Capítulo 10

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O vento gélido daquela tarde estapeia meu rosto pela janela. Eu me encolho no moletom que estou usando quando finalmente decido sair do meu quarto. Um degrau por vez e eu chego ao fim da escada. Miwa está paralisada com um prato com ovos mexidos na mão perto do corredor. Eu desvio de seu olhar e quero correr para a porta.

— Espera, Tobio!

A mão na maçaneta fica parada, e escuro os passos dela se aproximando.

— Aonde você vai?

— Vou me encontrar com alguém.

Os olhos dela são parecidos com os meus. De um azul oceânico e profundo, e estão brilhando por ter descoberto que vou sair.

Coloco as mãos no bolso, para aquecer minhas mãos. Elas nunca mais ficavam quentes.

— Me liga se precisar de algo. E tome cuidado, está bem? — diz, a preocupação saindo a cada palavra.

Sei o que ela queria dizer. Sei o que todos queriam me dizer, mesmo depois de meses.

Eu fecho a porta e suspiro, observando a fumaça sair. Realmente está muito frio. Como se fosse possível até mesmo o mundo sentir a perda. Não fazia sentido estar calor. Igual não fazia sentido minhas mãos ficarem quentes. Não mais.

As ruas estavam movimentadas, e ao longo da minha caminhada posso sentir o frio querendo me invadir. Mal sabe ele que meu interior está tão gelado quanto.

Perco minutos andando e divagando, porque acho que é o que mais consigo fazer ultimamente, perder tempo. Estremeço antes de cruzar a porta da cafeteria, torcendo para que esteja minimamente menos frio lá dentro.

O sino toca e a porta bate atrás de mim. Não ligo para olhares, estou me esticando para ver se o enxergo. E lá está ele, pontual como sempre. Deve ter esperado pacientemente por mim. Todos achavam que eu merecia a paciência deles. A pena deles. A sensibilidade deles. Eu não queria nada que tivessem a me oferecer.

Jogo meu corpo no estofado avermelhado e cruzo os braços, encarando Sugawara.

Uma garçonete se aproxima e peço um café. Ele está tomando algo também. Leva a xícara até os lábios e foca em mim, analisando meu rosto.

— Quanto tempo que não te vejo. — É a primeira coisa que diz, tomando cuidado com as palavras. — Estávamos preocupados.

— Claro que estavam.

Sugawara toma mais um gole generoso da bebida.

— Eu... eu queria saber se você precisa de algo. — Jurei que ele me diria "sinto muito", "meus pêsames, Kageyama". Sugawara me surpreende às vezes.

Se eu precisava de algo? Sono. Remédios. Sanidade. Um canivete, já que Miwa tirou todas as lâminas da casa e as escondeu. Precisava comer. Alegria. Felicidade.

Precisava de Hinata Shouyo.

Entretanto, não disse nada disso.

— Preciso de tempo — digo, sentindo ele fraquejar pela rispidez. — Mais tempo. É só isso que preciso. E eu também preciso que parem de se importar comigo.

— Não posso fazer isso, Kageyama.

— Pode sim. É só me largarem, saiam do meu pé. Não preciso da pena de vocês, não preciso que tenham dó de mim.

— Kageyama, eu estou preocupado com você, droga! — Bateu na mesa, chamando a atenção de quase todo mundo da cafeteira.

A garçonete aparece ao meu lado, deixando a xícara de café fumegante à minha frente. A única coisa que está me deixando acordado e um pouco são da consciência é a cafeína. Tomo um gole, queimando a língua e um pouco da garganta. Não me importo com essa dor.

Era só uma doença - KageHinaOnde histórias criam vida. Descubra agora