Am❤️r Ou LouCura?

Parte1

           Destruidores de sonhos

VC culpa a todos por suas desgraças, diz que te perseguem, que te odeiam, faz a todos de mausãos e se esquece do vilão, VC! Que os deixa ganhar no jogo onde todas as suas cartas são Ases e as regras é VC quem dá.

— Advogada ou modelo, é, modelo...hum, não, espera, os dois, se Deus quiser.
— Vá lá, nada a ver. Ou advogada ou modelo, acho que essas duas carreiras não funcionam juntas num mesmo cérebro ainda mas no seu, Cláudia. Eu serei diretora de Marketing de uma grande empresa, talvez uma como a Lincoln Facet Multinational...
— isso é que é sonhar alto, Lorena, a LFM? E ainda implica comigo, eu nem disse que seria as duas coisas, ou uma ou outra mas já VC quer tocar as estrelas. Até pra entrar como fachineira da Lincoln Facet Multinational é uma luta daquelas, e VC almejava ser diretora? Esquece! E VC Annabelle? — Pisco um pouco e depois sorrio — eu o quê? As duas se entreolham e enrubeço, — VC não ouviu nada do que dissemos? — Pergunta Cláudia, claro que ouvi toda a conversa delas, só não me senti á vontade para participar... «— Mãe! Continuei a correr, já estava quase sem fôlego — mãezinha... Empurrei a porta e ela se virou, com a mão no peito — filha! — Baixou a mão, — VC me assustou — desculpe, mãe. Cruzei as mãos atrás das costas e ergui meu pé direito até ficar na ponta dos dedos, girei-o para direita e para esquerda até ouvir a risada da mamãe — vem cá. — chama depois de se sentar no sofá, feicho a porta e corro até ela me sentando de uma vez só — oba! Ri de novo — me conta, o que ouve, digo, VC parece animada. — Aninha me disse que as listas sairam então fomos ver juntas e adivinha mamãe — me olha com os olhos brilhando— VC passou...— sussurrou e uma lágrima caiu de seu olho, aceno satisfeita, ela adivinhou. — Que orgulho de VC, minha Annabelle inteligente e bela.
— Sua voz estava tão bonita e carregada de orgulho que sorri fechando os olhos, também me sentindo orgulhosa. Antes não gostava de ir a escola nem de estudar, tudo era tão difícil e complicado lá, eu não entendia o que a professora dizia nem sabia ler e todos riam de mim, mas mamãe me mudou de escola, me colocou numa especial e eu passei a entender o professor, não parecia tão burra lá, pelo contrário, era mais inteligente que muitos, até que a Aninha. Mamãe e o professor George ficaram muito felizes e eu adoro ver mamãe feliz então me esforcei muito e mesmo sendo “ especial” como mamãe fala eu passei a me consentrar mais e aprendi muito; sobre os substantivos, os números racionais, os estados das substâncias na natureza, as figuras geométricas...aprendi muito. Suspirou. — Minha bonequinha é super inteligente — fez cafuné em meus cabelos — o que minha boneca gostaria de ser quando crescer, hum... Pensei um pouco e lembrei do meu professor, ele me ajudou a não ser mais burra, ele me disse que eu não era burra, disse que era tão ou mais inteligente do que as outras crianças da minha idade, que só precisava de métodos diferentes e mais criativos para aproveitar minha inteligência. Eu amo o senhor George — Professora de crianças especiais! Falei decidida e ela riu
— que maravilha! — mas... — me senti triste — eu sei que não vai dar, mamãe me olhou com as testas enrugadas — porque está dizendo isso?
— Porque a gente é pobre, e não vou poder fazer faculdade...— fiquei meio triste mas lembrei de algo incrível — mas tudo bem, a senhora vai me ensinar a costurar e eu vou fazer vestidos tão bonitos quanto os seus, ah! E também a fazer bolos.
Minha mãe já não sorria, parecia prestes a chorar e segurou minhas mãos — É claro bonequinha, vou ensinar VC a costurar e a fazer bolos lindos e gostosos, tudo que VC quizer aprender e a mamãe souber, VC saberá e fará cem vezes melhor — arregalei os olhos— mas, boneca, VC vai realizar seus sonhos, é por isso que a mamãe se mata de trabalhar, para que nada falte a minha futura professora de crianças especiais, tudo bem? — Aceno sorrindo muito feliz.— Agora me diga, porque achou que não faria faculdade, se a mamãe diz que VC estudará até ser doutora se assim o desejares? — Não entendi muito bem o que mamãe disse mas respondi o pouco que persebi, é o que senhor George sempre fala, me diga o que VC entendeu do que eu disse
— papá falou que eu não ia fazer mais do que o colegial, para não me esforçar de mais e ir aprendendo a fazer coisas de menina para quando — senti vergonha—...casar e começar a cuidar da casa. Mamãe se levantou, senti saudades do seu cafuné, me deu as costas por um tempo e depois se virou, seus olhos estavam meio avermelhados — querida, não permita já mais que terceiros destruam seus sonhos, só VC pode e tem o direito de joga-los no lixo...sua livre e espontânea vontade, de ninguém mais, para que já mais se arrependa. — Cocei a cabeça perdida, mamãe respirou fundo — um dia VC entenderá...agora, quem quer me ajudar a fazer um bolo de ananás para comemorar que passou de ano? — EUuuuuu!

