Comemoração e Consequências

31 1 0
                                    

Asriel finalmente se mudou pra cidade, um mês e meio depois de o "incidente" acontecer, ele também começou a trabalhar no hospital local, onde acho que está muito melhor agora, já eu... Finalmente saí da casa da minha mãe e agora estou morando com Heleanor, não foi bem uma decisão, é só que eu já estava dormindo lá há um tempo e estávamos nos dando bem eu só fui ficando, tentei dormir em casa por uma semana ou duas, mas ela constantemente me ligava de madrugada pra ir pra casa dela, então eu só voltei pra lá e tem sido assim por três meses.
 
Quanto aos sonhos... Eles continuam... A voz tem ficado cada vez mais clara, eu não sei como, mas, de alguma forma eu consigo entender o que ela diz agora, apesar de ainda parecer algo distante e quebrado, mas o cenário continua o mesmo, um vazio interminável de escuro e só meu próprio corpo como algo visível, não tem sido todas as noites, as vezes quando tomo remédios pra dormir eu não sonho com nada.
 
- Amor, acho que é melhor você não ficar tomando muitos desses não. - Heleanor comenta assim que pego a caixa de remédios no armarinho do espelho no banheiro.  Ela vinha da sala e me observa da porta.
 
- Hum? Como assim?
 
- Quero dizer, seu corpo pode se acostumar, ou até se viciar se ficar tomando muito.  - Faz sentido... Mas eu tomo assim mesmo, sei lá, uns três comprimidos. - KRIS!
 
- Calma, eu estou bem, ja parou pra pensar que vício é um estado da mente? Se eu não me sentir viciado então não vou ficar.
 
- Isso é balela. - Ela fica emburrada e então volta pra sala.
 
- Não, meu amor, é ciencia. - Eu dou risada e enquanto guardo de volta a caixinha de remédios.
 
Nós então dormimos abraçados até a hora em que eu tenho que acordar pra trabalhar, minhas noites depois do medicamento sempre passam muito rápido, eu não sonho e não tenho nenhuma sensação de descanso, é como se em um piscar de olhos passasse das onze da noite pras oito da manhã, e então eu levanto para mais um dia no meu emprego, deixo Heleanor dormindo enquanto coloco minhas calças e abotôo a camisa social, apesar de trabalhar já há quase dois anos desse jeito, eu ainda sou péssimo com a gravata, então eu só deixo de qualquer jeito e jogo o paletó por cima.
 
Morar no centro até que não é nada mal, posso ir a pé pro trabalho e isso me poupa tempo e dinheiro, fora que com isso dá pra comer alguma coisa no caminho que me sirva de café da manhã.
 
Bom, não posso dizer que nesses últimos meses o jornal esteve normal, mas... Eu não esperava uma comoção logo que eu chegasse pra trabalhar, um dos chefões desceu do trono pra vir até aqui no escritório dos nerds de internet, ele falava com Susie enquanto a maioria dos outros funcionarios fingiam trabalhar pra ficar espiando o que acontecia, eles conversavam baixo, então dava pra ouvir pouco, mas, como todos estavam fazendo silencio, as vezes dava pra identificar certar palavras como "Trabalho", "Subir" e outras coisas desconexas.
 
Eu vou direto pra minha mesa, eu não me importo muito com o que está acontecendo, provavelmente ele só veio parabenizar a Susie novamente pela cobertura do caso dos assassinatos de três meses atrás... Eu óbviamente acabei não recebendo nenhum crédito oficial pela mídia, mas a tia Undyne e os outros policiais que são subordinados dela me levaram pra comer num lugar legal e depois em segredo me deram uma medalha, não posso desfilar com ela por aí, mas foi bem... Foi bacana.
 
 
Eles ainda conversam por algumas dezenas de minutos até que o cara resolve subir de volta pro andar dele, aquele andar onde ficam os figurões e os metidos que comandam esse prédio aqui, Susie espera ele pegar o elevador e então suspira bem fundo quando ele vai embora, um dos funcionários se aproxima pra falar com ela e então logo em seguida ela entra em sua sala... Não que eu esteja interessado em saber o que está acontecendo, só vou fazer meu trabalho aqui e então ir pra casa.
 
- Parece que ela recebeu uma promoção. - Alguém diz pro cara que senta atrás de mim.
 
- Caramba, sério? - Ele se surpreende. - Então quer dizer que ela vai sair desse andar né... Me pergunto quem vai ser o próximo supervisor...
 
- Há... É claro que não vai ser nenhum de nós dois. - Eles riem juntos. - Ai cara, se eu soubesse teria me esforçado mais pra poder concorrer a vaga.
 
