existe a possibilidade
de, entre os lençóis volumosos,
carinhos e abraços
de um outro alguém,
você se perguntar
ou até pensar em me ligar
para saber como vou,
não é?
caso esse meu desejo se concretizasse
eu teria de responder que vou, sim, bem
muito bem!
e que, às vezes
ao folhear meu livro de contatos mentalmente,
enquanto louco, ou muito perdido
eu teria, também, considerado
te ligar.
na realidade, querido
você saberia exatamente
o quão afundado estou
e como não meço esforços
nem perco chance alguma
de fugir de meus compromissos
para fumar em um beco qualquer
estando irreconhecível,
embaixo do meu velho sobretudo preto
eu gostaria que ainda soubesse, na verdade
que tentasse lembrar, ao menos
da minha mania de fitar as luzes dos apartamentos, dos postes
e dos faróis dos carros
e que, junto disso,
adorava compartilhar meus planos para invadir os casarões da vizinhança
não falhando em roubar alguns risos incrédulos seus
na voz abafada do celular,
você perguntaria como andava meu livro
ah, essa seria complicada
ele está aumentando, aos poucos
já que o escrever é só um maldito sonho
capaz de fazer de mim
o que nunca serei.
estou brincando. não seria tão pessimista
responderia que sou um sonhador, querido
não temo, não hesito
sou um daqueles apaixonados
inspirados por uma única pessoa
que escreveria sobre e, principalmente, para esse ser sortudo
por toda eternidade, se pudesse
mas, o que te faria checar em mim,
depois de tanto tempo?
nostalgia? escassas lembranças?
daquelas quase mortas,
jogadas no fundo da sua mente?
o que te faria pausar sua vida no paraíso
laçado pelas mãos delicadas do novo amor
para descer, a passeio, no inferno dantesco
que é meu cotidiano?
que loucura que seria
você se distanciar da sua doce amada
somente para dar uma visita na espiral
do mundo torto que vivo.
acho que odiaria admitir
que o senhor é muito mais esperto que eu
que nem bêbado, chorando, na pior
consideraria vir atrás de mim de novo
porque isso é nada além de uma interminável guerra
sem expectativas de sucesso
pode ter sido a época, ou o nosso jeito
os erros, a forma que o destino nos selou
que o mundo quis que fosse
não que você pense nisso, claro
não que eu pense, de maneira alguma, né?
não que eu...
enfim,
se, e só se
você me ligasse
eu diria como sempre é bom ouvir de ti
que, mesmo tendo seus intervalos, eu continuaria atendendo
que, poderia se passar algumas semanas
ou até vários, vários meses
que, independente da estação do ano,
daonde ou o que eu estivesse fazendo,
ao ver que é você
eu sorriria todas vezes, todas
querido,
você não tem ideia
de como anseio que ainda se lembre,
seja no menor detalhe possível
ou... sabe lá como,
de mim.
será que é pedir muito
querer que exista essa possibilidade?
