Adele deixou a princesa na enfermaria, e depois foi para o portão.
— Querem que saiamos hoje à noite. Vão fazer uma distração para que nossa saída não seja notada.
— Uma distração? — Questionou Sela, que estava terminando de arrumar sua bolsa, presa ao próprio ombro.
— Quer que eu carregue suas coisas, Sela? — Perguntou William, que estava logo atrás dela, carregando uma bolsa de couro adornada.
— Você não vai levar essa coisa por aí — disse Adele — Não sei se parou para pensar nisso, mas uma bolsa com adornos de ouro vai chamar atenção.
— Ah, claro, vou trocar a bolsa.
Então o príncipe subiu as escadas. Adele se demonstrou preocupada.
— Ele vai matar a gente lá fora, né?
Sela riu.
— É provável. Mas eu sei fazer manobras de ressuscitação. Vamos ficar bem.
— Ótimo, vou fazer questão de ter um ataque cardíaco pra testar se você sabe mesmo.
— Por favor, não.
Hark estava pronto, aguardando as duas. Adele tinha contatado ele de alguma forma. Ele não parecia muito feliz. Estava sentado no galho mais alto de uma árvore, próximo a entrada do castelo, fazendo malabarismo com uma porção de carteiras de nobres e até de alguns guardas.
Quando William voltou, notou que havia uma enorme força militar saindo dos quartéis em direção a cidade.
— Me falaram que vão caçar rebeldes querendo derrubar o trono — disse William.
— Assim que o caos começar, nós saímos. — completou Adele.
Adele notou que alguém segurou sua mão direita, o que a deixou desconfortável.
— Vou segurar na sua mão, se importa, Adele? É difícil me guiar na gritaria. — disse Sela.
— Me importo. Só faça quando necessário.
— Como você é chata! — gritou Hark do alto da árvore, jogando moedas de prata em Adele.
Então o caos começou. Gritos desesperados, lojas sendo saqueadas em meio ao caos, casas sendo invadidas, roubos, todo tipo de coisa.
— Espero que sobre algo da minha casa quando voltarmos — comentou Adele.
Hark desceu da árvore, e foi na frente, chamando-os para acompanhá-lo. Como ladrão, ele sabia onde passar sem ser percebido. Todos estavam usando mantos com capuzes cinzas para não serem reconhecidos.
Em cerca de cinco minutos estavam no esgoto, depois no que pareciam passagens secretas que nem mesmo William conhecia, que iam desde o castelo até os rios que cercavam a cidade.
A assassina fez questão de soltar a mão de Sela quando saíram da multidão. A cega passou a se guiar com os passos de Maso, que ia à frente, cheirando tudo e espirrando pelo fedor do esgoto.
Adele quase não conseguia manter os olhos abertos quando saíram do túnel, depois de passar tanto tempo naquele breu. Estavam na frente de um barco simples que mais parecia uma balça.
Subiram e navegaram até o porto comercial de Arge, que marca o final do território de Argoria.
— Vamos evitar as estradas dos comerciantes. Tem todo tipo de coisa lá: assaltantes, sequestradores, patrulhas inimigas, monstros... Vamos seguir por dentro da floresta, a noroeste. É para lá que fica a senhora das ninfas.
— Tem certeza que isso vai dar certo? — Questionou William.
— Entendo que pareça uma péssima ideia ir até uma floresta tão longe numa região tão perigosa, mas é nossa melhor aposta.
— Então vamos.
Maso era mais útil do que Adele imaginava de que ele seria. Conforme andavam, Sela explicava para todos como funcionava a comunicação entre ela e Maso. Até que o cão parou e olhou para esquerda. Deu um leve rosnado e correu para dentro do mato.
Hark, que era mais ligeiro, o seguiu pela mata, e voltou pouco tempo depois.
— Um acampamento. Eles usavam a águia dourada nos mantos.
— Assassinos do Renmar. — disse Adele.
— Sim. — respondeu o garoto.
— Não temos que nos preocupar, certo? — disse William — Você trabalha pra ele.
— Trabalhava — corrigiu a assassina. — Muita... Muita gente quer se vingar de mim. E Renmar sabe que quero matar ele quando eu for livre. É uma das primeiras coisas que vou fazer. Ou seja...
— Você vale dinheiro para ele, e é um alvo que seria vantajoso eliminar, já que vai atrás dele. — Completou Sela.
— O que a gente faz se os assassinos vierem? — Questionou o príncipe.
— Eles não vão. — Adele fez um sinal para Hark — Vamos, pelos velhos tempos.
O ladrão suspirou como quem reclamava, mas sabia que não tinha escolha. Então os dois saíram na direção de onde estava o acampamento.
Assim que Sela parou de escutar seus passos, sentiu uma adaga em seu pescoço.
— Adele, Adele... A arrogância dela é a maior fraqueza. Torna-a previsível. — disse uma voz masculina, que segurava a adaga.
— Você... — exclamava Sela, com a garganta pressionada — você não fez som nenhum.
— Magia sonora. Esse é o meu trunfo.
— Entendi — disse Sela. — Mas você tem um cheiro bem forte.
Maso subitamente salta de um arbusto diretamente na virilha do assassino, que solta o pescoço da cega, gritando de dor.
Ela podia não enxergar, mas anos numa família de mulheres guerreiras a fez ter um bom gancho de direita. Sela deu um golpe tão bem dado na cabeça do homem que o cérebro dele deve ter quicado no crânio. O assassino cambaleou só por um segundo. William, até então estava só observando, assustado com a estatura do homem, que parecia ter quase dois metros de altura.
Então o assassino pegou Maso com uma das mãos e o jogou longe, o que era, considerando que o cão pesava cerca de 40 quilos, um grande feito.
Sela estremeceu.
— Maso? Você está bem? Maso?
Então sentiu um baque. O mundo girou, e ela caiu com o queixo contra o chão com muita força. Foi como se tivessem arrancado seu nariz sem que ele saísse do lugar. Tinha tanto líquido, tinha tanto sangue nele que foi obrigada a respirar pela boca. Ardia muito, mas estava distraída demais com o medo para se importar.
William queria agir. Mas estava paralisado pelo medo. Bastava um movimento errado e aquele homem o mataria. Era treinado para isso.
Quase como se ouvindo seus pensamentos, Sela disse:
— Ele não quer nos matar ainda... Somos as iscas para a Adele. A única vantagem dele. Numa luta justa, ela o venceria.
Então o assassino pisou nela.
— Você fala demais, garotinha.
Sela gemia de dor, e tentava se rastejar para longe dele. Aquela cena era horrível. William queria não estar ali. Mas estava. Precisava agir, ou o assassino conseguiria o que queria.
Ele não tinha controle sobre a própria magia. Mas era o único jeito agora. Deixou o formigamento da nuca fluir, a mana atravessar o corpo todo, e liberou tudo na direção do homem.
Quando Adele voltou, suja de sangue e com um corte superficial no braço direito, viu um homem totalmente congelado. Sela estava tremendo, molhada, e com algumas partes do corpo ainda com gelo em derretimento. Maso a lambia enquanto ficava em seu colo, tentando aquecê-la.
— O que você fez? — perguntou a assassina.
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Castelo de Cores
FantasySela Wisllow é uma garota cega nascida numa família de nobres mulheres guerreiras do norte, que a rejeitam por sua fraqueza. Ela é enviada a capital para aprender a ser curandeira, e quando finalmente se torna renomada na área, é chamada pelo rei pa...