•••

Voltei para casa e sem fazer barulho entrei, vou pregar um susto na mamãe! Devagar fui me aproximando... — Fui para o banco tentar tirar dinheiro para comprar os materiais escolares da nossa filha...— mamãe falava baixo e parecia tremer, — mas minha conta estava limpa, limpa, António. Reclamei, fiz um escândalo só para descobrir que todo dinheiro foi sacado com meu cartão de credito — ela jogou o cartão na cara do papá, dei um passo para trás — por favor me diga que VC sacou todo dinheiro para o colocar em um lugar seguro, dando ouvidos a essa sua paranóia ridícula de que os bancos não são seguros e que nos roubam centavos a cada fim de dia...espero que esteja no mesmo local onde levou o dinheiro que estava na minha caixinha escondida no armário, o dinheiro da renda. — Talita...— NÃO! Eu só quero que diga sim, eu o guardei, só isso.
— Querida...— COMO PÔDE? Como? Como? Jogar meu dinheiro...o dinheiro que juntei para minha filha...no lixo do seu vício, eu me matei, eu me mato de trabalhar seu jogador imundo, enquanto VC está lá, estendendo o que não seca. Eu perco noites dando cabo das costas, contando cainbras na perna e sangrando costurando muitas vezes em meus dedos pelo sono — mamãe soluça e se joga para trás quando papá tenta pegá-la
— minha boneca tem sonhos, seu Desgraçado insensato, ela quer ser professora, pai disnaturado...quem é VC para tentar impedir? Não vou permitir, não vou deixar que a destrua como faz comigo dia após dia! — Perdão, perdão, perdão...por favor, perdão, minha Talita...
— Mamãe se ajoelhou no chão e começou a gritar me assustando, gritava enquanto batia a cabeça no piso sem parar — Colei-me a parede assistindo a cena, atônica, papai tentava á parar mas ela não deixava, limpei minhas lágrimas ao ver sangue, mamãe estava se machucando, corri até ela e  tentei para-la também mas ela bateu em minhas mãos e me afastou, minhas lágrimas aumentaram — Annabelle, vem cá — papá me puxou — vou chamar uma ambulância, ela está tendo um surto.
— Olhei para mamãe com pena e tristeza... mas depois, chateada, ela permitiu, deixou que terceiros interfiricem e jogacem seu sonho no lixo, eu também permitiria e ia me arrepender...» — Eu e Lorena estávamos conversando sobre que carreira seguiremos, eu acho que quero ser modelo, Lorena diz que quer ser directora de marketing na LFM, ridícula, eu sei— Lorena Cutuca a outra e ficam se empurrando por um tempo até que fazem uma tregua — pronto, já parei. — suspira— e VC, Annabelle? — Dois pares de olhos me olham ansiosos, olho para o nada e respondo — não sei. — Como assim não sabe? VC é a melhor aluna da classe, me atrevo até a dizer da escola inteira. Ter dislexia não te impediu de se dar bem neste colégio, não permita que a indecisão te ampute as pernas e te faça estagnar.
— Lorena esmiuçou-se com altivez se achando muito inteligente, detesto quando falam da minha dislexia. Suspiro. Desvio o olhar — indecisão é ausência de decisão, não sofro disso, estou só certa e decidida de que não sei que carreira vou seguir e isso não me impedirá de pensar; ir para a escola não significa que se é inteligente, ser boa aluna não é sinônimo de autossuficiência, ou de que sabemos exatamente o que queremos para nós daqui a alguns anos... Fico com inveja de VCS, deve ser muito bom saber onde se quer ir, assim, acho eu, não se corre o risco de fazer paragens desnecessarias. Sorrio para aliviar o clima, elas me olham desconfiadas por um tempo mas logo se rendem... Que caminho poderá me levar até VC, mãe? Será que talvez, Deus poderá me conceder mais uma chance de te abraçar? Será que VC tem ficado orgulhosa das minhas conquistas académicas? Bom, elas são mais tuas do que minhas porque todas são executadas com o único intuito de em algum momento VC aparecer e mais uma vez adivinhar, é mãe, saí no quadro de honras, sim, de novo; é mãe, passei de ano, de novo; é, mãe, eu já não quero mais sonhar, está decepcionada? Não? Eu só segui seu exemplo, não deveria...?