Capítulo 9-Adeus, Catarina(conclusão)

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Ha... Como assim adeus?
Sabia que não deveria ter adiado bastante aquela conversa..
Catarina é bastante doida segundo meus parâmetros, mas, quero crer que não o suficiente para escrever uma carta suicida e fazer de mensageiro um técnico de saúde? Céus! Um doutor..!
Mas hmmm esses tipos andam todos metidos em eutanásias.. quem sabe se é totalmente fora de cogitação.
Por alguns minutos, para me distrair do fato de ter que ler a carta, fiquei ainda pensando sobre ética deontológica, eutanásias e todas essas coisas. Sim, ao longo desse tempo todo desde que conheci Catarina, andei lendo e estudando uma e outra coisa. Essa coisa de filosofia não é má... Mas hmmm.. já me decidi. Resolvo as coisas aqui e vou viver com minha avó e minha mãe..

Uff... São exatamente 10h e 17min. Dentro de alguns instantes tudo terá mudado. Para melhor ou para pior, mas terá mudado.
Cada segundo que se faz passar pelo tempo, sinto-o carregando toda a eternidade de uma deidade. Acho que a vida é exatamente isso. A vida são esses segundos que se fazem passar de insignificantes, tão infinitesimais e finitos, mas escondem dentro de si o segredo de todas as coisas.
E aqui, vendo literalmente os segundos feitos minutos transformarem-se em génesis e apocalipses de minha vida, a carta continua no chão. Preciso arrumar coragem e acabar logo com isso. Que seja o que for.

"Agh... Olá Osvaldo. Espero que não tenhas de receber esta carta. Porque se o receberes, significa que não estou mais por perto, e não tive a chance de me despedir apropriadamente.
Mas infelizmente nem todas as coisas são como planejamos. Na verdade, na grande maioria das vezes as coisas não são como planejamos.
Enfim.. Olá, como estás?
Ha.. continuas sendo um tonto mesmo após todo esse tempo. Okay .. vamos lá.. coragem Catarina..

Não sei exatamente como deveria escrever.. nem exatamente o que escrever. Mas okay... Vou fingir que os teus ouvidos estão aqui junto de mim.. que tu estás aqui nesse quarto, segurando minha mão.
Vou contar-te a versão resumida dos fatos.

Sim.. sou eu.. a "menina Silvana".. kk e se eu te contasse que só vim à capital na vã esperança de encontrar-te?
E logo que cheguei, fui ao supermercado comprar algumas coisas e conhecer as redondezas..  eu sabia que era bastante patético e parvo.. a única coisa que eu sabia a teu respeito, era o apelido "Vavá" e o sabor dos teus lábios infantis. É bem doido. Mas.. ainda lembro daquele dia, e do gosto que teve.
E se eu te contasse que foste o meu primeiro e único beijo? Acreditavas?
Por algumas situações, raramente saía de casa.. e quando saí naquele dia, fomos exatamente para a fazenda Siqueira. Eu era criança. Então não lembro exatamente de como tudo aconteceu.. mas lembro do pôr do sol, vanos e tu. Seu malvado! Apareces aqui do nada, invades minha mente e somes?
Nunca te irei perdoar. Eu teria vivido minha vida no campo feliz e aproveitado inocentemente.
Mas o que quer que fizesse, lembrava de ti. E quanto mais crescia, mais ardia esse sentimento e eu procurava por ti entre as noturnas de Chopin e baladas de Beethoven. Entre as ilíadas, epopeias e Odisseias, procurava por ti. Mas ainda assim, não importava o que fizesse, não te achava. O mais engraçado é que de tanto procurar-te, esqueci-me de que te procurava.
E perdi-me entre troféus de recitais e prêmios de honra na escola. Perdi-me em todo tipo de conquista.. enchi minhas estantes mas nunca o coração..! Esqueci-me de ti. Mas o meu corpo não. E ele definitivamente me lembrava que existia uma felicidade escondida nalgum lugar do mundo.
Eu era muito criança para tantos sentimentos na época, mas com o tempo fui percebendo que era amor.
Como é suposto amar alguém que só vimos uma vez?
É porque eras tão livre?
Porque eras tão ousado e simpático? Não sei... Só sei que sabia que teria de te reencontrar. Mas nunca dei tanta importância. Não até receber os resultados dos exames na clínica particular da minha família.. sabe, depois que 2 gerações de mulheres morreram de diabetes, esforços foram realizados no sentido de tal calamidade não assolar mais a minha família. A diabete que temos não é comum. Por isso vários hospitais mesmo dentre os da capital, pelo que ouvi, não conseguem identificar se não souberem exatamente o que estão a procura.
Aos 16 fui diagnosticada. Não era tão severo mas também não se podia levar de forma leviana. Iniciei logo o tratamento. E isso intensificou mais a vontade de reencontrar-te.. então não imaginas minha alegria ao rever-te naquela calçada. Não foi só o caminhão que disparou à mil. Meu coração também. Aiiii minhas mãos tocaram-te!
Logo que vi-te reconheci-te. Mas quando tu não o fizeste, percebi que era possível que eu não tivesse significado nada para ti. Isso acabou comigo. Mas não me importava.. amava-te tanto que já não importava o que tu sentias por mim... Era o que eu queria acreditar..
Como se não bastasse minha doença em estágio terminal e azar no amor, ainda perdi um braço e fui barrada de praticar piano. Como era suposto desabafar agora? Agh... Mas não o imaginas a felicidade que senti quando vieste ver-me, quando trocamos mensagens e me chamaste para sair..!E ainda falaste da senhorita Vanos!!?? Waaaa não quis acreditar. Era como se várias portas tivessem se fechado mas em contrapartida, uma janela do tamanho do universo se tivesse aberto..!! Tu ainda lembravas de mim??
Senti-me completamente realizada. Já podia partir em paz.. mas não queria arrastar-te para mais um luto.
Reencontrar um amor para depois perdê-lo?
Ninguém merece.
Por isso fiquei feliz quando adiamos a conversa e quando não me vieste ver. Espero que nunca chegues a ler essa carta.. bom esse textão.. kkk ainda assim, uma parte de mim deseja que o faças.. então.. para ti, meu primeiro e último beijo, meu primeiro e último amor, desejo tudo de bom.!! Espero poder reencontrar-te de alguma forma... Amo-te por todas eternidades...
Adeus, Catarina."

Adeus, Catarina.Onde histórias criam vida. Descubra agora