A boca dele na dela. A mão envolta do pescoço delicado, apertando. O polegar abaixo do queixo, mantendo-a firme no lugar. O resto era um borrão lascivo, úmido e tórrido.
Tremor percorre o corpo dele antes de abrir os olhos, os pelos finos sobre sua pele se ouriçando. Um sonho. Fora apenas um sonho. Não era o primeiro e por mais que ele desejasse e implorasse a si mesmo todas as noites antes de dormir, não seria o último.
Tudo começara após aquela manhã congelante em Bournemouth, enquanto o Conde Styles caminhava pelos fundos da propriedade dos Graham numa tentativa de espiar o terreno e a casa que ele havia ouvido os moradores da pequena cidade dizer estar à venda. A intenção dele era passar despercebido e ele teria conseguido se não tivesse avistado aquelas mechas escuras de cabelo voado ao vento.
Ele havia seguido a silhueta daquela mulher e desde então aquela mulher o seguia para onde quer que fosse, bastava apenas fechar os olhos. A princípio, apenas a silhueta dela delineada pelas roupas escuras e surradas, os cachos pretos de cabelo se agitando no ártico vento em contraste com o branco da paisagem. Mas então o rosto dela começou a ganhar forma e quando o corpo dela, envolvido em seda vermelha, fizera morada na região mais sombria e pervertida de sua mente, Harry entendeu que aquilo não teria fim. Ele havia se afeiçoado a ela.
O Conde ainda estava no controle, no entanto. Ele estivera no controle a maior parte de suas vidas e não haveria de ser diferente naquele momento também. Talvez tivesse se deixado levar por caprichos outros que não os seus próprios ao assinar aqueles papéis que lhe garantiam direitos não apenas a uma mansão no condado de Dorset, mas também a uma jovem filha de baronete falido. Talvez tivesse amarrado a si mesmo a um fardo. Talvez, e apenas talvez, uma minúscula parte de Harry conseguisse compreender o que havia levado ele a querer aquela jovem mulher. Mas ainda assim, era o Sr. Styles quem estava no comando e se tivesse que conviver com o fato de que todas as noites, assim que colocasse a cabeça sobre o travesseiro, estaria fadado a suportar fantasias maliciosas e despudoradas para se manter o controle, então ele aguentaria cada sonho que tivesse de aguentar.
Não era a primeira vez, desde que conhecera sua esposa, que acordava com um ressaibo moral na ponta da língua. A mudança dela para Blackwood Hall só havia agravado aquele amargor. Naquele instante, contudo, conforme Harry se ajustava sobre os lençóis, percebia que havia algo muito errado na maneira como o algodão grudava em sua pele e como suas costas ardiam.
O mundo ainda estava escuro quando ele abriu os olhos e por conta das cortinas fechadas, o quarto estava ainda mais enigmático e sombrio. Demorou alguns instantes até que Harry percebesse que aquele não era o seu quarto.
Fora difícil para o Conde discernir o que sentira primeiro, se fora o horror por não estar sozinho na cama que não era sua, o gosto metálico nos lábios inchados ou se fora o cheiro tão caracteristicamente lascivo e tão tipicamente presente após eventos carnais. Ele estava recobrando os sentidos mais lentamente do que gostaria, mas uma certeza terrível já estava se assentando em sua cabeça de que o que quer que tenha acontecido ali lhe traria grande arrependimento.
O corpo deitado ao lado do seu estava quieto, portanto Harry esforçou-se para conter seu arrebatamento enquanto tentava recobrar suas memórias, em busca de uma explicação plausível para o que estava lhe acontecendo naquele momento. O aposento já não estava mais tão escuro quanto antes, seus olhos agora acostumados com aquele mistério, e a cada peça decorativa e mobília que ele notava não pertencer ao seu próprio, seu coração batia mais rápido.
Raven. Foi inconveniente o quão ligeiro o nome lhe veio a cabeça e o Conde teve de lutar consigo mesmo para não virar o rosto.
A briga. Harry se lembrava da discussão que teve com a Sra. Styles no salão destinado ao baile, lembrava-se de todas as coisas que ambos haviam dito um para o outro. Ele havia sido particularmente ríspido com a esposa propositalmente, afim de puni-la pela vergonha que ele acreditava que ela lhe fez sentir ao descobrir que seu plano de atrair o Marquês Rockford para Blackwood Hall falhara. Além disso, Harry estava frustrado consigo mesmo e com a presença dela em sua casa a muito tempo e naquele momento no salão não pensou duas vezes antes de despejar sobre a Condessa toda a raiva que sentia por ter colocado a si mesmo naquela posição.
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𝐑𝐢𝐩𝐩𝐞𝐝 • H.S.
FanfictionSéculo XIX. Era Vitoriana. Presa a um acordo de casamento sem amor, a vida pacata da geniosa Raven Graham se transforma drasticamente quando ela tem de se mudar do interior para Londres, para morar com o seu novo marido, o Conde Harry Styles -- que...