raios e trovões

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   Chego em casa ainda pensativa de tudo aquilo. Preciso conversar com alguém.

   Ligo para Nancy, mas ela diz que vai sair com o fedido do Steve. Barbara diz que a mãe dela não quer que ela tenha contato com ninguém por causa do que rolou com o Byers. O único que sobrou foi meu melhor amigo e fornecedor de drogas.

   - Eddie? Você tá ocupado? – pergunto ao escutar a voz dele do outro lado da linha.

   - Estava tirando um cochilo. Por quê? – ele fala com a voz sonolenta e eu esboço um sorriso.

   - Queria conversar. Você pode vir aqui em casa? – fico esperando ansiosa uma resposta dele.

   - Vou sim. Deixa só eu trocar essa roupa fedida. – ele diz sério e eu dou risada. 

   - Que nojo garoto!

    Depois de desligar o telefone, vou até a cozinha e bebo um copo de água. A casa está completamente vazia, pois minha mãe disse que iria ficar de plantão no trabalho hoje. Eu pego alguns salgadinhos e levo até o meu quarto. Não demora muito para que a campainha soasse, anunciando que Eddie havia chegado.

   Nem faz tanto tempo que nos vimos e você já estava com saudades? – ele me abraça e dá um beijo em minha testa. 

   - Às vezes você parece uma criança sabia? – dou um tapinha em seu ombro e nós subimos até meu quarto.

    Ele ri e se joga em minha cama. Eu o repreendo e pego minha caixinha mágica para bolar um baseado para nós dois. Me sento na cama e ele me abraça por trás, apoiando seu queixo em meu ombro.

   - Quer que eu faça isso? – Eddie diz muito próximo ao meu ouvido e não consigo controlar o arrepio que senti.

   - Você sabe que eu odeio quando faz isso. – digo me referindo ao sussurro em meu ouvido e o entrego a caixa.

   - Justamente por isso que amo fazer. – ele sorri sapeca e dá uma piscadinha para mim.

    Fico o observando todo concentrado enquanto bola o baseado. Ele se atrapalha um pouco com seu cabelo grande caindo sobre o rosto e eu não consigo deixar de rir. Penso algumas vezes se devo contar sobre o meu passado para ele, mas acho melhor deixar quieto, pois sabia que provavelmente ele se afastaria de mim.

   - Virei obra de arte pra você ficar me admirando? – ele termina e tira um isqueiro do seu bolso.

   - Ai que saco você! – reviro meus olhos e dou um sorriso, roubando o baseado e o isqueiro da mão dele.

    Acendo o beck, trago a fumaça e depois a solto, fechando meus olhos. Dou um sorriso fraco ao sentir Eddie pousando seu olhar em mim e confirmo a sensação quando volto a observá-lo. Nossos olhares se cruzam, com a fumaça se desfazendo no ar e a chuva caindo lá do lado de fora. Prendo minha respiração quando ele coloca a mão em meu rosto e se aproxima mais de mim.

    - Não vou fumar não? – ele dá um sorriso de canto ao perceber o efeito que causou em mim.

    Coloco o baseado na boca dele, o observando tragar sem desviar seus olhos dos meus. Me assusto um trovão que ecoa alto e ele guarda o resto do beck no cinzeiro, me abraçando.

   - Foi alto né? – ele se refere ao trovão.

   - Eu tenho medo de barulhos altos assim. – uma lágrima escorre do meu olho e uma memória ruim me vem a mente.


Fevereiro de 1975

   - Tudo vai ficar bem querida. – meu pai segura minha mão enquanto caminhamos pelo corredor.

    Entramos na sala de aula e eu estava com medo. Papai tinha me deixado ficar mais um ano sem ter que fazer as aulas, mas agora não havia escapatória. Ele me levou até minha cadeira e ficou na sala para me acompanhar no primeiro dia. De repente, ouvi um barulho muito alto, era tão forte que parecia inundar meu cérebro com suas vibrações e eu apenas gritei. Gritei tanto que tudo apenas ficou em um silêncio profundo...



   - Eu estou aqui com você Mary. Vai ficar tudo bem. – ele disse passando a mão por meu cabelo.

   -  O garotinho Byers não teria sumido se eu não insistisse. – digo sentindo mais vontade ainda de chorar. Foi como se tudo tivesse se acumulado em uma bola de problemas dentro de mim e aquela memória foi o gatilho.

   - O que? Para de falar besteira Weinstein! – Eddie continua com o carinho em minha cabeça. – A culpa de tudo que aconteceu não é sua tá bom?

    Assinto com a cabeça e o olho com um sorriso fraco. Ele passa seu polegar por onde as lágrimas escorriam e nossos olhares se encontram mais uma vez. Sua mão está em meu rosto, as minhas estão em sua nuca. Sua respiração está lenta, tão próxima que consigo sentir em minha pele. Minha respiração está acelerada, na mesma velocidade em que meu coração bate enquanto nossos corpos se aproximam. Meus olhos se fecham, ansiando pelo que era para acontecer no momento seguinte. Mas então, outro trovão.

   - Misericórdia! – coloco as mãos em meu peito, onde sinto meu coração tão acelerado que parecia querer sair da minha caixa torácica.

   - Ei Mary, vem cá. – Eddie apaga a luz do quarto, se deita na minha cama e me puxa para que eu me aconchegasse em seu peito. – A chuva vai passar tá bom? – ele voltou a fazer carinho em meu cabelo e meus olhos foram se unindo um ao outro como se fossem um imã. – Te amo tanto garota. – O escutei falando antes de ser consumida por completo pelo sono.

Number Nine - stranger thingsOnde histórias criam vida. Descubra agora