Trabalhando duro

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No dia seguinte Jay acorda cedo e se arruma para ir para o trabalho. Ainda estava escuro pois, além dele ter que entrar bem cedo no serviço, tinha que atravessar quase todo o Bronx para chegar lá, e como ia cortando caminho para não ser assaltado ou atacado na rua levava ainda mais tempo. Ao chegar lá ele cumprimenta o dono, que logo passa algumas atividades para ele.
Jay tinha que manter o lugar em ordem e repor as mercadorias, mas antes disso precisava ajudar a limpar a loja. Após isso ele tinha de abrir algumas caixas de produtos e organizá-los corretamente nas prateleiras; ao terminar eles abriam a loja e começavam a trabalhar. Todo esse trabalho antes de abrir a loja não seria debitado em seu pagamento, portanto duas horas, praticamente, ele teria de trabalhar de graça, mas não podia reclamar. Já havia sido difícil de conseguir aquele emprego, portanto se o perdesse teria que ralar para encontrar outro. Sem contar que sua mãe havia ficado muito feliz por ele finalmente ter arrumado um trabalho e assumido a responsabilidade de ajudar em casa. Então mesmo que não gostasse de estar ali tinha que aguentar e se esforçar para manter o emprego.

Jay era muito inexperiente já que nunca havia trabalhado antes, e para seu azar o dono era muito rabugento e não explicava as coisas para ele direito e as vezes até o tratava com ignorância na frente dos clientes. Jay precisava ser paciente pois precisava do serviço, portanto abaixava a cabeça e engolia os desaforos calado. Seu primeiro dia pareceu durar uma eternidade, e quando o dono finalmente disse que iam fechar, ele respirou aliviado. Porém só chegaria em casa duas horas depois, pois tinha algumas coisas para fazer antes de sair. Poderia muito bem receber a ajuda do velho mas ele estava muito ocupado contando o dinheiro e "fazendo ligações importantes", ou qualquer outra coisa que pudesse ser feita depois.

Enquanto voltava pra casa, Jay vê um tiroteio cruzado começar em sua frente e então sai correndo por outro caminho, que faz sua volta pra casa ficar ainda mais longa. Ao finalmente chegar em casa ele sobe as escadas e se joga exausto na cama. Sua mãe aparece fazendo perguntas sobre seu primeiro dia mas ele estava tão cansado que não consegue responder e então deita no travesseiro e apaga, sem nem tirar o tênis e muito menos jantar. Ela entende seu cansaço e o deixa dormir em paz.
Ao deitar, Jay sente sua mente quase explodindo e podia até ouvir a voz de seu chefe ecoando na sua cabeça, lhe dando ordens atrás de ordens com toda a ignorância. Sua cabeça doía muito, e pensar que no dia seguinte teria que passar por tudo aquilo de novo o deixava ainda mais agoniado.

Três dias se passam mas parecia que havia se passado uma vida; Jay não aguentava mais aquela rotina. Já havia sido assaltado e perseguido várias vezes durante o trajeto para o serviço, e uma noite enquanto fechavam a loja, quatro homens armados apareceram e levaram todo o dinheiro. Estava difícil suportar tudo aquilo. E além disso Jay não tinha benefício nenhum; quase não tinha liberade também. Seu chefe exigia tanto dele que o liberava apenas 15 minutos durante o dia para comer alguma coisa, e Jay ainda precisava ir atrás do que comer. Essa rotina estava acabando com seu psicológico, mas sempre que pensava em pedir as contas ele se lembrava de sua mãe, das contas atrasadas, e então se conformava e continuava a trabalhar. Naquela tarde, enquanto limpava as prateleiras, Jeff entra pela porta e ao vê-lo logo o cumprimenta.

-E aí Jay, meu mano!

Jay fica surpreso ao vê-lo ali e acaba ficando sem reação.

-Jeff? O que... O que está fazendo aqui? -Diz Jay gaguejando, constrangido por ser visto naquela situação.
-Eu vim ver como o meu parceiro do peito está -diz Jeff com aquele seu jeito empolgado, e então logo na sequência ironiza- Belo chapéu, inclusive.

Além de ter que passar por todas aquelas situações, Jay ainda tinha que usar aquele uniforme horrível, com um chapéu que mais parecia um chapéu de marinheiro.

-Como sabia que eu estava trabalhando aqui? -indaga Jay enquanto descia da escada.
-Ah, Jaaay, eu tenho olhos por todos os lugares, parceiro. Nada acontece nas ruas sem que eu saiba -diz Jeff se sentindo o tal- E outra, eu sempre sei onde meus manos estão.

Jay estranha o jeito que Jeff estava o tratando e desconfia que ele tinha algo a dizer.

