Capítulo 11

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Sonhei com ele hoje à noite. Estávamos na beira de um rio, ouvindo o som da água deslizar pelas pedras. Não era só um sonho; eu podia sentir o frescor da água batendo nas margens, o vento mexendo no meu cabelo, a calma ao redor de nós. A gente conversava, mas meus lábios não se moviam. Então, ele se aproximou, tocou meu rosto com uma leveza absurda e sussurrou: Huguinho, você quer namorar comigo?

Foi aí que acordei, como se alguém tivesse puxado a tomada dos meus pensamentos. Fiquei deitado, imóvel, tentando processar aquilo. "É só um sonho", murmurei para mim mesmo, mas meu peito subia e descia como se tivesse acabado de correr uma maratona. Eu sabia que era só um sonho. Mas, ao mesmo tempo, tinha certeza de que, mais cedo ou mais tarde, aquela pergunta sairia da boca de um de nós.

Namoro. Namorar. Estar enamorado.
A palavra dançava na minha mente, e eu gosto do som que ela faz. O problema não era o sentimento, era o que viria depois.

Minha mãe gritou meu nome do outro lado da casa, me trazendo de volta à realidade. Claro, atrasado para o colégio. Tomei um banho demorado, tentando lavar o sonho do corpo, e vesti o uniforme. Ignorei o sonho como quem ignora qualquer coisa banal. Peguei minha mochila do sofá, dei um tchauzinho rápido para minha mãe e saí pela cidade.

✿❀

Minha intenção era ir direto para o colégio, mas no meio do caminho, esbarrei numa feira de livros com música ao vivo. E estavam tocando Anavitória. Era impossível resistir. A feira tinha algo mágico; as pessoas e os livros pareciam pertencer a um universo paralelo, mais bonito que o nosso.

Não teve jeito — eu fui fisgado. A culpa era do Kauã e do Sr. Marino. Foi graças aos dois que virei esse leitor compulsivo em tão pouco tempo. E a tarde de hoje era para ser dele, para a gente se despedir antes da viagem. Imaginei nós dois vagando pelos estandes, trocando beijos discretos em corredores vazios. Só de pensar, meu coração acelerava.

Parei nos livros clássicos, procurando algo que ele pudesse levar na mala e lembrar de mim. Enquanto folheava uma pilha, vi uma garota loira agachada. Ela não se movia desde que cheguei. Peguei um romance e deslizei os dedos sobre a capa, a textura áspera me trazendo de volta ao presente. A garota continuava lá. Por um segundo, pensei em seguir em frente. Mas alguma coisa me fez me aproximar e tocar seu ombro.

Ela deu um salto e eu quase fui junto.

Hugo: Caralho! — soltei, encostando na estante para me recompor.Ela levou a mão ao peito, tentando abafar o susto e, talvez, algumas lágrimas.— Desculpa, desculpa mesmo. Não queria te assustar. Tá tudo bem? — perguntei, genuinamente preocupado.

— Tá sim. Eu que... viajei um pouco aqui. — Ela deu um sorriso meio torto, que não convenceu. — Quer ajuda para escolher algo?

Notei o crachá meio torto na blusa dela.

— Sophia?

— Ah, sim! É, eu sou a Sophia. — Ela ajeitou o crachá, sem graça. — E você, quem é?

— Hugo. Prazer.⎯Ela sorriu mais sincera dessa vez, e aquilo me fez relaxar.⎯Bom, pelo uniforme do São Rios, você deve estar matando aula.

Hugo: Bom, meio que não estou e estou. Fui puxado para cá e não poderia sair sem algo para mim e para o meu... ã-ãmm... amigo. ⎯ Isso foi embaraçoso. O sonho me veio à mente e sussurros me disseram: Namorados, namorados, namorados. Porém, minha mente disse: Amigos, amigos, amigos. Respiro fundo afastando tudo isso e completo ⎯ Ele vai viajar hoje, e queria entregar algo, sabe..

Ela sorriu e me conduziu até alguns livros. Passamos alguns minutos jogando conversa fora, e pela primeira vez, percebi que não estava com medo de conversar com um desconhecido. Isso foi bom. Na verdade, foi incrível! Ela me desejou um bom dia e lhe entreguei um sorriso como resposta. Sophia foi uma grata surpresa do universo.

