Quando sentamos à mesa para jantar, vejo que Lana olha para os talheres e arregala os olhos. Claramente, não está acostumada com os três conjuntos diferentes de garfos, facas e colheres. Eu mesma nunca achei necessária essa quantidade ridícula, mas Lais gosta de seguir o figurino. Quero ajudar Lana, mas ela não olha para mim. Está prestando atenção em nossas mãos, esperando que alguém indique o caminho. Decido que serei eu a acabar com o seu desespero e pego o primeiro talher da direita, de fora para dentro. Ela solta o ar, audivelmente e me copia.
- Então, Lana, o que você faz para viver? - Lais não perde tempo e começa o interrogatório. Provavelmente, está testando o terreno para ver se consegue vender uma das salas do centro comercial que nem começou a construir ainda. Lana para com o garfo a caminho da boca, um cubo de cenoura pendurado nele. Ela também não estava esperando que começasse tão cedo.
- Eu, ãhn... Escrevo algumas coisas. - Ela olha para nós e coloca rapidamente a cenoura na boca.
- Certo. - Lais fica esperando pelo restante da resposta, e quando ela não vem, insiste. - Algo que eu já tenha lido? Escreve sobre o quê? Romances, coisas técnicas, não-ficção? - A voz de Lais é suave, mas sei que está sedenta por informações. Nesse mundo em que vivemos, informação vale mais que ouro.
- É. - Lana responde, e seguro a vontade de rir.
- O que está achando da cidade? - Pergunto, quando Lais concentra o olhar em Lana, um caçador examinando a sua presa. Lana está fazendo tudo certo para que Lais fique obcecada por ela. Ela não vai sossegar enquanto não virar a alma de Lana ao avesso.
- Estou gostando. - Responde, quando engole a comida. - Tania está me apresentando aos poucos a cidade e as pessoas. - Lana aponta o garfo para Tania, como se eu não soubesse quem ela é. Sinto uma pontada de pena. Se Tania é sua guia turística, ela só vai conhecer as várias construções passadas da igreja da cidade, o lugar onde fica o clube de bordado, a construção atual da igreja e o casebre do padre Henrico.
- Amanhã nós vamos contratar o Cristian para cortar a grama de Lana. - Tania fala. Levanto as sobrancelhas. - Temos que incentivar os garotos de hoje em dia a lutarem pelo seu próprio dinheiro, entende? Além disso, Lana não tem dinheiro para pagar um jardineiro de verdade. - Lais se mexe, desconfortável. Lanço um olhar seco para Tania, que não vê.
- Tenho certeza que ele fará um ótimo trabalho. - Lana responde, nem um pouco incomodada. - Não sei quem morava lá antes, mas não era uma pessoa que focava em frivolidades como cuidar do jardim. - Ela toma um gole de água e volta a nos olhar. - Espero que não seja nenhum parente de vocês. - Acrescenta rapidamente.
- Na verdade, minha irmã morava lá. - Lais fala. Lana começa a abrir um sorriso amarelo. - Mas faz muitos anos, no mínimo dez. Não vou ficar ofendida. - Ela direciona um sorriso branquíssimo para Lana. - E você acertou, ela era péssima com o jardim. Com a casa. Com a família. - Os ombros de Lana caem um pouquinho. Qual é o problema de Lais? Por que está determinada a deixar Lana desconfortável? Coloco mais meia taça de champanhe para Lais.
- Quando você vai casar, Lais? - Tania acerta a pergunta no meio da minha amiga. Lais inclina o corpo para trás, levemente, e solta o guardanapo do lado do prato.
- Quando aparecer alguém que preste, Tania. - Ela rebate em um tom doce demais. Ainda estou me perguntando por que ela convidou Tania para esse jantar.
- Mas você está envelhecendo, minha filha. Precisa começar a se preocupar com o tempo que ainda resta para poder engravidar. - Tania se serve de mais um pedaço minúsculo de pato. - Nem sempre é necessário ter amor em um relacionamento, sabe? Muitas vezes ele aparece com o tempo e a convivência. Assim como nem sempre o amor é o suficiente para manter um casamento. - O lábio superior de Lana treme levemente. Sei qual seria a reação dela, mas os negócios a impedem de falar alguns palavrões. O marido de Tania é um dos maiores investidores de Lais, e ela não quer jogar o apoio dele fora por causa de uma briga sobre conceitos conflitantes sobre a palavra casamento.
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A estrada que trouxe você
RomanceRio Vermelho é uma cidade pequena, cheia de belezas naturais, onde as pessoas não trancam suas casas ou constroem muros. Natália decidiu se afastar da loucura da cidade grande, fez amigos e criou raízes nas entranhas desse vilarejo, que está longe d...