Surtos e manipulações

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SOOJOO

- Como foi sua semana? - a terapeuta questiona assim que me sento na poltrona de frente a ela. 

- Péssima. - respiro fundo, tentando diminuir parte da minha ansiedade. 

- Por que? - a mulher mais velha ajeita o óculos em seu rosto, me analisando sem julgamento em seu olhar. 

- Eu sinto que a cada dia que passa, me sinto mais inquieta e preocupada, talvez até paranoica. Eu não consigo dormir, tenho pesadelos constantes. 

- Soojoo... - ela diz meu nome em um tom baixo, tranquilo e eu respiro fundo - Nós estamos fazendo sessões já há algumas semanas e eu entendo perfeitamente que cada pessoa tem seu tempo para se abrir, mas eu percebo sua relutância e não tem como avançarmos se você não se abrir comigo. 

- E-eu... - fecho os olhos e respiro fundo novamente, sentindo minha garganta se fechar - Eu estou com medo. 

- Você pode sentir medo, é natural se sentir assim, mas aqui você está protegida, eu prometo a você. - ela sorri suavemente para mim e mordo meu lábio inferior. Minha mente está em guerra. Seguir a razão ou o coração? Ceder a culpa ou me manter calada? 

- Como eu já te disse nas outras sessões - respiro fundo e apoio as mãos sob meu colo - Eu voltei para cá porque tinha finalizado meu mestrado e minha mãe disse que estávamos com sérios problemas nas empresas. 

- E você se dispôs a retornar para ajudar no que fosse possível, mas sem deixar sua carreira de modelo de lado. - a terapeuta sorri e apenas aceno com a cabeça. Desvio o olhar e foco na mesinha de centro com alguns objetos em formatos estranhos, reunindo toda a coragem para contar o que vem me atormentando há muito tempo. 

- Quando eu retornei, minha mãe disse que havia se encontrado com os pais de uma antiga amiga e eles se propuseram a nos ajudar. 

- Eu sinto que há um mas... 

- Eles foram solícitos a princípio, nos ajudando com consultoria e entrando em contato com as pessoas que poderiam nos salvar do fim que estava próximo. 

- A situação estava caótica assim? 

- Um dos diretores estava desviando dinheiro das empresas e, da noite para o dia, ele fugiu com tudo. - sinto meus olhos arderem em lágrimas - E o problema nem foi esse golpe, mas foi o combinado que minha mãe fez com os pais dessa amiga. 

- Nós já conversamos sobre sua mãe ser narcisista e tóxica, acredito que vamos voltar a esse ponto? - pisco algumas vezes, sentindo algumas lágrimas escaparem e respiro fundo. Agora que eu comecei a contar, preciso terminar. Preciso colocar tudo para fora. 

- Esse casal de amigos, se é que posso chamar assim - acabo soltando uma risada sem humor algum - É conhecido por serem homofóbicos e cristãos a ponto de já terem expulsado uma das filhas de casa ao descobrirem sobre a sexualidade dela. 

- É a sua amiga? 

- Não exatamente, nós acabamos nos reaproximando quando voltei porque ela é diretora de uma revista grande e me ofereceram um trabalho, mas o ponto é que, como forma de retribuir a ajuda que recebemos, eles queriam me juntar com essa outra filha deles. 

- E você não se sente confortável para fazer isso, certo? 

- Não, não é esse o problema. Eu acho Jisoo linda, sempre tive uma queda por ela, desde quando éramos amigas há anos atrás, mas eu não me sinto confortável em ser usada como moeda de troca apenas para negócios, entende? - volto a olhar para a terapeuta - Como eu poderia tentar qualquer coisa com ela, sendo que ela está claramente apaixonada por outra pessoa? Só de imaginar fazendo algo assim, meu estômago se sente enojado. Eu estou mais do que feliz com a amizade de Jisoo, é o suficiente. 

- Os pais dela fingem serem o que não são apenas para usar as filhas para acordos comerciais, é isso? - a terapeuta se remexe na cadeira e seu tom de voz indica que ela está um pouco surpresa. 