-Tá bom, agora que você já me viu aqui nessa situação, já zuou meu uniforme e já viu como eu estou fala logo o que você quer?
-Nossa, que jeito de tratar seu parceiro.
-Eu estou trabalhando, não tenho tempo pra jogar conversa fora.
-Não seja por isso -diz Jeff pegando uma lata de milho qualquer na prateleira e indo até o caixa. Jay revira os olhos.
-Corta essa e fala logo o que você quer?
-Eu só quero trocar uma ideia com você sobre uma parada, cara.
-Eu não posso parar agora, Jeff, se meu chefe me ver enrolando ele me manda pro olho da rua, aí eu tô fodido pra arrumar outro trampo -diz Jay em tom meio baixo para seu chefe não ouvir.
-Mas é importante, cara. E vai ser rápido, eu prometo -diz Jeff quase implorando.

Jay olha para a porta dos fundos e pensa seriamente se arriscaria ou não. Seu chefe estava nos fundos resolvendo algumas coisas mas já estava para voltar. Mas Jay estava muito intrigado com o que Jeff tinha a dizer e então decide ouvi-lo.

-Só cinco minutos -diz ele tirando seu chapéu e indo até o lado de fora com Jeff.

Ao chegar lá ele coloca as mãos na cintura, como sua mãe costumava fazer quando estava indignada com algo, e pergunta o que ele tinha de tão importante para dizer.

-Olha, eu vou ser direto pra não tomar muito seu tempo -diz Jeff fazendo sinal de calma com as mãos- Então, como você sabe amanhã meu mano Phill tinha um show marcado, certo?
-Hum -diz Jay cruzando os braços e murmurando como quem só desse continuidade ao assunto.
-Bom, houve um pequeno problema. Ele acabou se envolvendo com umas paradas erradas e a polícia descobriu e pegou ele ontem. Eu suponho que vai ficar um bom tempo fora. Uma pena...

Jay fica olhando para Jeff por alguns segundos, como se esperasse ele continuar.

-Tá, e daí? -diz ele dando de ombros.
-Como "e daí", cara?! Eu tenho um show marcado pra amanhã sem a atração principal. E muita gente já confirmou presença. Eu não posso simplesmente desmarcar assim. Eu vou perder toda a minha credibilidade se eu fizer isso. E outra, muitas pessoas já pagaram, então se eu cancelar vou ter que devolver o dinheiro, e eu não posso fazer isso.
-E o que você tem em mente? -indaga Jay curioso com o rumo daquela conversa.
-Bom, eu pensei que talvez você pudesse me ajudar.
-Eu? E como é que eu poderia te ajudar? -Diz Jay abrindo os braços e apontando com a cabeça para a loja atrás dele- Olha só pra mim.
-Estou olhando, e como já te disso a única coisa que vejo é um super talento sendo desperdiçado, jogado no lixo. Mas você pode mudar isso amanhã. Olha só, eu não posso cancelar o show, mas não tenho o que apresentar para o público. Então eu pensei em mudar o evento e colocar você no palco?
-Eu no palco? Mas que tipo de evento seria esse? -Diz Jay cada vez mais intrigado.
-Eu pensei em fazer uma batalha de rimas.
-Eu já te disse, cara, eu parei com as batalhas -exclama Jay, dando ênfase em sua frase.
-Eu sei, eu sei. Mas eu preciso muito da sua ajuda, cara. Eu vou tentar levar outros caras para rimarem lá também mas com você lá em cima a galera vai a loucura. Você seria a atração principal.
-Olha Jeff, mesmo que eu quisesse te ajudar eu não posso. Amanhã a noite eu vou estar preso aqui rasgando caixas e jogando o lixo na calçada da loja da frente.
-Eu pensei que estaria ocupado mesmo. Aqui, pega isso -diz Jeff entregando 50 dólares na mão de Jay.
-O que é isso? -indaga ele, se assustando com a nota.
-Pra me ajudar você teria que sair mais cedo, o que acabaria sendo descontado do seu pagamento. Então aí está uma grana pra compensar. Isso aí provavelmente deve valer mais que o dobro do seu dia mas tudo bem. E detalhe, se você for amanhã eu coloco mais dessas aí no seu bolso.

Jay intercala o olhar entre Jeff e a nota de 50 dólares. Jeff percebe em seu semblante que estava confuso e indeciso e não sabia qual decisão tomar.

-Não sei nao, cara... -diz Jay sem saber o que dizer; seu semblante agora mostrava preocupação.
-Olha, vamos fazer assim, eu vou deixar você pensando e então quando decidir você me dá um toque. Aqui, pega meu número -diz Jeff dando um papel com seu número para Jay- Bom, era isso. Agora vou deixar você voltar pro seu serviço. E Jay, de verdade, parceiro, pensa bem... Essa pode ser uma oportunidade única pra você mudar sua vida e obter o sucesso que tanto deseja. Então pensa bem, cara...

Jay assente com a cabeça porém não consegue dizer nada; fica lá parado com o semblante confuso e preocupado. Jeff então se despede dele e vai embora em seu Cadillac. Jay aprecia a nota de 50 dólares por alguns segundos até que ouve um barulho do lado de dentro. Ele então enfia a nota no bolso, coloca o chapéu na cabeça novamente e volta rapidamente para dentro da loja para continuar seu serviço.

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