Chapter eight: Teenage Wildlife

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"Você sabe andar de bicicleta?"

Fim de tarde. Segunda-feira. Não havia saído de casa até então. Meus pais, quietos. Liz, na escola. Minha sombra, aparente e perseguidora. A casa, vazia. A luz, forte. Louis me chamou um pouco antes do pôr do sol.

Propositalmente ou não, a cidade acompanhou nosso silêncio. O silêncio de Louis, que me levou por mais quilômetros do que pude contar, sem palavras, de olhos baixos e avermelhados, sempre voltados para frente. E os meus, sempre nele, mesmo quando quase caí por isso.

Passamos pela ponte de mármore, pela cafeteria, pela biblioteca, pela casa de Beatrice, pelas escolas e igrejas, pelos parquinhos e lojas. Passamos pelos meninos que corriam juntos com uma bola e alguns centavos nas mãos e pelas meninas que conversavam no banco da praça. Pelo senhor que passeava com seu cão e pelo gato que andava sozinho. Ainda assim, era como se fossemos apenas nós dois em uma cidade vazia.

Quando chegamos na praia, Louis deixou a bicicleta de lado e me perguntou:

— Você já se perguntou por quê adultos deixam para trás suas memórias de infância?

— Como?

— O que você fazia quando era criança?

Ele deixou seus sapatos de lado, onde as bicicletas ficaram encostadas. Se sentou no pequeno muro e enterrou os pés na areia. Ventava muito.

— Eu gostava de pintar e fazia natação. E quando Liz nasceu, eu passava muito tempo com ela. Enchia suas mãos de tinta e grudava no papel, ela adorava. E conversava mesmo que ela não dissesse nada.

— Onde estavam seus pais?

— Meus pais ficaram mais distantes um pouco antes de Liz nascer e um pouco depois. Me lembro de pintar com eles. Me lembro da primeira caixa de tinta guache que ganhei da minha mãe e me lembro da sensação de sujar as mãos pela primeira vez, eu estava tentando escapar, mas minha mãe insistiu, fez comigo, e eu acabei gostando. Meu pai me levava para nadar e me segurava até eu perder o medo. Me fazia rir para que eu esquecesse que estava na água. Nunca aprendi realmente a nadar porque só dava risada, mas nós voltavamos a pé, conversando. Depois ficaram distantes. E quando Liz nasceu, voltaram a estar ali, mas por pouco tempo. E eu não tinha muitos amigos, mas me divertia com os que tinha.

— Você tinha cachos?

— Oh, sim. Muitos deles. Sempre cheios de volume.

— Aposto que era muito bonito. — Louis levantou a cabeça e sorriu, balançando as pernas descobertas.

— Minha mãe costumava dizer que sim. — Dei de ombros, sorrindo também.

— Não diz mais?

— Não. Nunca mais disse.

— Penso no que faríamos se tivéssemos nos conhecido quando crianças.

— Acho que seríamos exatamente como agora em corpos pequenos.

— Acha? — Assenti, me aproximando dele.

— Sim. Você me levando por aí e me surpreendendo com sua forma de ser. Mas acho que seria um pouco mais leve. Acho que você não odiaria tanto o mundo.

— Ainda não. — Louis sorriu com mágoa, olhando para nossas mãos apoiadas no muro. — Penso que nós pensaríamos nisso juntos. Penso que as coisas não seriam tão difíceis e que não nos sentiríamos tão sozinhos.

— Queria ter sido criança com as coisas que sei agora.

— Eu também. Não tive amigos na infância. — Me contou, olhando para o mar. — Podia ser muito quieto ou muito barulhento, dependia do dia. Acho que eles não gostavam muito disso. E eu sentia que nossos gostos não se encaixavam, não sentia que fazia parte deles. Nunca senti que pertencia a algum grupo. Mas eu gostava cantar. Eu corria muito e tudo me era demais. Meu pai sempre esteve comigo, sempre. Acho que me lembro da infância assim. Meu pai e um mundo muito pesado que eu tentava equilibrar nos ombros. Ah, e claro: um Louis dançante, apesar de tudo. Completamente viciado pelos Beatles.

Under Pressure || l.s. Onde histórias criam vida. Descubra agora