Adeus sem despedidas

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Lá estava eu, sentado na mesma cadeira que usei durante toda a minha gestação com a minha filha recém-nascida, de apenas duas semanas

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Lá estava eu, sentado na mesma cadeira que usei durante toda a minha gestação com a minha filha recém-nascida, de apenas duas semanas. Dona Miller estava do lado de fora da porta do berçário, olhando para o quarto suavemente iluminado.

Eu estava embalando o bebê perto de meu peito, cantarolando baixinho, olhos suaves enquanto a observava dormir, hipnotizado por seu rostinho. Ela era absolutamente linda, com grandes olhos escuros, nariz minúsculo e uma bochecha adorável. Perfeita, era isso que ela era.

Dona Mille ficou um bom tempo na porta, apenas observando eu e minha filha, não querendo atrapalhar aquele momento de paz, a luz que entrava pela janela, a adoração em seus olhos, o leve doce aroma leitoso que enchia o berçário, e a maneira angelical como Hope parecia adormecida em meus braços.

Abrindo a porta suavemente, Dona Miller desviou minha atenção de Hope. Eu observei a senhora caminhando cuidadosamente enquanto abria a porta do berçário, fechando-a silenciosamente atrás dela.

Caminhando até onde eu estou, Dona Miller se inclina seu corpo, aninhando-se na bengala enquanto olhava para Hope em meus braços.

— Stiles, f-fiiiilho vamos comer, você está a manhã toda aqui — chamou suave e baixo.

Eu assenti, murmurando ainda a canção de ninar para Hope. A bebê estava profundamente adormecida, ocasionalmente se mexendo em meu colo, segurando meus dedinhos, aconchegado perto de meu peito.

— Ela é tão pequenininha — murmurei, me levantando devagar e a colocando no berço, a cobrindo logo em seguida com sua mantinha.

— Ela é um anjo — Dona Miller sorriu.

— É — concordei, estalando um beijo nas bochecha gordinhas de Hope.

Então, eu segui a senhora para fora do cômodo, apagando a luz do quarto antes de encostar a porta com cuidado.
...............

Cinco meses depois.

Desde que Hope completou 5 meses, eu estou tentando fazê-la falar. Mesmo quando a senhora Miller tentou explicar que a maioria dos bebês nem dizia palavras até os 12 meses, o que certamente eu ignorei totalmente.

Mesmos assim, ela achava engraçado enquanto me observava tentar, eu era insistente, em todas as oportunidades eu arrumava palavras e tentava fazer Hope repeti-las, obviamente todas as vezes foram um fracasso.

Eu estava alimentando Hope, fazendo barulhos de avião enquanto colocava sua sopinha de arroz com legumes na boca dela.

— Gostoso. Você pode dizer gostoso, Hope? —

Senhora Miller sorriu de seu assento em sua cadeira de balanço costumeira, ela estava tricotando outra roupinha para Hope, suas linhas de tricô estava espalhadas por toda sala.

— Paaaare de teeeentar fazê-la dizer palavras bobas. Ensine-a a dddddizer algo legal, como chamar papaaaaaiii —

— Vou ensinar ela a dizer Batman — brinco, sorrindo com a careta que a velha fez.

— V-você é um oooótimo pai — Senhora Miller disse, voltando sua atenção para a roupinha quase finalizada

Eu posso ver pelo canto dos olhos que ela está cansada.

Senhora Miller não respirava completamente sozinha mais, a algumas semanas ela começou a usar um tubo de oxigênio para seus pulmões não se cansarem tanto como antes.

Ela também tem perdido bastante o apetite, seus remédios para memória também não fazem muito efeitos como deveriam. A alguns dias ela começou a me chamar de Charles. As vezes ela também se esquece de coisas importantes, como o dia, ou o ano em que estamos.

Eu sei que infelizmente ela está aos poucos partindo desse mundo, e por mais doloroso que é vê-la indo embora, eu compreendo. Tudo o que ela precisa agora é de descanso, ela já passou por tanta coisa, o cansaço em seus olhos é tão profundo. Suas rugas em seu rosto são lembranças de um tempo que não vai voltar, a aliança velha em seu dedo é a memória de quem já partiu.

Dona Miller não demonstra, porém eu sei que ela não aguenta mais ficar aqui.

— Charles — ela me chama de repente.

Sua voz é tão fina e baixa, quase não posso ouvi-la.

Eu a encaro, seus olhos em mim são tão calorosos .

— Quero ir para casa — ela me pediu tom doloroso.

Lágrimas escorrendo de seu rosto como se tivesse se perdido em memórias.

Eu engoli em seco, ela nunca me pediu para ir.

— Senhora Miller — murmurei, o nó em minha garganta me esmaga. Ela não me encara, sua cabeça está aos poucos caindo para trás.

Sua respiração quase inexistente vai aos poucos se acalmando, a blusa de tricô que segurava em suas mãos vai caindo lentamente de seu aperto.

A primeira lágrima cai em meu rosto antes que eu posso notar, de repente não consigo sair do lugar.

— Vovó — a pequena esperança disse. Sua voz ainda embola na língua.

Ela então ri, suas mãos minúsculas está esticadas na direção da mulher sem vida do outro lado da sala.

— Sim, meu amor. Vovó — chorei, pegando a bebê do andador e tirando seu babador.

Hope ergue seus bracinhos gordinhos, ela se agara em mim, seu sorriso é tão adorável, ela me olha com seus olhos de corça.

Eu enterro meu rosto no pescoço da bebê e choro, as lágrimas caindo sem cerimônias, o soluço baixo enquanto Hope continua repetindo a nova palavra que aprendeu.

Me deixe ficar ( Stlaus )Onde histórias criam vida. Descubra agora