sou a voz de sua história / Não tenha medo, venha me seguir / Responda ao meu chamado, e eu te tornarei livre" The Voice - Celtic Woman
Já era manhã e todos os criados do castelo corriam para recolher e encobrir os estragos que a tempestade havia deixado para trás. Havia folhas secas espalhadas por todos os corredores, poças d'água nos jardins e lama cobrindo todos os caminhos de acesso às ligações entre as torres. Alguns galhos foram arrancados das árvores, certos cômodos, entre eles saletas e copas, estavam bagunçados e com móveis desalinhados devido ao forte vento que entrara por quaisquer espaços disponíveis. Peças de roupas e tecidos se espalhavam pelos quartos, janelas estavam quebradas e os criados se espalhavam e se organizavam entre si para arrumar tudo antes da fúria do rei fosse inflamada e todos levassem culpa por algo que, obviamente, fugisse de suas ações e controle.
Até o momento, ninguém havia notado o desaparecimento da princesa e de sua dama de companhia, a não ser por uma pessoa.
O antigo emissário do rei, que um dia falhara em sua missão e agora era apenas um recluso do castelo que vivia imerso em seus próprios pensamentos, carregava em suas mãos um bilhete que sua filha deixara. Um bilhete que achara no chão e quase todo destruído por conta da chuva, a tinta no papel estava se esvaindo, mas ainda fora possível ler seu conteúdo. Era um bilhete de partida, com uma promessa de retorno e salvação. O coração daquele pai se entristeceu um pouco mais devido a perda repentina, mas, ao mesmo tempo, encheu-se de esperança. Esperança de uma nova vida e, enfim, um recomeço. Talvez assim pudesse deixar a tristeza de lado, talvez assim pudesse glorificar o nome de sua amada de forma digna.
Não demorou muito para que os serviçais, em desespero mútuo, percebessem a ausência da princesa. O caos se instalou, ninguém sabia como repassar a notícia ao rei e a rainha. Depois de uma breve reunião entre os mais aptos para a tarefa que os fazia arrepiar todos os pelos de seus corpos, Janete, a cozinheira que havia conversado com a princesa Francesca no dia anterior, se prontificou a falar com um dos conselheiros do rei, relatando o que havia observado da jovem quando a contactou, pois era a mais indicada pois nenhum outro criado havia conversado com Vossa Alteza tão intimamente quanto a sátira.
Todos estavam preocupados, o que poderia ter acontecido?
Aos poucos a notícia se espalhou e, no decorrer do dia, todos já estavam sabendo do ocorrido. Alguns moradores do castelo falavam que o episódio da noite passada se assemelhava ao de um mau presságio e era claro que algo ruim estava por vir. Alguns moradores das vilas vizinhas acreditavam que uma maldição pudera estar à solta e muitos começaram a vender amuletos de proteção e espalhar simpatias para afastar tudo o que havia de ruim.
Mas quem realmente sabia o que estava acontecendo eram bruxas que moravam nos arredores dos pequenos conjuntos de civilização. Longe o suficiente para não se misturarem aos demais, mas perto o suficiente para observar o movimento das informações que recebiam dos deuses. A profecia finalmente estava acontecendo.
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Acordei e simplesmente me vi em um espaço vazio, como se fosse uma sala abandonada. Ainda estirada no chão, decidi sentar-me ali mesmo.
Observei que a construção era antiga, pois as pedras nas paredes indicavam que aquilo provavelmente existia a mais tempo do que eu pudesse imaginar. Parei por um momento e reparei que aquilo era de uma época que eu jamais vira retratada em livros. Senti uma força me atraindo para aquele lugar, como se fosse algo premeditado a minha presença naquele local.
Saí do chão e observei os móveis que me rodeavam.
Eles estavam cobertos por tecidos empoeirados e as janelas abobadadas, feitas de vidro riscado com uma tinta desconhecida, estavam todas pregadas com pedaços já podres de madeira. Essas madeiras tinham marcas que a princípio não consegui reconhecer. Limpei um pouco de pó que grudou em meu vestido ainda molhado e andei com passos lentos e silenciosos em direção as janelas para observar melhor essas marcas ali entalhadas.
Não sei como, mas consegui entendê-las.
"Não fuja" dizia uma delas, a que estava na parte de cima, quase chegando ao topo da borda abobadada.
Eram marcas similares às runas que eu havia estudado em segredo nas vezes em que me separava de Francesca e fugia para a biblioteca do castelo. Livros sempre me chamaram atenção, e entender mais dos povos antigos também. Entender a razão pela qual as coisas são como são, estudar o que existe e o que fora inventado para nos calar.
"Aceite." dizia outra marca.
Aceitar o quê?
Essas runas não estavam presentes nos livros que eu já encontrara, mas eu as entendia. Como sou capaz de ler algo que nunca sequer havia estudado?
"Não tenha medo." era o que estava escrito na terceira madeira, olhando de cima para baixo.
Não fuja, aceite e não tenha medo.
O que isso quer dizer?
Escutei passos se aproximando e senti um medo súbito, tentei calar meus pensamentos como se isso fizesse alguma diferença. Ninguém poderia escutá-los, era impossível. Apressei-me para debaixo de um piano e puxei os tecidos para cima de minha cabeça. O pó que ali antes se acumulara entupiu minhas narinas e segurei um espirro.
- Corra. - sussurrou uma voz em minha mente. Ou talvez fosse seja lá quem quer que estivesse se aproximando do cômodo. Senti um calafrio percorrer minha espinha e uma intensa vontade de fugir, de correr, como a voz havia me instruído.
- Corra! - repetiu a voz e percebi que ela realmente apenas ecoava em minha mente.
Meu coração acelerou suas bombeadas de tal forma que se refletiram em minhas mãos que estavam suando frio e extremamente trêmulas. Tentei me levantar para sair de onde estava, mas minhas pernas não se moveram. O medo era crescente e os passos se aproximavam.
- Corra, Augustine, corra! - a voz tentou me alertar, mas já era tarde demais. O chão começou a sacudir, o piano começara a tocar sozinho uma melodia extremamente macabra. A luz do lado de fora das janelas começou a irradiar com uma força completamente mística e poderosa. Algo estava acontecendo e eu não conseguia sair dali. Uma fumaça verde começou a passar por debaixo do tecido que cobria o piano e fora de encontro a mim.
Não fuja.
Aceite.
Não tenha medo.
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A MELHOR AMIGA DA PRINCESA (Reino de Seres e Maldições)
FantasyComo seria se a história fosse contada pela melhor amiga da protagonista? E se tudo fosse narrado aos olhos da personagem secundária? Imagine um típico livro de fantasia, repleto de golpes de estado, guerras infindáveis, maldições enigmáticas, o po...