III. Túmulo

135 14 26
                                    

- E este é o meu túmulo. - Parou em frente à uma enorme árvore ali perto, se aproximando lentamente de um pequeno espaço de podridão em suas raízes.
- Ficou podre desde que eu fui, já que era inverno na época e tudo secou.

- Vou fazer perguntas. - Shuichi começou.

- Inteligente da sua parte não ter perguntado se poderia,meio ousado também. - Riu se sentando ao lado das grossas raízes.

- Eu sei que vai ser bem desconfortável...talvez não...Mas...eh... - Estremeceu ainda sem aceitar o fato de que era um fantasma ao seu lado, mas logo se sentou junto à Kokichi. - ...Como você morreu?

- Suicídio. - Respondeu seco, desviando o olhar para a floresta mais à frente do bosque. - Não acho que estou arrependido, faço o que eu quiser agora, e nunca tive ninguém de qualquer forma.

- Oh...ahm... - Se emaranhou nas  desconfortáveis informações, perdendo sua fala.

- É eu sei, logo eu. - Voltou a sorrir, deitando a cabeça entre os joelhos encolhidos contra si, olhando atentamente para Shuichi. - ...Amar dói, machuca.

- Eu posso perguntar o por quê? - Tentou se aconchegar no tronco duro da árvore, em vão.

- Por que o quê?

- O suicídio...não precisa responder, eu só...

- Eu te disse, amar machuca. - Se ajeitou na grama. - Resumindo, eu era igual você, Ele era como eu. Mas éramos uma doença, um transtorno. Ele me deixou e eu deixei todos.

- Sinto muito. - Foi a única coisa que poderia pensar em dizer, a situação do garoto ao seu lado era péssima.

- Não sinta, fazem mais de duas décadas.

-----×-----

Conversaram por mais um tempo, a tarde toda falaram sobre eles ou o que costumavam ser. Pessoas passavam, olhavam um garoto conversando sozinho com uma árvore e partiam logo em seguida.

- 'Tá ficando tarde, tenho que ir.

- Shuichi. São 17h da tarde.

- Eu sei...Bom, última pergunta do dia. - Falou quase como um alívio, tinha passado o dia todo segurando ao máximo para não se esquecer, acabar questionando-o e perder sua última pergunta do dia.

- Pergunte. - Fingiu deitar em seu ombro.

- ...Como eu vou te entregar um presente?

- É uma boa pergunta. - Admitiu arrumando sua postura ao seu lado. - Sua companhia já me basta. Me prometa ao menos isso, lembre de mim.

- Eu vou...Eu vou ficar junto de você, não importa quanto tempo demore, ainda quero saber como é o mundo em seu olhar. Eu prometo.

- Não faço promessas. - Se levantou. - Venha. - Estendeu sua mão, mas logo a recolheu novamente ao lembrar que não pode tocar pessoas.

- Onde vamos? - Se levantou com receio.

- Não sei...Vamos ver as estrelas. - Correu em meio ao bosque com um enorme sorriso.

- ...Me espera! - Tentou correr atrás de Kokichi na mesma velocidade, mas era impossível.

Acharam mais uma abertura em meio as árvores, se deitaram no chão e, ao invés de olhar as estrelas, fecharam os olhos e se silenciaram por um longo momento.

-----×----

Voltou para casa revigorado, deitar na grama em silêncio com a companhia de um fantasma parecia ser tudo o que precisava. E então, puxou mais uma vez o pequeno caderno.

"Amanhã passarei o dia todo ao lado de uma pessoa morta, levarei o que qualquer fantasma gostaria de receber (eu acho)..."

Morto (O Terno) - Saiouma/OumasaiOnde histórias criam vida. Descubra agora