Reconciliação

33 4 12
                                    


Maria narrando

30 dias sem minha mãe.
30 dias que virei mãe, mãe da Heloísa e 30 dias que a minha vida deu um giro de 360º graus. Carlos levou a amante e o filho homem de 3 anos no enterro de mamãe, e de lá mesmo me entregou a guarda de Heloísa e sumiu no mundo.

Como ele passou a guarda da Heloisa para mim não posso nem pedir pensão.
Ele foi bem instruído por sua amante que depois descobri ser advogada, ele já chegou no enterro com a papelada toda pronta.

Eu recebo a pensão do meu pai que faleceu até eu me casar, ele era militar.
 Mas eu estava usava o dinheiro pra pagar a faculdade, tenho bolsa de 50% mas agora com todas as contas da casa sob minha responsabilidade; mas a escola da Heloisa, e plano de saúde vou precisar trancar a faculdade.

Depois de mais de uma hora fazendo cálculos, eu vi que realmente não vai ter jeito.
-a faculdade vai ter que esperar.
Disse tentando me convencer de que esse é o certo a se fazer. Tomei um banho me arrumei bem básica, afinal eu ainda estou de luto e sem cabeça para make e combinações de saia e blusa, deixei Heloisa com a minha vizinha e segui pra faculdade.

-não era pra ser assim, não era.
Chorei sentada no ônibus
-Mas o que eu poderia fazer?
Perguntei a mim mesma, já sabendo a resposta.
Carlos nem cogitou a ideia de levar Heloisa com ele, e mesmo se quisesse eu não deixaria.

Ele nunca demonstrou afeto pela menina, se levasse ia pra ser judiada por madrasta e não consigo nem pensar nessa hipótese.
Cheguei na faculdade fui direto pra secretaria, eu não queria ver nem falar com ninguém mas quando estava quase lá, esbarrei com Júnior, ele é o amigo sem noção do Denis.
De verdade não consigo entender, como eles podem ser amigos.

- Oi Maria?
Ele disse sério
-oi.
Fui seca porque não esqueci a gracinha de um tempo atrás e a forma como me olhou.
Com ódio, gente como ele não esquece, guarda, alimenta e espera a oportunidade certa pra se vingar depois.

-Eu soube da sua mãe sinto muito.
Ele não sentia, sou boa em ler pessoas e ele não estava nem um pouco sentido
-obrigada
Continuei andando e ele veio atrás igual cachorro atrás do osso.
-Ei que tal se a gente saísse pra conversar hoje depois da aula?

Parei e olhei bem dentro da cara dele
-sério?
Perguntei fula de raiva já
-Sou um bom ouvinte
Ele deu de ombros
-não tenho nada para conversar com você?
Ele riu sem jeito e eu bufei, me sentindo em um dejavu

-cara porque você é tão arisca assim ?.
Ele disse se aproximando 
-não sou arisca, só não to afim de você ou de v papo com você
Nos encaramos em um desafio silencioso. Vendo que nenhum dos dois iam ceder voltei a andar e senti meu braço sendo puxado, com certa força.

-me solta
Puxei meu braço com rompante
-já disse que não estou afim
-Qual é preta?
Ouvi-lo me chamar assim, despertou em mim uma fúria.
- meu. nome. é. Maria
Falei entre dentes, ele levantou as mãos em sinal de rendição.

-ok, desculpa...sem apelidos carinhosos então
Voltei a caminhar
-eu já passei por isso
Ele disse baixo e eu travei no lugar
-também perdi alguém..
Respirei fundo e me senti meus músculos travarem
-eu também perdi minha mãe

Ele falou baixo, então me virei e o encarei
- o que disse?
-eu sei como se sente... eu já passei por isso
Meus olhos se encheram de lágrimas
-por isso estou aqui... se me der uma chance, serei um bom ouvinte

Uma lágrima desceu por meu rosto e Júnior na mesma hora a enxugou.
-Te encontro no lounge depois da aula?
Não respondi, então ele me puxou para um abraço, eu estava um caos, destruída e sem direção eu estava no meu pior momento, e nem assim o abraço do Junior me confortou.

Ri amarelo e me afastei.
-Júnior eu....
Ele me cortou
-shiii, nos vemos depois
Ele deixou um beijo em minha bochecha e saiu, eu não iria até porque ia embora antes do intervalo, mas ele não me deixou falar então... vai tomar um belo de um bolo pra ficar esperto.

 Entrei na secretaria resolvi tudo sobre minha matrícula e sai com o coração na mão, administração é a minha paixão mas Heloisa é meu amor e minha responsabilidade.
Assim que sai da secretaria, segui pra cantina mas parei no meio do caminho, ao ouvir meu nome.

-eu duvido que a Maria vai dar pra você cara
Travei no lugar
-to te falando irmão, vamos nos encontrar no lounge na saída
Júnior comentava orgulhoso e eu já me via indo lá e esfregando a cara dele no chapisco.
-ela confirmou que ia?
Outro boboca riquinho perguntou
-sim, até chorou no meu ombro rsrs só precisei contar uma história triste, do tipo" eu te entendo"
Ele fez aspas com as mãos
- e pronto, ta na mira do pai kkkkk

Eles riram e pelo barulho de estalar de mãos, eles se cumprimentavam
-pelo jeito tu vai comer a negrinha antes do trouxa do Denis
Evandro o racista de merda que dei uma lição na sala uma vez, se pronunciou
-nem ligo quem vai comer primeiro, contanto que eu coma ta legal pra mim.
Eles riram e eu me senti tão enojada, que senti me estomago revirar.

