Momentos frios de um cemitério

29 1 2
                                    

A mulher com o vestido de época acompanhado com espartilho negro reluzente imergiu dentro do meu cérebro, penetrou seus dedos em minhas têmporas e tocou a massa cefálica alojada no interior do meu crânio. Ouvi um zumbido aumentando

gradativamente e um tintilar ao fundo, parecendo ecoarem no interior do meu peito. Alguns segundos depois, meu cérebro pareceu adormecer e formigar, meus braços vibravam, assim como as minhas pernas e estômago, porém meus membros não respondiam aos meus comandos. Tentei gritar, mas eu já não estava deitado no chão da mansão de Bellamy depois, agora eu segurava em minhas mãos um pedaço de papel branco e uma caneta.

Minha mão estava trêmula e foi difícil escrever; "Mãe, eu esperei por você. Porém você se atrasou e acabei indo para a reunião dos meus amigos. Prometo retornar para casa antes das onze e meia da noite. Beijos de Dan." Depois eu larguei o recado sobre o balcão ilha e peguei a minha mochila.

Eu verifiquei o horário no relógio de bolso, que estava na minha família há décadas e é o único pedaço do meu pai que mantenho como recordação. Ganhei o relógio prateado de presente quando completei quatro anos de idade e, acredito eu, que foi na mesma época que iniciei as perguntas sobre o meu pai. A minha mãe explicou a mim que ele havia falecido num acidente de serviço enquanto ajudava um colega de trabalho, e que isso foi logo depois que eu nasci. O relógio havia sido do primeiro aviador pertencente a nossa família Donohoe, estava conservado e em excelente estado, funcionava a corda e possuía uma corrente dourada que eu prendia no bolso. Eu só o usava para ocasiões importantes e que necessitasse manter a calma, sendo assim o relógio que carregava servia para aliviar a tensão e o nervosismo. Afinal, eu nunca havia saído de casa ou sozinho, ainda mais para encontrar amigos.

Chegando próximo à igreja, notei que o céu estava com poucas nuvens e a lua iluminava praticamente tudo. Alguns postes de iluminação começaram a falhar e a rua deserta ficava sombria por alguns segundos. Eu guardei o relógio no meu bolso novamente, avistei a pequena estrada que levava para o cemitério da cidade e caminhei até ela com os ombros encolhidos.

Um ruído de galhos sendo quebrados ecoou ao meu lado, olhei de soslaio e senti minha pele enrijecer. Continuei caminhando, desta vez um pouco mais rápido e continuo, até passar por debaixo das grandes árvores e encontrar o portão do cemitério.

Havia um muro feito de tijolos pequenos protegendo o cemitério de vândalos, o portão era alto com barras de ferro escuro e pontiagudos, algumas dessas barras curvavam-se para apresentar um desenho de lírios e estavam conectados por uma grossa corrente presa com um cadeado antigo e resistente. Passei a não sobre ele e puxei a corrente verificando que estaria trocando o cemitério. Encarei adentro as lápides e, entre duas covas, vi algo brotar do solo em minha direção. Primeiro o alto da cabeça saiu da terra e da névoa, logo duas pequenas esferas vermelhas mostraram-se para mim, em seguida o pescoço percorreu entre as covas, depois os ombros se arrastaram pela terra juntamente com duas cobras no lugar dos prováveis braços da criatura. A cada segundo ela deslizava para onde eu estava saindo do solo do cemitério e carregando a fumaça branca da serração.

O meu coração gelou, larguei a corrente e ouvi o som dos elos se chocando contra as barras. Depois, virei abruptamente para trás ao escutar novamente alguns galhos sendo pisados e esmagados. Não vi ninguém, porém um braço esquelético prendeu o meu pescoço sobre as grades do portão. Eu tentei me virar para ver o que ou quem era, mas só senti um hálito cheirando a peixe estragado com leite azedo, o que fez o meu estômago revirar-se numa bola de concreto.

-Carne... Sangue... Vida... Perdida... -A voz sussurrou ao meu ouvido como unhas riscam a lousa. E o cheiro se intensificou. -Eu sei quem és... Já faz tempo que não sinto o cheiro de uma...

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Sep 25, 2015 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Danniel Magically e o Mundo dos DiferentesOnde histórias criam vida. Descubra agora