Capítulo 8

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Odiava o Eduardo.

Bom, pelo menos, estava o odiando naquele momento — parado ao lado da televisão da sala, com uma apresentação de slides preparada e com Stephany sentada no meu sofá, me encarando com curiosidade.

— Meu psicólogo me obrigou a fazer isso — expliquei.

— Isso o quê? — ela, obviamente, perguntou.

Reuni toda a coragem que não havia em mim para passar o slide para um que dava início à minha palestra — "Breve introdução aos transtornos mentais de Bernardo Leone: um guia prático para um bom convívio interpessoal."

Assisti o queixo dela cair. Nunca tinha visto um queixo cair antes. Eu sabia bem que havia o sério risco de ela levantar e sair correndo, achando que eu era um maluco. Mas eu realmente sou maluco. Maluco ao ponto de chegar à conclusão de que aquela era a melhor maneira de fazer o que Eduardo me orientou. Então, se há alguém a quem atribuir culpa, essa pessoa é o Eduardo.

Passados os três segundos iniciais de legítimo choque, ela mexeu suas pernas — não para sair correndo, como eu imaginei que fosse — e as cruzou sobre o sofá, em pose borboleta. Abriu o sorriso mais divertido da galáxia e exclamou:

— EU ADOREI!

Suspirei aliviado. — Bom, então, para começar — passei para o slide seguinte, onde haviam dois bonequinhos de palitinho desenhados por mim, no paint, embaixo da palavra "amizade" —, o que é uma amizade?

Nos encaramos até que ela se tocou: — Ah! É para eu responder? Tudo bem! — ajeitou o cabelo e a postura, como se estivesse respondendo uma pergunta em um concurso de miss universo. — Uma amizade é quando duas pessoas decidem se apoiar, mesmo que seus gostos e estilos de vida não sejam compatíveis.

— Interessante escolha de palavras — pensei alto.

— Por quê?

Fui obrigado a responder: — "Escolhem se apoiar." Geralmente, as pessoas definem amizade com base em afinidade.

— Discordo!

— E eu concordo com a sua discordância! — fiz questão de pontuar, antes de passar para o primeiro tópico. — E, para apoiar, é necessário conhecer e entender, não é? — Ela concordou, mais atenta do que eu imaginei que estaria. — O que nos leva ao assunto desta humilde apresentação: o que há de errado comigo?

Observei em silêncio enquanto ela absorvia cada palavra como se algo daquilo fosse cair no ENEM.

— O que sabe sobre ansiedade? — tomei a palavra mais uma vez.

— Não muito, na verdade.

— Bom, resumindo, ansiedade é basicamente minha cabecinha doida pensando em tudo vinte e quatro horas por dia, o que não é nada saudável, porque às vezes eu penso coisas que não são verdadeiras e isso me faz surtar, tanto emocionalmente quanto fisicamente. Eu tremo igual um pinscher, não durmo direito, não como direito, choro muito e fico parado olhando pro nada porque não consigo fazer mais nada da minha vida.

Pausei por dois segundos para dar a ela a chance de se manifestar. Quando isso não aconteceu, prossegui:

— Enfim, o que eu quero dizer é que eu posso ser bem delicado quando se trata de certos assuntos. Certos temas me fazem surtar mais do que o normal, então é preferível que não toque em tópicos específicos comigo.

— Por exemplo...

— Família.

Ela assentiu, lentamente. — Acho que seria melhor pra todo mundo se ninguém perguntasse sobre a família de ninguém.

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⏰ Última atualização: Jun 26, 2022 ⏰

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