Meu ódio era tanto que mudei meu caminho, desisti da cantina e segui para a saída mas bati de frente com Denis, antes de chegar no portão.
-olá...
Ele segurou em meu ombro me impedindo de cair
-pensei que não voltaria mais
A voz grave de Denis mais aquele sorriso perfeito me causaram arrepios
-oi, pois é...

As coisas estavam meios frias entre nós.
 Depois da morte da minha mãe, logo Denis viajou a trabalho.
-não vai pra sala?
Ele perguntou me soltando
-não, hoje foi meu último dia aqui.
Ele arregalou os olhos ao me ouvir com a voz embargada.
-preta...
Ouvi-lo me chamar assim, aguçava todos os meus sentidos
-pensa melhor...

Ele abriu os braços e eu me entreguei aquele abraço que desde a morte da minha mãe, tem sido meu único abrigo. Só quando Denis está por perto eu me sinto segura de verdade, eu deixo de ser a protetora e viro a protegida. Não sei explicar essa segurança que ele me passa mas eu adoro.
-Vamos sair daqui
Ele me levou até o lounge o bar em frente a faculdade e como ainda era cedo estava meio vazio, assim eu pude desabafar
-Ei não se desespera

Ele segurou minha mão me passando uma força tão grande.
-é só um período até você se adaptar a nova realidade.
Ele falou tão seguro de si que comecei a sonhar com a minha volta pra faculdade.
-E também você pode pensar em outras possibilidades, quem sabe um emprego meio período?

Conversamos mais um pouco até que percebi que já estava ficando um pouco tarde, eu precisava voltar para casa para ficar com Heloísa.
-Denis muito obrigada pela conversa e pelo suco mas tá na minha hora.
Tomei o último gole do suco.

- Deixei a Heloísa com uma vizinha e não posso abusar.
- eu sei e entendo preta...
Essa palavra saindo da boca de Denis, tinha uma conexão direta com a minha intimidade, bastava eu ouvir que minha perseguida pulsava.
- vou te levar em casa.

Pra ele era tão natural, me chamar assim que ele não percebia o efeito que causava em mim, ele sempre foi um cavalheiro mas não quero ficar abusando da boa vontade dele.
-não não, não precisa é super fora da sua rota e de mais a mais...
Passei a mão pelo meu pescoço encabulada

-você não pode ficar matando aula direto né.
Ergui a sobrancelha em sinal de advertência.
-você já fez isso para me ajudar no dia do enterro da minha mãe e não quero que se prejudique por mim.
- que é isso Maria para de bobeira...

Ele bebeu o resto do seu suco
-e a próxima aula é de estatística.
Ele abriu um lindo sorriso e então eu notei que estava sentindo falta daquele sorriso.
-e bem eu domino a matéria
Disse todo convencido e nós dois rimos, ele realmente era bom nessa matéria.

- convencido.
-o pai aqui manda bem, vamos lá .
Nos levantamos
-vou pagar nosso suco e a gente já vai.
Fui saindo do bar e vi Júnior e companhia.
Eles riam de alguma piada racista que algum deles com certeza fez e seguiam sentido o bar.
-vamos?
Denis apareceu antes que eles atravessassem a rua e eu dei graças a Deus

-Maria Maria ouvi alguém gritar meu nome e me virei já sabendo de quem se tratava. Ele vinha correndo na minha direção.
-o que você quer garoto?
Disse sentindo a raiva me dominar
-ué...

Ele abriu os braços e deu um sorriso nervoso.
-esqueceu de mim?
-na verdade não mas queria muito, ter o poder de desconhecer gente babaca como você.
ele arregalou os olhos
-que isso...que agressividade é essa?

 Denis  estava ah alguns passos na minha frente ao telefone, alheio ao que acontecia a sua volta
-agressiva é a puta que te pariu, escroto
Me virei pra sair mas ele segurou meu braço.
-o que que ta rolando hein, ta doidona?
Bati a mão em sua mão o fazendo me soltar assustado
-nunca mais seu bosta, encoste em mim.

-qual é a sua?
Ele riu sem graça percebendo que seus amigos idiotas, acompanhavam toda a nossa interação
-Tudo isso é por causa dele?
Apontou com a cabeça para a direção do Denis
- não, tudo isso é por causa de você, macho escroto.

Apontei o dedo na cara dele e falei firme
-entende de uma vez por todas cara, eu não estou afim de você, não adianta vir me contar nenhuma historinha triste.
Ele arregalou os olhos
-nem hoje e nem nunca, eu vou dar pra você idiota
Sai andando e peguei na mão de Denis que estava alheio a tudo no telefone e o guiei para o estacionamento.

-Maria?
Junior gritou

-Maria volta aqui?
Ele gritou de novo
-FILHA DA PUTA
 Não olhei pra trás.
-está tudo bem?
Denis perguntou alarmado com o escândalo que Júnior estava fazendo.

-sim só anda e não olha pra trás.
E assim seguimos nosso caminho, entramos no carro e Denis deu partida com os vidros abaixados, passamos por Júnior que estava parado na calçada e mostrou o dedo do meio pra mim, quando o carro passou por ele.
-trouxa
Falei vendo como o cara é babaca em um nível HARD
Deus me livre de um homem desses.

Garoto de programaOnde histórias criam vida. Descubra agora