- Tenho quase certeza que você não faria nada de diferente mesmo se soubesse... Mas eae, por que acha que ela foi promovida?
 
- Por causa das matérias que escreveu, não? - O outro cara perguntou. - Apesar que eu acho que uma ou duas postagens não fariam alguém se promover...
 
- Pois é... Certeza que ela anda dando pra alguém lá de cima.
 
Respiro bem fundo, não é da minha conta mesmo... Mas ainda assim, não consigo controlar meu corpo e o desgosto intenso que sinto ouvindo isso, eu me levanto tentando não agir diferente do normal, mas não sei se consigo muito bem, meu corpo não para de tremer enquanto eu simplesmente ergo a CPU do computador dele e arremesso contra a parede, eu nem sei como eu tive força pra isso, mas não me importo, eu só puxo a gravata dele e em seguida o soco.
 
O amigo dele pula em mim, tentando me tirar de cima e então eu recebo um golpe de algum lugar, mas eu não me importo, eu só grito, grito muito sem dizer nada, é só uma raiva muito grande.
 
- MAS QUE MERDA CÊ TÁ FAZENDO? - Então um golpe muito forte acerta minha cabeça e eu sinto que sou arrastado pra longe, mas continuo tentando me soltar pra bater mais naquele cara. - PORRA KRIS PARA QUIETO.
 
Susie me joga sentado na cadeira da sala dela e em seguida fecha a porta.
 
- Que diabos foi aquilo. - Ela fala baixo, mas a forma como sua voz chia deixa transparecer toda a raiva que está sentindo. - Eu estou no meio de uma coisa importante, se você der chilique vai estragar tudo...
 
- Foi mal. - Ela respira bem fundo, e então expira demoradamente.
 
- Okay, o que foi que aconteceu ali?
 
- Nada demais... Eu só fiquei de saco cheio desse pessoal. - Não sei o por que mentí, ela é a chefe, deve estar acostumada com os funcionários falando mal dela pelas costas.- De qualquer forma, parabéns pela promoção.
 
- Valeu, bem, logo logo não vou mais ser a chefe, vou ter que conquistar outro andar. - Ela então ri. - Você vai fazer o que?
 
- Sei lá, acho que vou ficar por aqui mesmo, sem você vai ser muito mais fácil de vagabundear.  - Bocejo e quase mordo a lingua com a pancada na cabeça que eu recebi. - É brincadeira... Eu... Estava pensando, sobre a oferta da Capitã Undyne...
 
- Oh... Ah é? - Ela parece um pouco desapontada. - É que eu pelo menos achei que conseguiria te levar junto, tipo meu fotógrafo pessoal ou algo assim.
 
- Bem, eu não decidi ainda, no fim das contas trabalho é um saco não importa onde seja. De qualquer forma a Noelle vai ficar bem orgulhosa de você quando souber da sua promoção.
 
- Sim... Por que não chama todo mundo pra comemorar?
 
- O que quer dizer?
 
- Sabe, você, seu irmão e cunhada, sua namorada, a gente pode fazer algo na minha casa, Noelle e eu, aí vocês só aparecem lá. - Ela dá de ombros e então se senta. - Acho que pode ser uma boa oportunidade pra eu também te agradecer pelo seu esforço, fora que acho que vai ser bom formar um grupo social estável.
 
- Ah, então você só está usando minha família pra fazer amigos.
 
- Cala a boca.
 
Nós rimos, eu fico feliz de conseguir voltar a conversar normalmente com ela, o homem que nós enfrentamos ficou conhecido popularmente como o Bisturí do Ceifador, foi assim que ele saiu na mídia depois do julgamento, parece que desde sempre ele odiou monstros e os matava em segredo, quando o hospital descobriu e o substituiu pelo meu irmão que É um monstro, ele resolver executar uma vingança pessoal, seu nome era Dr Saulo Miletti, e, até onde sabemos, não era ninguém importante até se tornar um assassino em série, espero que apodreça. Mas, se tem algo pelo qual sou grato a ele, é por ter restaurado minha amizade com a Susie.
 
- Tá, beleza, vamos fazer isso, vamos nos encontrar na sua casa. - Foi isso o que eu disse naquela hora...
 
... Mas agora que os dias passaram e o fim de semana chegou, eu estou com tanta preguiça de ter que sair de casa, apesar disso, como eu já combinei com meu irmão e Chara, não tem mais como voltar atrás, fora que a Heleanor se vestiu igual uma e-girl, não é bem meu gosto, mas fica ótimo nela.
 
