5.

517 62 31
                                    

Tinha só uma cama, foi a primeira coisa que Liz percebeu quando entrou no quarto.

Era óbvio que só teria uma cama.

Ela fechou a porta e deixou a maleta no chão.

Ela observou o quarto, era grande e espaçoso, tinha uma cama de casal no centro do quarto com uma cômoda ao lado direito, uma porta que deveria ser a do banheiro perto da janela e uma TV.

Liz foi até a cama e se deitou, ela soltou um suspiro de alívio, relaxando pela primeira vez em anos. Aquela cama era tão confortável.

Tão confortável e tão espaçosa para uma pessoa só.

Ela pensou em Thiago. A expressão dele com a menção ao número 204.

Ela tentou buscar na memória algo sobre isso, mas não se lembrava de Thiago dizer algo sobre número quatro.

Então uma lembrança surgiu, tão pequena que ela tinha esquecido, Joui uma vez disse que odiava o número quatro porque era um número amaldiçoado na cultura japonesa. E Thiago, sendo o pai babão que era, desde aquele dia se certificou que tudo que eles dessem a Joui não tivesse o número quatro.

E de novo, como sempre, Liz se odiou.

Ela foi embora. Não importa se foi para proteger as duas pessoas que mais amava no mundo e não importa se ela continuou  de olho neles durante os anos, ela os deixou. De todas as formas possíveis.

Uma sentimento surgiu.

Talvez ela nunca mais visse Joui. Eles estavam lidando com o paranormal, afinal. Talvez ele estivesse morto e se ele estivesse morto, Thiago nunca se recuperaria.

E nem você, sua mente a lembrou.

¤°¤

Quando Thiago entrou no quarto, Liz sentiu o cheiro de cigarro vindo dele e uma nostalgia a atingiu.

Ele não disse nada, apenas entrou e fechou a porta, deixou a mochila no chão e foi até a cama. Liz o olhou enquanto ele se sentava com as costas na cabeceira, Thiago fechou os olhos e soltou um suspiro.

Nenhum dos dois disse nada.

Ela olhou para a cicatriz no rosto de Thiago e se lembrou de como ele a conseguiu, foi na primeira missão deles.

Ela se lembrava do sangue, do caos naquela biblioteca, do corpo de Daniel partido ao meio e de implorar para que Thiago ficasse acordado, também se lembrava dos dias silenciosos que se seguiram no hospital.

Por favor, acorde. Não posso ficar sozinha.

A primeira missão tinha sido um fracasso, não importava o que Verissimo dizia na época, tinha sido um fracasso porque Daniel tinha morrido e Thiago estava ferido.

E que Alex foi jogado naquela vida contra a vontade dele.

Eles melhoraram e Liz prometeu a si mesma que nunca mais deixaria alguém morrer ou se ferir, não importava o que ela precisasse fazer.

Talvez seja por isso você tenha ido parar na mira de Kian, aquela voz sussurrou na sua cabeça.

O que Kian te ofereceu que fez você ir embora? — Thiago disse de repente e Liz o observou abrir os olhos e a olhar, ela franziu a testa e ele continuou: — Você sempre deixou claro que o que Kian fazia era desprezível, mas então você se juntou a ele.

— Respostas, eu queria respostas e ele me deu.

Thiago piscou e disse, com a voz amarga:

— As respostas valiam mais a pena que eu e o Joui?

Liz queria sumir. Na verdade, tomar uma garrafa de uísque seria uma ótima alternativa.

Ela merecia isso, merecia essa raiva vindo de Thiago. Ela o deixou e nem sequer explicou direito o motivo, apenas deixou um bilhete e foi embora.

Como se ele fosse nada.

Ela merecia e mesmo assim doía.

— Eu achava que sim, mas não. Uma pena que percebi isso tarde demais — Liz respondeu e quis chorar.

Ela queria voltar no tempo e mudar tudo, queria dar um soco em si mesma quando aceitou encontrar Kian para ouvir a proposta dele.

— Uma pena mesmo — Thiago concordou com tristeza.

Nenhum dos dois disse mais nada o resto do dia.

Quando anoiteceu, eles ouviram batidas na porta do quarto. Thiago saiu da cama e foi até a porta, Liz o observou abrir a porta e sorrir.

— Arthur, Cesinha — ele exclamou e deu passagem para eles, os dois garotos entraram no quarto. Arthur sorriu quando viu Liz enquanto Cesar se dirigia para a janela, Thiago fechou a porta e voltou para a cama ao lado de Liz.

— Vamos testar a ideia do Arthur, ver com os próprios olhos o que os moradores dessa cidade dizem ver — Cesar disse na janela, olhando para algo na escuridão, Arthur foi até o lado dele e se apoiou na janela.

— Eu acho uma ótima ideia, não temos muito o que fazer mesmo — Thiago murmurou.

Liz preferiu não opinar, ela apenas observou Cesar e Arthur olharem para o lado de fora — Thiago a olhava, mas ela não sabia disso.

Cesar e Arthur ficaram jogando conversa fora e Thiago participava, eles falaram sobre Força G, uma HQ de super-heróis que os dois gostavam e que tentavam fazer Joui ler fazia anos, mas sem sucesso. Os dois garotos conversavam com Thiago, mas em nenhum momento desviaram o olhar da janela, principalmente Arthur.

Quando deu 22:57, algo mudou. Liz sentiu.  Seus pelos do braços se arrepiaram.

— Puta merda — Cesar disse com a voz assustada, tanto Thiago e Liz foram para a janela.

— Jesus Cristo —  Arthur disse com o mesmo tom e Liz viu os olhos dele arregalados antes de olhar para a escuridão.

Liz viu a figura que Cesar descreveu mais cedo, não só ela e sim várias, andando pela grama. Cada uma portava uma máscara e Liz quis correr, se esconder em algum lugar. Ela já tinha visto imagens dessas figuras anos atrás.

A Seita das Máscaras estava ali.

Suposição - LizagoOnde histórias criam vida. Descubra agora