Capítulo 7 - Nattawin

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A maresia chicoteava meu rosto e o vento bagunçava meus cabelos. A areia entre meus dedos fazia cócegas e uma sensação de conforto estava instalada em meu corpo.

— Que mar agitado. — a voz de Mew reverberou contra os meus canais auditivos. Sorri abrindo os olhos.

— Como chegou aqui? — perguntei sorrindo grande.

— Eu sempre estou com você. Você não me vê, mas estou sempre com você. — ele balançou o corpo e botou as mãos no bolso da calça.

— Por quê? — o questionei com tristeza na voz. — Por que escolheu me deixar e me acompanhar quando não posso lhe tocar?

Os olhos e sobrancelhas de Mew se tornaram duros, sem tirar a expressar serena do rosto.

— Não morri por que quis. — disse ele. — Eu não tenho culpa do asfalto estar molhado e do farol alto ter cegado minha visão. Ninguém tem culpa disso.

— Não é justo. — meus olhos pesaram. Sentia a parte de trás dos meus globos oculares arderem. — Cada pedaço de mim sente sua falta todos os dias. Falta do seu carinho. Eu não deveria ter te deixado partir...

— Você tem que me deixar ir. — sua voz era calma, doce, como depois de fazer amor e dizer que me amava veridicamente. — Não vê que está sofrendo?

— Você era a única coisa que eu amava! — exasperei, as lágrimas escorrendo pelo rosto e molhando meu pescoço.

— Se liberte, Fireheart... — sua voz ficou distante, seu rosto se retorceu e ficou turvo. Ele mais uma vez estava indo para longe de mim.

O teto de gesso do meu quarto foi a primeira coisa que vi ao acordar com os olhos ardendo. As lágrimas molhavam minhas orelhas e o travesseiro. Eu estava chorando.

Chorando. Como eu sempre fazia sozinho quando sonhava com ele.

Peguei a toalha de rosto que deixava na mesa de cabeceira e enxuguei os olhos. Não me atreveria a chorar enquanto estivesse acordado e com as rédeas dos meus sentimentos.

— Bom dia, mãe. — eu disse quando me sentei à mesa do café da manhã.

— Sem nenhuma camisa, Nattawin? — repreendeu ela.

Pelo menos eu dei bom dia.

— Desculpe, esqueci hoje. — servi um pouco de mingau na tigela.

— Pelo menos escovou os dentes antes de vir comer? — perguntou ela.

— Já disse tantas vezes que escovar os dentes antes de comer de manhã estraga o gosto da comida pra mim, mãe. — disse a frase que eu tinha decorado desde os quinze anos.

— Seu porco. — resmungou. Contive a vontade de revirar os olhos.

Minha mãe era assim por natureza. Se ela não tinha algo para reclamar de mim, ela procurava. Já tinha acostumado.

— Pode me acompanhar no mercado hoje? — perguntou ela após botar toda a louça suja no lava-louças.

— Que horas? — bocejei.

— Agora.

¥•¥

Minha mãe decidia entre o arroz integral e o normal quando senti dois bracinhos rodearem minhas pernas.

— Tio Nattawin! — olhei para baixo. Aisha, a pequena menina que ajudei outro dia em seu trabalho de último dia de aula, me olhava com os olhos brilhando.

— Oi, pequena Aisha. — me abaixei para ficar na altura dela. — Como você está?

— Tô bem, e você? — perguntou de volta com uma educação de aquecer o peito.

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