- Já ouvi chamarem de E-grilo, mas E-aranha é a primeira vez que vejo. - Digo esparramado na cama, ainda não me vesti pra ir, ainda estou de pijama pra se ter noção, uma camiseta branca velha que tenho há milênios e uma calça de moletom manchada de cloro.
 
- Há há. - To achando que essa risada não foi sincera. - Eu só não sei como me vestir, disseram que não era nada formal, mas também não quero parecer que não me preocupei com a aparencia, e você devia se vestir logo também.
 
- Eu me visto rápido, não precisa se preocupar.
 
- Kris, seu conceito de se vestir rápido é TROCAR DE CALÇA, não, EU vou escolher suas roupas. - Eu não sabia que morar com a namorada teria mais regras que morar com minha mãe.
 
No fim acabei usando uma calça jeans colada, uma jaqueta e um cachecol, bem, o inverno está bem no auge, então acho que é o normal, ela realmente escolheu as minhas roupas afinal...
 
A casa de Susie e Noelle não é tão longe da de Heleanor, então acabamos indo a pé, mais uma vez, morar no centro mostrando suas vantagens, faz até parecer que vale a pena, se tudo no centro não fosse o dobro do preço que é no meu bairro eu seria mais feliz, enfim, nós só andamos em silencio e com as mãos dadas.
 
- Ah, vocês chegaram rápido. - Noelle atende a porta sorrindo, nem parece que é influente o suficiente pra mudar o status de alguém que literalmente já fez um genocídio.
 
- A gente mora perto, foi cedo demais? - Pergunto enquanto noto que Heleanor apertou um pouco mais forte a minha mão.
 
- Não não, vamos, podem entrar. - Ela então abre espaço pra gente poder passar.
 
Olho em volta assim que entro, da última vez que vim aqui eu estava preocupado com como faria pra pegar o cara que estava matando os amigos do meu irmão, então não notei muito bem, mas agora eu to percebendo, cara, mas que bando de burguesa safada, por que tem um apartamento tão grande pra só duas pessoas? Só a sala já é do tamanho do lugar que divido com minha namorada, caramba, advogados devem ganhar benzão.
 
- E o resto do pessoal? - Heleanor pergunta quando nota que apenas Susie está na sala sentada assistindo televisão e Noelle que estava nos recebendo estão aqui.
 
- Bem, o Azzy vai vir de carro lá do nosso bairro, então deve levar mais alguns minutos pra eles chegarem. - Respondo, me pergunto como vai ser essa noite, não consigo imaginar esse grupo rindo junto como se estivessemos em FRIENDS ou qualquer série desse tipo. - Eu posso pendurar a minha jaqueta em algum lugar?
 
- Pode sim, tem um suporte na porta, é só deixar aí. - Ela aponta pra um suporte de 4 ganchos na porta de entrada assim que ela se fecha, penduro minha jaqueta ali. - Vamos sentar na sala, assim podemos conversar até seu irmão chegar, o jantar já está pronto, então não precisamos nos preocupar muito.
 
Heleanor não solta a minha mão em momento nenhum, e sempre que eu interajo com Noelle ou Susie ela parece apertar um pouco, não é forte, acho que não é nem mesmo de propósito, mas é algo que notei durante o tempo em que conversamos no sofá, acabamos preferindo comer somente quando todos chegassem, mas, resolvemos pelo menos beber um pouco enquanto conversamos, então eu já dei uns goles em uma taça de vinho, sempre com a cabeça focada em não me descontrolar.
 
- Ah, esse eu acho que temos no bar, é muito popular, né? - Heleanor diz olhando o rótulo na garrafa.
 
- Sim, a gente costuma tomar esse só em ocasiões especiais, não é particularmente caro, mas tem um sabor nostálgico pra gente, né linda? - Noelle pergunta pra Susie que só ri e concorda com a cabeça.
 
- Você deve estar bem orgulhosa. - Digo seguido de um pequeno gole em minha taça.
 
- E estou mesmo, ela é incrivel.
 
- Uwahahahaha, que bom que eles reconheceram o gênio jornalitico que eu sou. - Susie diz e em seguida pega a garrafa de Heleanor e a entorna.
 
- Imagino que você também vai mudar de cargo, né? - Noelle pergunta pra mim.
 
- Não, por que?
 
- Ah, achei que a Susie ia tentar te ajudar com isso, igual quando eles te chamaram pra trabalhar no jorna-
 
- Não precisamos falar disso, já é passado. - Susie interrompe.
 
- Você não contou pra ele? - Noelle pergunta um pouco nervosa olhando pra Susie. - Kris, o jornal te chamou por que a Susie se responsabilizou por você.
 
Eu não digo nada, só olho pra Susie por um momento, Heleanor aperta minha mão um pouco mais forte que o normal.
 
