O atendimento hospitalar pareceu demorado demais a Thomaz. Precisava, apenas, que fizessem alguns pontos nas suas costas, onde Otávio lhe cortou com um caco de vidro. Mas houve toda uma consulta prévia. Além disso, a enfermeira que lhe atendeu parecia agir de forma muito lenta, cada ponto da sutura levava uma eternidade. Irritado, quando, enfim, foi liberado e saiu pelo hospital à procura de informações sobre Sarah, foi interrompido por um policial, que queria colher seu depoimento.
- Precisa ser agora? – Ele questionou.
- Este primeiro, sim. Depois, o senhor será convocado a ir à delegacia para uma declaração oficial.
Antes de atender ao policial, conversou com Dante. Como o advogado também estava envolvido naquela cena criminal, que culminou com um homem morto além de dois feridos, ele não podia agir como representante legal, apenas como testemunha.
- Eu lhe indicarei outro advogado, não se preocupe. O importante é hoje você não dar detalhe algum. Primeiro nós temos que nos inteirarmos sobre o caso. – Dante lhe orientou.
- Você então me sugere mentir para a polícia?
- Não, apenas omitir alguns fatos. – O advogado jogava com as palavras para convencer o cliente. – Sarah está viva e o agressor morto. Isso é ótimo! Ninguém precisa saber que nós somos responsáveis por colocar aquele homem lá e isso só serviria para sujar a imagem da Monteiro. Você acha que Sarah ficará feliz se você revelar à polícia que ela sofreu uma tentativa de assassinato pelo homem que abusou dela na adolescência?
Nem mesmo o cansaço, os remédios recebidos ou a pressão que vivia naquele momento levaram Thomaz a deixar passar aquela informação. A fala do advogado fazia todo sentido diante do que havia descoberto sobre a relação de Sarah e Otávio e também com a forma doentia como o homem reagiu ao reencontrá-la. Mas a afirmação de Dante lhe surpreendeu. Ele não tinha informação alguma sobre Sarah ter sido abusada na adolescência.
- O que você disse? Desde quanto você sabe disso? – Ele partiu para cima do advogado.
- Menos tempo do que eu gostaria. – Dante esclareceu. – Diante do que vimos mais cedo, enquanto faziam a sutura do seu ferimento, liguei para Ramón e pedi que ele me adiantasse algumas partes do relatório. Você não vai gostar nada do que lerá lá. Ela teve razões muito fortes para fugir.
- E Ramón, sabendo disso, o coloca dentro da casa dela? Com a sua ajuda? Com a nossa ajuda? – A culpa o rasgava por dentro. Não estranharia se Sarah jamais o perdoasse.
- Você está certo, Thomaz. Eu errei em confiar em Ramón e não foi ética a forma como agi no prédio de Sarah, hoje. Me desculparei com ela, assim que estiver bem. Mas sujar o nome da Monteiro, acabar com a minha carreira, arriscar você ser preso e expor a intimidade de Sarah não irá apagar o erro.
Mesmo descontente, Thomaz concordou com Dante. Além de seu advogado, ele era seu amigo dos tempos de colégio. Mantiveram uma relação distante desde que ele foi morar na Holanda, mas, confiava nele. Acreditava que, assim como ele, o amigo fora surpreendido por uma situação muito mais grave do que imaginavam. Ninguém poderia saber que estavam diante de um monstro como Otávio.
- Está bem, Dante. Mas depois que Ramón entregar esse relatório, não lhe solicite mais nada. Nossa relação termina aqui. – Ele estava exausto com tudo aquilo. – Me envie esse relatório assim que o tiver. Vou dar esse depoimento logo e tentar ver Sarah. Falamos mais tarde.
O relato que fez à polícia foi bastante simples. Escolheu bem as palavras e deixou claro que quem poderia esclarecer o que tinha ocorrido, e os culpados, seria Sarah, quando ela estivesse bem o suficiente para falar. Se quisesse, ela poderia deixá-lo com sérios problemas com a lei.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Fugindo do destino: eles escolheram outras vidas
RomanceAo completar 18 anos, Sarah Melnik da Silva foge do Brasil em busca de liberdade. Quando uma tragédia lhe oferece possibilidades nunca antes sonhadas, ela se transforma em uma nova mulher. Cerca de 10 anos depois, vivendo em Portugal, a antiga Sa...