~01~

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Merlia

- Você está pronta? _ Gideon pergunta entusiasmado, com seus olhos verdes brilhando.

Aceno convicta, com um sorriso tolo ameaçando surgir em meus lábios, enquanto algumas das serviçais terminavam de lavar meus pés e enxuga-los com extremo cuidado.

Meu irmão me pegou no colo com facilidade, carregando-me até a grande bacia de madeira. Meus olhos cruzaram os de meu pai sentado de baixo de uma tenda com conforto. Seu semblante tão sereno ao assistir minhas irmãs já pisando nas uvas com sorrisos tão largos, trazia ainda mais serenidade ao momento, junto da boa música tocada por menestréis.

- Pise nessas uvas com tudo que tem, Merlia! Venderei um barril desse vinho a quem der o mais lance! _ Gideon comentou, e gargalhou de sua própria ideia.

Agarrei o tecido de meu vestido, enquanto pisoteava as uvas. Ri como uma criança enquanto sentia a sensação do fruto em minhas solas dos pés, causando-me cócegas e leve agonia. As uvas estavam tão bonitas esse ano, que certamente seria um dos melhores vinhos na adega de meu pai.

Papai sempre decretou que festivais e comemorações fossem feitas em nome de uma pessoa especial para ele, ou algo que o significou muito. E nesse mesmo dia, as vezes se passava um brilho triste nos olhos de meus pais e tio Nicolas.

E aos meus olhos, eu não via papai com aquela aparência cansada e seus cabelos já bem grisalhos. Para mim, a imagem dele, sempre seria a de um homem forte, jovem e protetor. Mesmo sendo pequena na época, nunca me esqueci da primeira vez que fomos à Midorina, e conhecemos totalmente o lado amigável e despreocupado de meu pai. Foi a primeira e única vez, que ele deixou de ser rei por completo para se divertir com nós.

Minhas irmãs começaram uma canção, sapateando e rodopiando enquanto se fazia a pisa das uvas. Savanah, minha cunhada, havia se juntado a nós, assim como a esposa de Gideon.

De soslaio, observei o momento em que Kaya se aproximou de meu pai, com seus cabelos loiros prateado escorrendo para frente de sua armadura dourada, quando se curvou brevemente em reverência e aproveitando o jesto para gesticular alguma informação. Meu sorriso começou a desmanchar quando vi a careta de meu pai. Careta esta que, observei por muitos anos, cada vez que um pretendente chegava ao castelo para nos cortejar.

Eu era a última filha a ter que se casar em breve. Joseph, meu irmão mais novo, tinha 17 anos, e ninguém ouviu planos de casamento para ele até então.

Mas meu sorriso terminou de morrer em meu rosto, quando a figura alta e forte, com um sorriso cheio de si, se apresentou no ambiente. Aquele cretino, trapaceiro, filho de uma meretriz...

Não tenho nada contra padrinho Lucien, mas acho que ele poderia ter jogado Noah para o mar na primeira oportunidade, antes de ter criado um ser tão arrogante e desprezível.

- Seu noivo chegou..._ Joseph cantarolou bem perto de minha bacia. Me fazendo torcer a cara e voltar minha atenção para as uvas sob meus pés.

Agora, os pobres frutos, era esmagados com tanta raiva, que provavelmente este séria o barril de vinho mais amargo que meu pai experimentará em toda a vida.

Ergui brevemente meus olhos ao sentir olhares sorrateiros em mim. Meus irmãos me provocavam de forma silenciosa, cientes de minha antiga briga com Noah.

Aquele trapaceiro miserável roubou minha caça bem de baixo do meu nariz, e apresentou ao meu pai como se fosse dele. Lembro que eu ja tinha 14 anos e ele 16, e quando Noah se apresentou como vitorioso, todos olharam para meu pai, esperando que o príncipe herdeiro de Midorina dissesse que já me tornaria sua esposa. Certamente papai o deceparia o pescoço se tivesse sido isso, mas o rato Midoriano pediu o melhor barril de vinho da adega, e o bebeu com seus irmãos sempre me encarando, como dissesse: " tola..."

Casamento ArranjadoOnde histórias criam vida. Descubra agora