- Acho que ele está bem pra não precisar mais de babá. - Susie diz depois de um tempo.
 
O clima fica um pouco estranho, eu queria poder dizer alguma coisa que animasse as coisas, mas eu não sou muito bom com isso, a campainha toca pra sorte de todos, respiro fundo de alívio, finalmente meu irmão chegou.
 
- Opa, eu atendo. - Respondo enquanto levanto o mais rápido que consigo, surpreendendo Heleanor que sem perceber solta minha mão, eu então ando a passos apressados em direção a porta de entrada.
 
- Por que parece que você escapou da forca? - Azzy me pergunta assim que vê meu rosto.
 
- Deve ter dito alguma coisa que deixou o clima pesado. - Chara responde, ouvir isso da genocída não é bem a maneira mais agradável. - Frisk, dá oi pro seu tio.
 
A menina se escondia atrás da saia da mãe, ela aparecia tímidamente e então acenava a mãozinha.
 
- Passeio de adulto, cara, lembra como a gente odiava isso? - Pergunto pra Asriel, mas ele só dá de ombros enquanto Chara e Frisk entram, ele entra logo em seguida e pendura o paletó ao lado da minha jaqueta.
 
- Não é como se tivesse com quem deixar ela. - Chara diz. - Pensamos em deixar com sua mãe, mas ela não está em casa.
 
Cara, o conselho tutelar deveria considerar encontros chatos de adulto como abuso infantil.
 
Eu estive bem animado durante o jantar, conversamos sobre o novo emprego do Azzy no hospital do nosso bairro natal, sobre a promoção de Susie e falamos até sobre o fato de Chara estar trabalhando na floricultura do papai, mas, de acordo com que os assuntos iam se desenrolando, mais caía a minha ficha, Susie não vai mais ser minha supervisora, ela vai estar ocupada sendo repórter do jornal impresso e vai querer se dedicar pra poder subir de cargo lá. nós raramente teremos tempo de conversar, mesmo que agora consigamos rir como antigamente.
 
Eu acho que deveria me sentir feliz por agora não ter mais ninguém pra gritar comigo no trabalho, mas, isso também me faz sentir solitário, se é que ainda vou ter trabalho depois do barraco que eu fiz com o carinha de trás de mim... Por que eu me sinto tão triste?
 
- Ah, merda... - Noelle diz depois de um tempo, eu olho pra televisão, todos estavam vendo o noticiário. - É óbvio que ia dar bosta.
 
- Não se preocupe... Tenho certeza de que vai ficar tudo bem. - Azzy diz depois de um tempo.
 
Olho pra todos os outros, mas Chara me chama mais a atenção, o olhar dela transborda ódio profundo, não, talvez seja algo mais pra desgosto? Ela tapa os ouvidos de Frisk, tento prestar atenção no que diz o jornal, pra entender o por que de todos estarem tão tensos.
 
"O movimento de humanos anti-monstros ganhou força recentemente depois da morte do Dr Saulo, preso meses atrás pela força polícial de Hometown, uma cidade majoritáriamente de monstros, o médico morreu dentro da prisão, apesar de as insvestigações apontarem para suicídio, os membros do movimento atribuem a culpa ao companheiro de cela monstro.
 
Depois de o grupo ter se manifestado, foi confirmado que o número de humanos a monstros aumentou considerávelmente nas cidades humanas, os monstros enviaram um embaixador para falar com um representante humano, no entanto, o que foi discutido nessa reunião ainda não foi divulgado, lideres de cidades neutras e de monstros não se manifestaram a respeito, mas todos esperam que o assunto se resolva de forma pacífica, afinal todos temem por uma segunda guerra entre humanos e monstros."
 
Nesse momento eu sinto algo entalado na minha garganta, disseram que foi um suicídio, eu não sei dos detalhes mas é o que parece mais plausível, mas... Então porque? Porque sinto que de alguma forma isso foi planejado? Não pode ser... Minha respiração começa a acelerar e eu me sinto um pouco tonto pelo nervosismo... Foi coincidencia ele ter ficado na cela com um monstro? Que tipo de pessoa entende tão bem a mentalidade humana e o funcionamento da sociedade pra conseguir planejar isso? Será que EU fazia parte do plano?
 
NÃO, não... Calma, isso é paranóia, é o tempo que dormi mal me atormentando... Não é possivel, é?
 
Se for tem que ser impedida... Tenho que proteger minha família, de alguma forma...
 
Espero que não aconteça
 
A tal guerra.
 
 
 

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Aug 09, 2022 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Vida Adulta e CompromissosOnde histórias criam vida. Descubra agora