Ao me libertar do purgatório educacional denominado 'Escola', deparei-me com o carro do Sr. Marino estacionado um pouco a feente. Vidros misteriosamente fechados. Uma cena atípica, já que ele nunca mantinha assim. Ao me aproximar, bati três vezes no vidro, apenas para descobrir que o "motorista de plantão" nada mais era do que ele. Kauã Marino.

Kauã: Surpresa! — Ele sorriu de orelha a orelha. — Meu pai deixou eu pegar a caranga hoje.

Hugo: Você é maluco! — falei, rindo enquanto entrava no carro.

Antes que eu pudesse ajeitar a mochila no banco de trás, ele me beijou. Foi tão repentino que, por reflexo, acabei empurrando-o de leve.

Hugo: Desculpa, é que...

Kauã: É que estamos na frente do seu colégio. Eu sei. — Ele riu, envergonhado. — Mas eu não resisto a você.

Eu odeio quando ele fica sem graça, então fiz o que precisava: puxei-o para outro beijo. No meio do impulso, bati minha mão na buzina. O som estridente ecoou e nós nos afastamos num pulo, gargalhando como crianças. " Também não resisto a você " confessei, ainda rindo. Kauã parecia flutuar. Ele mexeu no rádio e perguntou:
E agora, senhor planejador? Para onde vamos?

Hugo: Tenho um lugar em mente. Acho que você vai gostar.

Ele sorriu e virou a chave na ignição.

Quando chegamos à feira, eles ainda estavam tocando Anavitória. Kauã me puxou para perto, e enquanto cantavam "Ai, Amor", ele cantou junto, olhando direto para mim. Meu rosto esquentou. Roubei um beijo rápido e ele corou. Passamos o resto da tarde vendo livros. Tiramos duas polaroids, assinamos nossos nomes atrás delas e trocamos. Fiquei com a que tinha sua letra e ele ficou com a minha.

Sentamos em uma mesinha e deixamos as palavras fluírem durante toda a tarde. Uma moça gentil e educada nos presenteou com duas rosas, sentindo, segundo ela, a aura vermelha da nossa alegria. Ficamos sem jeito, sorrindo com gratidão. E assim passamos a tarde.

Ele me observava enquanto falava.
Eu o admirava por sua inteligência.
Ele confessou adorar minhas covinhas.
Eu disse amar seu sorriso.
Ele comprou um croissant para mim no senhorzinho da esquina.
Eu entreguei o livro que havia comprado. Ele compartilhou devaneios sobre nos amarmos entre várias vidas.
Eu brinquei que ele estava assistindo filmes da Marvel demais.
Ele fez uma declaração na folha do guardanapo do café.
Eu ri vendo-o tentar escrever sem rasgar a folha.
Ele tirou uma foto minha com as rosas.
Eu disse que o amava.
Ele recitou um poema: "O tempo é muito lento para os que esperam. Muito rápido para os que têm medo. Muito longo para os que lamentam. Muito curto para os que festejam. Mas, para os que amam, o tempo é eterno."
Eu o beijei.
Ele me beijou.

No final do dia, em frente à varanda de sua casa, estávamos um diante do outro, trocando olhares que desejava ser eternos. Não queria ficar sem ele por muito tempo. Então ele disse...

Kauã: Sabia que você tem cheiro de chuva antes de chorar? —sussurrou, enxugando uma lágrima minha com o polegar.— São só alguns meses — me assegurou. E eu sabia, entendia que ele precisava ver sua avó.

Ele me puxou para perto, e meu nariz encontrou seu pescoço. Queria gravar aquele cheiro na memória.

Kauã: Isso podia ser um beijo..⎯
murmurou no meu ouvido.

Hugo: As pessoas podem ver — eu disse, sem muita convicção.

Kauã: Eu não ligo, Hugo. Só quero beijar o meu...tudo!

E foi o que ele fez. Me olhou e passou seu nariz no meu. Não estava com medo. Não existe medo. Ele me beijou, e eu o beijei. Na varanda da casa dele, sem se importar se fossemos pegos ou não

Kauã & Hugo ( Romance Gay )Onde histórias criam vida. Descubra agora