Capítulo 18

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Há alguns meses, Vítor teria torcido o nariz se alguém lhe falasse sobre um sentimento que consistia na necessidade constante de estar com outra pessoa o máximo de tempo possível, todos os dias da semana, sem enjoar dessa pessoa. Ele teria achado tudo muito cansativo. Agora, porém, sua existência havia se resumido a duas situações: estar com Ana ou pensar em estar com ela. E, quando a avistava pela escola, mal conseguia disfarçar a saudade que se manifestava em longos e ansiosos olhares.

Contudo, Vítor não percebia que, tendo olhos só para Ana e deixando que seu mundo orbitasse ao redor dela, incorria em riscos perigosos por desprezar todo o resto. Assim, não viu que a atenção que Bianca costumava destinar a ele tinha passado de um interesse afetuoso, tímido demais para se mostrar, para uma curiosidade com ares de ciúme quando ela começou a reparar no modo como Vítor olhava para a professora de literatura. Não viu que a colega o observava agora com o semblante fechado, seguindo cada movimento seu dentro daquela escola. Não viu que ela havia compreendido o que estava acontecendo porque o encontrou segurando o pulso de Ana em um corredor e notou que, ao invés de repeli-lo, a professora sorriu e deslizou os dedos pelos dele enquanto se afastava.

Bianca não era tola e, sem fazer alarde, foi juntando as peças daquele estranho mosaico. No começo do ano, Vítor e Ana pareciam estar sempre próximos um do outro, conversando no meio das aulas, e embora agora quase não se falassem, ficavam se olhando de um jeito que claramente queria dizer alguma coisa. Diziam que ele tinha uma namorada misteriosa, com quem saía em segredo, e Vítor havia se exaltado de um modo suspeito no dia em que a professora de literatura quebrou o pulso e precisou ser substituída. Além disso, Vítor não ia às festas dos outros alunos e ignorava as garotas da escola que demonstravam interesse por ele, como se já estivesse apaixonado por alguém.

De início, enquanto suas suspeitas eram apenas suspeitas, Bianca relutou em aceitar como possível a ideia de que Vítor estivesse envolvido com uma professora, com uma mulher que era bem mais velha do que ele. Como aquilo poderia ser verdade? O que ele teria visto em alguém como Ana e, sobretudo, como ela teria coragem de relacionar-se daquela maneira com um aluno? Do ponto de vista de Bianca, a possibilidade era até mesmo repugnante.

Porém, no momento em que o viu tocando aquela mulher, as coisas lhe pareceram tão claras e ela sentiu-se tão burra por nunca ter se dado conta de que eles realmente eram um casal. Com os olhos marejados, Bianca recolheu-se às sombras da dobra do corredor e enrijeceu de dor e raiva, porque os sentimentos e a paciência que havia nutrido por anos tinham sido jogados no lixo sem que ela tivesse a chance de ao menos tentar. Agora Vítor nunca saberia como ela se sentia em relação a ele e, mesmo que soubesse, não faria qualquer diferença.

E tudo por culpa daquela mulher degenerada que não compreendia o seu lugar.

Bianca não tinha considerado a hipótese de Vítor retornar pelo corredor e a encontrar ali, e, quando ele de fato o fez, ela ainda não havia decidido como reagir. Ele a encarou em um silêncio sobressaltado, o sorriso morrendo no rosto e dando lugar a uma expressão desconfiada, e Bianca enxugou os olhos com as costas das mãos em um gesto irritado. Tudo o que ela conseguia pensar era que aquilo não era justo.

- O que... – ele pigarreou, limpando nervosamente a garganta. – O que está fazendo aqui?

- Então era por causa disso, não era?

- Do que você...

- Era por causa dela!

- O que você viu? – seu tom mudou de nervoso para alerta.

- Eu vi tudo o que precisava ver. Você está saindo com a professora de literatura.

- E o que isso tem a ver com você? – ele perguntou em um sussurro áspero.

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