- Eles nunca deixam claro o que querem de fato, mas usam manipulação e tudo que estiver ao alcance deles para conseguir o que querem. - balanço a cabeça em negação ao pensar tudo do que eles são capazes de fazer - Jisoo se encantou por Haein e esse plano deu certo. Os Jung e os Kim se uniram, tornando os Kim's mais poderosos do que antes, tudo isso sem ninguém suspeitar. 

- Não foi ele que morreu em um acidente aéreo há algum tempo? 

- O próprio - dou um sorriso triste e volto a encarar um ponto fixo na mesinha de centro - Só que os pais de Jisoo não imaginavam que outra pessoa entraria em cena, alguém que eles não puderam corromper. 

- O que aconteceu? - o tom da mulher mais velha agora é preocupado. 

- Durante um jantar de negócios com eles, conheci Seungri. Nós saímos juntos algumas vezes e no dia do lançamento da revista que fui modelo, tivemos uma reunião de urgência. - passo a mão pelos cabelos, me sentindo mais nervosa do que antes - Os pais de Jisoo pagariam Seungri para incendiar o restaurante em que ele trabalhava. - pigarreio e bebo um gole d'água antes de continuar, sentindo minhas mãos suarem - Só que Seungri parecia totalmente fora de si, quero dizer, eu sabia que ele usava algumas drogas, mas nunca achei que fosse vê-lo naquele estado. 

- Ele chegou a fazer algo com você? 

- Ele tentou. - de repente fica difícil respirar ao me lembrar daquele dia - Seungri tentou abusar de mim e eu achei que iria morrer. Tinha uma arma em cima do balcão e eu estava tão assustada, tentei empurra-lo, mas ele estava maluco. Ainda me lembro das marcas horríveis que ele deixou em meu corpo - tento controlar o tremor em minhas mãos e na minha voz, mas logo estou chorando. 

Depois de alguns minutos, ainda sem conseguir controlar as lágrimas, a terapeuta está ao meu lado oferecendo um lenço. 

- Sinto muito que você tenha passado por uma situação assim. - ela apoia a mão em meu ombro, apertando delicadamente, enquanto tento me acalmar. - Você não precisa continuar falando se não quiser. 

- Eu preciso dizer tudo que estou guardando há tanto tempo. - consigo dizer depois de diversos minutos - Minha sorte foi que os pais de Jisoo chegaram e Seungri se afastou, aparentemente, eles eram as únicas pessoas que colocavam medo no Chef. - sinto meus lábios tremerem e pego o copo d'água novamente - Eu estava tão assustada com o que tinha acabado de acontecer que mal consigo me lembrar do que aconteceu, só me lembro claramente de ouvir alguns gritos. Seungri havia surtado, avançando em direção a onde estávamos e o pai de Jisoo atirou nele, acidentalmente. 

- Acidentalmente? - a terapeuta parece mais surpresa que antes. 

- Foi o que ele disse, a única memória que tenho daquele dia é de ver Seungri caindo no chão com o peito manchado de sangue e a mãe de Jisoo me mandando ir embora porque eles iam terminar o trabalho. - minha voz falha no final - No outro dia, eu descobri que Jennie Kim era a principal suspeita do crime e eu não conseguia acreditar. 

- Você já cogitou a ideia de falar tudo para a polícia? - ela diz depois de vários minutos e eu balanço a cabeça em negação. 

- Não posso - digo, sentindo minha voz ficar embargada novamente - Os pais de Jisoo tem pessoas vigiando cada um dos meus passos e da minha mãe. Eles já nos ameaçaram e deixaram claro que deveríamos ficar caladas ou... 

- Ou? - ergo o olhar para ver a psicóloga com a sobrancelha arqueada e o olhar preocupado. 

- Ou o pior aconteceria. - engulo em seco e dou um sorriso triste. 

Acidental - JensooOnde histórias criam vida. Descubra agora